Os adolescentes brasileiros começam a ganhar, a partir desta segunda-feira, um perfil inédito em relação aos fatores de risco para doenças cardiovasculares. O Projeto Erica (Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes) pretende avaliar 75 mil estudantes, de 12 a 17 anos, em mais de mil escolas, distribuídas pelas 124 cidades, incluindo todas as capitais. Em Minas Gerais, serão visitadas 56 escolas (43 em Belo Horizonte) de 11 municípios. Considerando os resultados obtidos no piloto do projeto (veja os resultados abaixo), a preocupação mais ampla com as doenças ligadas ao coração e ao metabolismo dos adolescentes já pode estar chegando em cima da hora. Quase atrasada.
O Erica é coordenado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e financiado pelo Ministério da Saúde. Em Minas, o projeto é desenvolvido em parceria com a Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A professora do Departamento de Pediatria e coordenadora da pesquisa no estado, Cristiane de Freitas, explica que o Erica também quer conhecer a proporção de adolescentes com diabetes mellitus e obesidade.
A equipe é multidisciplinar, composta de médicos, nutricionistas, enfermeiros, educadores físicos, odontólogos e fisioterapeutas. Em 2013, o foco será nas regiões sul, sudeste e centro-oeste. Em 2014, as equipes partem para as regiões nordeste e norte.
Cartilha
Um diferencial do projeto é a importância dada à a visão dos próprios jovens sobre sua saúde e suas condições de vida. Com ilustrações e textos do cartunista mineiro Ziraldo, a cartilha do Erica faz uma analogia com as paixões adolescentes para explicar que nem sempre a pressão alta e as batidas aceleradas são sinal de uma paixonite (clique aqui para acessar o conteúdo completo). Cristiane explica que a privação do sono, a experimentação precoce de álcool e cigarro, o uso de drogas, a obesidade e o sedentarismo são fatores considerados de alto risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. “Eles podem ter consequências graves, como os acidentes vasculares cerebrais e infartos. A situação pode ser ainda mais grave quando esses fatores são interligados”, revela.
Segundo a pediatra, a obesidade, cada vez mais comum, é a maior vilã, alimentada principalmente pelo consumo de alimentos industrializados e pela redução de atividades físicas e horas de sono. Ela também lembra que, além dos fatores sociais e ambientais, a genética pode ser um indicativo de risco cardiovascular. No site do Erica, é possível fazer uma avaliação preliminar do estado nutricional, no item Cheque sua Saúde: www.erica.ufrj.br/exame
O Erica
De acordo com a professora da UFMG, o Erica não é apenas um estudo para verificar a prevalência dos doenças entre os adolescentes. “Também queremos aproximar os jovens da atenção primária à saúde e vice-versa, sem críticas. Além dos dados coletados, o estudo vai provocar efeitos secundários muito positivos, como ampliar o diálogo entre escolas, pais e alunos sobre saúde e chamar a atenção para a relação do adolescente com seus hábitos”, afirma.
Os dados coletados permitirão reunir características físicas na população brasileira de 12 a 17 anos como peso, altura, pressão arterial e circunferência da cintura, o que será importante para diversas outros estudos no futuro. A população de pesquisa corresponde ao conjunto de adolescentes matriculados em escolas dos 273 municípios com 100 mil habitantes ou mais de todo o Brasil.
Resultados prévios
Entre abril e junho de 2012, foi realizado um estudo piloto com adolescentes de cinco cidades: Rio de Janeiro (RJ), Cuiabá (MT), Feira de Santana (BA), Campinas (SP) e Botucatu (SP). Foram avaliadas 1136 pessoas, e os resultados já são suficientes para um alerta: 20% apresentaram sobrepeso e 10% obesidade, ou seja, 30% têm excesso de peso. Além disso, 12% dos adolescentes tiveram pressão arterial limítrofe e 10% pressão arterial elevada.
Neste piloto, os pesquisadores indicaram acompanhamento em serviço de saúde a 32% dos adolescentes avaliados, por apresentarem obesidade, pressão arterial elevada ou alterações metabólicas. Os estudantes também responderam a um questionário sobre hábitos e comportamentos relacionados à saúde, entre eles, tabagismo, consumo de álcool, atividade física, hábitos alimentares, saúde bucal e reprodutiva.
Veja alguns dos resultados e observe se eles podem estar se repetindo na sua casa ou com seus amigos:
- A presença de computador com internet em casa foi mencionada por 78% dos adolescentes.
-Sobre os hábitos alimentares, aproximadamente 20% dos adolescentes relataram não tomar café da manhã e 28% tomam café da manhã às vezes.
-Apenas 34% dos adolescentes relataram que almoçam com os pais/responsáveis todos os dias e 45% que jantam com seus pais/responsáveis diariamente.
-Cerca de 30% dos adolescentes almoçam e jantam assistindo TV todos os dias e 85% dos adolescentes comem “petisco” assistindo TV.
-Aproximadamente 50% dos adolescentes passam mais de 3 horas por dia em frente ao computador, videogame ou televisão, sendo que destes, 10% relataram passar mais de 7 horas por dia.
-Cerca de 20% dos adolescentes estudados já iniciaram sua atividade sexual, sendo que esse percentual foi de 13% para as meninas e de 27% para os meninos.
-Com relação à saúde bucal, quase 50% dos adolescentes relataram não fazer uso do fio dental para higienização dos dentes.
-Com relação à prática de atividade física, 11% dos adolescentes não praticam nenhuma atividade, enquanto 33% praticam pelo menos uma e 20% pelo menos duas atividades físicas por semana.
-Do total de adolescentes avaliados, aproximadamente 16% relataram já ter experimentado cigarros, mas apenas 2% dizem que fumam atualmente. Cerca de 26% ficam em contato com a fumaça de cigarros na casa onde moram e 45% dos adolescentes têm contato com a fumaça fora de casa.
-Cerca de 54% dos adolescentes já experimentaram ou ingeriram bebida alcoólica, sendo que 9% destes relatam não ter bebido mais do que alguns goles. Nos últimos 30 dias, 14% dos adolescentes declararam ter ingerido bebida alcoólica 1 ou 2 dias, sendo que 3,2% ingeriram 5 ou mais doses. Os tipos de bebidas mais consumidos são cerveja, ice e drinques à base de tequila, vodka ou rum.
-Em relação à duração das horas de sono, retirando-se algumas respostas extremas (menos de 3h ou mais do que 14h), cerca de 5,5% dos adolescentes disseram dormir menos de 6h por noite e 13% mais de 10h.
Coração partido não é a única ameaça ao coração adolescente
Estudo que avalia risco de doenças cardiovasculares entre estudantes brasileiros de 12 a 17 anos começa hoje visitas a escolas públicas e particulares. Veja a cartilha e conheça o projeto Erica