Em Belo Horizonte, a terapeuta tântrica Antar Surya, que há 16 anos trabalha com pompoar e já fez cursos na Índia, França e EUA, oferece um curso com duração de 4 horas ao custo de R$ 200 por pessoa. Ela explica que o pompoarismo é uma arte antiga que nasceu com o objetivo de facilitar o parto da mulher pela prática de exercícios para o assoalho pélvico. O tempo passou e o foco mudou. Segundo ela, com as conquistas femininas, a mulher “ganhou” o direito ao autoconhecimento para buscar o próprio prazer. Engana-se quem pensa que as interessadas frequentam as aulas para satisfazer seus parceiros. “Vivemos o momento de empoderamento da mulher”, afirma Surya.
Joana* tem 32 anos, é advogada e solteira. A história dela com o pompoarismo ilustra bem a sensação de protagonista da relação sexual. Ela conta que procurou o curso com a intenção de se conhecer melhor e aumentar a autoestima. “Além da melhora da vida sexual, me tornei uma mulher mais segura e feliz comigo mesma”, diz. A advogada relata ainda que as aulas ampliaram o horizonte dela. “Minhas expectativas foram superadas, pois além do pompoarismo, o curso trata de outras questões muito interessantes, como a importância do parto natural, o sagrado-feminino, meditação e relacionamento”, encerra.
Estatísticas
Liderado pela professora da Universidade de São Paulo (USP), Carmita Abdo, os dados do Estudo da Vida Sexual do Brasileiro, realizado em 2003, são usados ainda como referência por especialistas. O documento é considerado uma das maiores pesquisas já feitas sobre o assunto no país: 7.103 brasileiros com idade entre 18 e 80 anos foram entrevistados, sendo metade desse número de cada sexo. No caso das mulheres, 26,2% relataram a incapacidade de atingir o orgasmo. Para 26,6%, a maior dificuldade é a falta de desejo e, para 18%, dor na penetração. A maior dificuldade sexual masculina, 45%, é a disfunção erétil e para 25%, a ejaculação precoce.
Ginecologista, sexólogo, coordenador do Departamento de Sexologia da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e autor dos livros Medicina e Sexualidade e Os Sete Pilares da Qualidade de Vida, Ramon Luiz Moreira diz que a incidência de disfunções orgásmicas em mulheres gira em torno de 30% na maioria dos estudos. Ele cita um australiano, da Universidade de Melbourne, realizado em 2007, que encontrou números correspondentes ao do brasileiro. Entre as mulheres com alguma dificuldade sexual, 64% apresentaram dificuldade desejo, 35% de orgasmo, 31% de excitação e 26% relataram dor na relação sexual.
O sexólogo diz que para as mulheres desenvolverem sua capacidade orgástica é necessário adquirir essa habilidade que envolve também a desinibição sexual, o conhecimento do próprio corpo, a interação com o parceiro e as condições psicológicas. “Apesar disso, devemos considerar que 70% das mulheres atingem o orgasmo nas relações sexuais, ou seja, há um número considerável que se dá bem sexualmente”, pontua.
Sem milagres
O pompoar não é promessa de solução para os problemas sexuais. Para Ramon, as técnicas de fortalecimento do assoalho pélvico foram inventadas e são usadas cientificamente para disfunções da musculatura - fraqueza ou tensão dos músculos pélvicos. “Elas não são usadas ainda para o tratamento das disfunções sexuais de maneira regular. São necessários mais estudos que provem que elas têm realmente a capacidade de ajudar as mulheres com problemas sexuais”, pondera. Segundo o ginecologista e sexólogo, os problemas sexuais têm várias origens: sociais, psicológicas, físicas, conjugais. “Muitas vezes esses problemas são complexos. No caso dos homens, dá para dizer que os problemas físicos ultrapassam os psicológicos após os 50 anos de idade, mas as síndromes de dor sexual na mulher, por exemplo, compõem um quadro à parte das disfunções sexuais e ainda são muito pouco conhecidas na atualidade”, explica.
“Sexualidade não é só físico. Não acredito que trabalhar o músculo resolve os problemas da vida sexual. O treinamento melhora as questões da relação sexual porque o músculo fraco não ativa excitação. Ou seja, é claro que exercícios para a região pélvica melhoram essa capacidade”, afirma a fisioterapeuta e professora da Faculdade de Ciências Médicas, autora e organizadora do livro Fisioterapia aplicada à saúde da mulher, Elza Baracho. A especialista lembra que a resposta sexual passa por quatro estágios: desejo, excitação, orgasmo e resolução. Nesse caso, exercícios para a musculatura pélvica agem pontualmente na segunda fase.
Ramon observa, entretanto, que a técnica do pompoarismo é muito pouco estudada no meio acadêmico. “Acredito que os médicos têm dificuldade em assimilar técnicas populares na sua prática diária, mas seria interessante se a medicina começasse a estudar essas técnicas milenares para avaliar as evidências de que elas funcionam”.
Preconceito
“A busca pelo prazer ainda é muito associada à libertinagem”, relata Antar Surya. Para essas pessoas, a terapeuta manda um recado: “aqueles que têm preconceito, com certeza, carecem de informações e experiências prazerosas”. A terapeuta relata que recebe várias mulheres indicadas pelos próprios ginecologistas para aprenderem e praticarem a técnica. No curso que ela leciona cada uma recebe gratuitamente uma avaliação individual do períneo com uma fisioterapeuta especializada em uroginecologia. “Cada mulher tem uma história de períneo diferente. Não posso recomendar alguns acessórios para uma mulher que é já é mãe ou para uma que é virgem. É preciso respeitar essa história e individualizar o treinamento”.
A terapeuta tântrica explica que a técnica em si é simples e consiste no foco e no controle mental da mulher sobre a musculatura circunvaginal, mas requer disciplina e intuição para alcançar os resultados desejados. “O objetivo principal do curso é se conhecer para uma qualidade de vida sexual maior”, enfatiza Surya.
Ainda segundo ela, o pompoarismo proporciona vários benefícios para a saúde da mulher, “mas principalmente para o autoconhecimento, controle e fortalecimento da musculatura do períneo e prevenção da incontinência urinária e fecal porque prepara o períneo para o parto e fortalece o canal após o parto. É imprescindível após a histerectomia (retirada do útero) e previne o prolapso uterino e da bexiga. O treinamento favorece o aumento do tônus muscular na região genital aumentando a lubrificação, a libido, a ejaculação feminina e diminuindo os sintomas da menopausa”, afirma.
Quem pratica
Poucos homens sabem que podem aprender a ginástica intíma – como o pompoarismo também é conhecido - e melhorar o controle da ereção e ejaculação. No curso oferecido por Antar Surya, o público masculino pode receber atendimento particular ou em grupo, mas em ambas as situações na companhia da parceira.
No caso das mulheres, a faixa etária é ampla e varia entre 18 e 65 anos. “Cada uma vem com uma demanda diferente, mas todas se responsabilizando pelo próprio prazer e autoconhecimento. Algumas chegam querendo aprender a conquistar o orgasmo e outras querendo mais prazer”, fala a terapeuta.
A faixa etária dos casais também é variável. “São jovens, maduros e com algumas dificuldades de comunicação na área sexual”, diz. Para o ginecologista e sexólogo Ramon Luiz Moreira a relação sexual é uma interação, “um diálogo não verbal, às vezes verbal também. A sintonia permite que ambos se dêem prazer de forma mais intensa. Não é uma opinião científica, mas acho que no orgasmo feminino entram 50% de responsabilidade de cada um dos parceiros”.
Aprendendo o pompoar
O curso oferecido na capital por Antar Surya tem duas horas de aula teórica “sobre anatomia feminina, os mistérios da psique feminina e sobretudo sobre energia”, explica a terapeuta. Após um intervalo, as outras duas horas são de prática onde mulheres e homens aprendem os exercícios selecionados de pompoarismo que são adaptados à vida da mulher moderna. “É preciso praticar em casa para obter o resultado. Por isso, escolhi as variações que são possíveis de fazer para quem tem pouco tempo”, detalha.
A recomendação é o uso de roupas confortáveis, como as que se usam em ginástica. Para as mulheres, calça ou bermuda de lycra e camiseta. Para o homem, bermuda e camisa.
Vanessa* tem 24 anos e conta que procurou a ginástica íntima por indicação de uma amiga. “Eu tinha curiosidade e sabia dos benefícios para o organismo feminino e para a saúde”, relata. Ela fez o curso recentemente e diz que ainda não sentiu na prática os resultados. “Demora e é preciso persistência”, fala. Casada, a funcionária pública diz que às vezes tem um pouco de dúvida se está fazendo o exercício de maneira correta.
Nesses casos, Antar sugere o uso de um espelho, da respiração e do próprio dedo para verificar se a musculatura está sendo contraída. Além disso, os próprios acessórios do pompoarismo têm essa função. E se as dúvidas persistirem, procure novamente o terapeuta tântrico.
No pompoar, a vagina recebe o nome de Yoni e o pênis de Ligam. Os acessórios auxiliam substituindo o órgão sexual masculino para dar à mulher a consciência da sua musculatura. Entre eles, estão os vibradores clitorianos, vibradores do Ponto G, próteses, bolinhas e colares tailandeses. “Não é toda mulher que pode ou precisa utilizar esses acessórios. Por isso, é importante a avaliação individual e o resgate da história do períneo de cada mulher”, salienta.
Atente-se
Ramon Luiz Moreira diz que todo o objeto que é usado dentro da vagina e por um tempo prolongado tem risco de provocar infecções. Por isso, explica que a limpeza do material é muito importante. “Afora isso seriam poucas as contra-indicações, a não ser que a pessoa tivesse alguma alergia ao material de que são feitos os objetos de pompoarismo”, explica.
Para a fisioterapeuta Elza Baracho, as ressalvas passam pela prática do exercício em si. “O músculo tem que ter suas funções preservadas para que ele possa responder às demandas sexuais”, ressalva.
A professora e fisioterapeuta Maria Beatriz Alvarenga de Almeida compartilha desse pensamento. Ambas acreditam que não é tão simples, como parece, recomendar exercícios para essa região. Elza cita exemplos: “quando se faz exercícios sem uma avaliação prévia dos músculos, você poderá enfatizar força, por exemplo, sem estar atingindo a força. Já um músculo que tem um tônus alto - e se não for corrigido para a normalidade - a mulher continuará sem ganho de força mesmo com a prática. Além disso, esse aumento de tônus poderá ser o responsável pelos sintomas de dispareunia, que é dor no ato sexual”.
*Nomes fictícios.