Diz a crença popular que as melhores estão debaixo da terra. Que o aconselhável é não morarmos tão longe dela a ponto de ela nos visitar de malas, mas também não tão perto que chegue de chinelinhos. Para alguns, é um anjo reencarnado. Para outros, o próprio capeta vestido de mulher. O certo é que a simples menção da data de hoje, 28 de abril, em que se comemora o Dia da Sogra, traz à mente da maioria das pessoas piadinhas ou tiradas infames do tipo: “Feliz foi Adão, que não teve sogra”. Mito ou realidade, essa relação com as mães dos cônjuges é sempre um tema polêmico. Essa personagem, querendo ou não, segundo especialistas, é destaque na relação de um casal. E, apesar dos adjetivos maldosos que dão a elas, há muitos que não vivem sem elas e dizem que, em vez de bruxa, encontram em seus caminhos verdadeiras fadas.
De tanto ser criticada e vista como um fardo na vida das noras e genros, ou das namoradas e namorados, a sogra virou objeto de estudo. O meio acadêmico já busca entender que tipo de relação é essa que desperta tantas piadas e controvérsias. Para a surpresa daqueles com um repertório de gracinhas prontas sobre elas, os pesquisadores têm descoberto que quem mais tem a reclamar dessa relação são as noras e namoradas. Ou seja, os homens, que replicam as frases feitas contra sogra para arrancar gargalhadas, têm relações melhores do que as mulheres com as mães de seus maridos e namorados.
Prova disso está pelo mundo. Entre 1985 e 2008, a psicóloga Terri Apter, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, analisou o comportamento de 156 pessoas (49 esposas, 40 maridos, 49 sogras, 18 sogros e 10 enteados). Resultado: elas reclamavam mais das sogras, e não eles (60% contra 15%, acredite!). A pesquisa resultou no livro What do you want from me? (O que você quer de mim?), que procura esmiuçar tais relacionamentos e propor sugestões para melhorá-los. No ano passado, cerca de 2 mil mulheres responderam a pesquisa de um site britânico, e acusaram suas sogras de sempre criticarem suas habilidades como mãe, inclusive na frente do parceiro e dos filhos. Quase um terço das pesquisadas disse que as sogras as faziam se sentir como não merecedoras do marido.
É claro que você deve conhecer alguém com as mesmas reclamações. Mas, os novos tempos têm mudado, cada vez mais, essas relações. Apesar de ainda haver conflitos, não são raros os genros e noras que encontram um caminho respeitoso e agradável para esse relacionamento. Já imaginou alguém se dar tão bem com a sogra a ponto de ser sócio dela? Imagine então uma sogra com quatro genros que disputam, às vezes até com ciúmes, a sua atenção. Um deles até mora com ela e não se importa, pelo contrário, adora. Há aquela que, diante da opção sexual do filho, acolhe o parceiro escolhido por ele como um outro filho. “Se você ama sua cria, e quer vê-la feliz, para que interferir?”, ensina Myriam Elizabeth Macintyre Lisboa, de 64 anos, a sogra de Cláudio Freitas Rocha, de 42, que o ajuda como sócia em seu restaurante, Requinte Gerais. Ela diz que o segredo é justamente esse: não interferir em nada.
Relação descomplicada
O pacote é completo: sogro, cunhado, cachorro, papagaio e a sogra. Quem começa um relacionamento a dois e pretende levá-lo a sério sabe bem que essa relação não se restringe a apenas duas pessoas. Vai muito além disso . “Quando se namora, namora a família inteira”, dizem por aí. Não sem razão. Ter um bom relacionamento com a figura materna é peça-chave. Sabe-se que, muitas vezes, por ciúmes, apego à cria ou simplesmente por implicância, a sogra acaba virando uma cobra. “Existem sogras. E a palavra é no plural. Ao mesmo tempo em que pode haver aquela megera, haverá aquelas que são companheiras, cúmplices e uma segunda mãe”, comenta o psicólogo Roberto Chateaubriand. Não tão raras e contrariando os ditos populares, as boas sogras estão cada vez mais se adaptando aos novos tempos, estão mais abertas e verdadeiras amigas.
Hoje, domingo, pode ter certeza: na casa de Sandra Mara do Santos, de 55 anos, vai ter cenas de ciúmes. E não se engane pensando que Sandra, sogra de quatro genros, é quem vai ter a crise. Nada disso. Apaixonados por Sandra, os quatro maridos de suas filhas brigam pela atenção dela. Mas é o estudante universitário Henrique Martins de Oliveira, de 22, companheiro da Marina, que nessa brincadeira tem se dado melhor. Ele mora com ela, Marina, e o filho, Davi, de 3. “Ela é praticamente minha mãe, me dá muitos conselhos e me ajuda demais. Além disso, tem uma mão santa, cozinha divinamente”, diverte-se Henrique. E ninguém discorda. Sandra diz que quando conheceu Henrique, o que mais gostou nele foi a simplicidade. “Chegou tímido aqui em casa, fui logo avisando: namorar é dentro de casa. Ele entrou e não saiu mais”, conta Sandra, que lembra que outro genro já morou com ela.
“Adoro todos eles. São como meus filhos. Quando há uma discussão de casal, não me intrometo, nem tomo partido. Se eu entrar, eles fazem as pazes e depois quem fica ruim na história sou eu. Sogra calada já está errada, né?”, brinca. A experiência de Sandra retrata bem o que dizem os especialistas: “Não existe relacionamento a dois”. Ao nos relacionarmos, trazemos conosco um pacote de vivências. “E isso pode incluir uma família mais ampliada, como filhos de outras relações ou nossos familiares. A gente está sempre trazendo para o relacionamento a dois uma certa multidão”, comenta o psicólogo.
De acordo com ele, querendo ou não, a sogra está muito presente não só no imaginário. Ele diz que levamos para nossas relações essa figura materna. “E muitas vezes, essa mulher não está presente nem interferindo diretamente no relacionamento, mas o filho traz essa figura para dentro de casa.” Uma reclamação comum é a queixa das esposas que são comparadas às sogras pelos maridos. “Eles dizem: ‘Minha mãe faz isso muito bem’.”
Essa comparação, considerada desleal pelo psicólogo, reflete a idealização da mãe pelo filho. “Esse homem que faz essa comparação, terá, na sua memória afetiva, a sua mãe como a melhor mulher.” O especialista diz que é preciso rever esses papéis com distinção. “Mãe é mãe, mulher é mulher”. Como pais, segundo Roberto, há, desde sempre, o pronome possessivo “aquele é meu filho, minha filha”, e, ao longo do tempo, eles passam a perceber que “aquele que era meu passa a ser do mundo”. “Tem mães que não conseguem fazer essa passagem. Mas outras sim. Incentivam a autonomia da cria e respeitam isso.”
RESPEITO
É com muito respeito que Sebastiana Flausina Luísa, de 49 anos, trata as escolhas de seus filhos. Mãe de Bruno Ferreira, de 25, ela conta que sempre desconfiou de que ele gostava mais de meninos do que de meninas. E levou isso numa boa. Tanto é que um antigo namorado de Bruno morou com ela mais de um ano. Hoje, Bruno namora Sérgio, outra alegria para Sebastiana. “Já se tornou meu amigo. Gosto dele, não tenho ciúmes e sei que meu filho está feliz.” Sérgio Cruz tem 42 anos e é empresário na área ambiental. Adora Sebastiana e diz que, em um relacionamento homoafetivo, essa relação com a sogra é, na maioria das vezes, saudável.
Em seu último relacionamento, que durou 16 anos, sua mãe foi exemplo de boa sogra. “Ela se casou no cartório com o meu parceiro da época, para que nós dois conseguíssemos ter os nossos direitos”, lembra, dizendo que sua mãe já faleceu, mas foi um bom exemplo, assim como é Sebastiana. “Quando há uma relação de dois homens, não há concorrência com a mãe do outro. A sogra ganha mais um filho.” Sérgio nem se importa com o fato de Sebastiana ter fotos do ex de Bruno em casa. “Isso demonstra o carinho que ela tem por ele.”
Como existem sogras e sogras, também há genros e genros. Cláudio Freitas Rocha, de 42, conta que no início do namoro com Laila, há 22 anos, não era tão bem-aceito. Mas, com o passar do tempo, conquistou a família e a sogra o conquistou também. Tanto é que há 17 anos saiu do banco onde trabalhava e resolveu montar um restaurante, tendo como sócios os sogros. Myriam Elizabeth Macintyre Lisboa é a sogra e mete a colher, somente no restaurante. Escocesa, ela diz que Cláudio virou filho. “Se a minha filha achou alguém que a faça feliz, tenho mais é que dar força. Vejo que os brasileiros têm a cultura de que a sogra não é bem-vista por interferir demais. Não faço isso. Ele é uma das pessoas que mais admiro, foi uma bênção para a minha filha.” Cláudio retribui os elogios dizendo que gosta demais dessa postura dela, sem interferências na vida do casal.
Sem entrar em competição
Está comprovado: o fantasma da sogra megera aparece é para as noras. Por isso, homens que enchem a boca para falar mal das mães de suas parceiras podem repensar essas teorias, porque, segundo muitos estudos, essa rixa é entre as mulheres. Apesar de real e muitas vezes motivo de separação entre os casais, o mal-estar entre elas pode ser driblado e superado. Há quem encontrou nelas verdadeiras mães, amigas e companheiras inseparáveis, e mantém, então, relações harmoniosas, pede colo, arrego e diz ser até invejada por outras mulheres, que não tiveram a mesma sorte.
A professora Amanda Zanetti, de 29 anos, é uma dessas que podem agradecer a Deus. Sua sogra, Vânia Márcia Carvalho Costa, de 54, é uma espécie de anjo em sua vida, o que até para as suas amigas é algo “exótico”. Casada há três anos, depois de ter namorado Gustavo por nove anos, Amanda diz que sempre foi companheira de Vânia. “Ela sempre está disponível para me ajudar. Criamos um laço muito forte.” A relação ficou mais intensa depois que Amanda teve Maria Luiza, hoje com 2. “O amor que ela tem pela neta me emociona. Sou muito grata a ela”, orgulha-se.
Foi também depois da gravidez que o laço de Fátima Melo Mendes com a sogra, Clélia Gomes, de 60, ficou ainda mais forte. Com 25 semanas de gravidez, há dois anos, Fátima, que sempre se deu muito bem com Clélia, começou a ter complicações que poderiam resultar em um parto prematuro. “Minha sogra saiu lá de Baependi, no Sul de Minas, para me ajudar. De uma forma muito respeitosa, ela entrou na nossa casa e tomou conta de mim.” Eduardo não foi prematuro e, nos primeiros dias de vida, contou com a ajuda das duas avós. “Junto com a minha mãe, Clélia fez tudo para me ajudar. Foi de uma bondade incrível. Quando ela voltou para a cidade dela, chorei demais.”
Fátima teve depressão pós-parto e adivinha quem deu a mão para ela nessa hora? Sua sogra. “Eu e Eduardo fomos para Baependi. Ela cuidou de tudo, até que eu melhorasse. É um anjo na minha vida”, diz, contando que, infelizmente, não a vê todos os dias, mas conversam com frequência pelo telefone.
Essas lindas histórias de Amanda e Fátima, segundo os estudos, são raras. Uma em cada quatro mulheres não suporta essa parente. A pesquisa, divulgada em 2011, é do site Netmums, e aponta que as insatisfeitas descrevem a sogra como "controladora, intrometida e megera". Cerca de 2 mil mulheres responderam a pesquisa e algumas dessas situações levaram ao rompimento do casamento.
QUEIXAS É uma realidade. Sem a sorte de Amanda e de Fátima, e pelos consultórios psiquiátricos brasileiros, é comum as pacientes se queixarem das mães de seus companheiros. Segundo conta o vice-presidente da Associação Mineira de Psiquiatria e professor titular de psiquiatria da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Humberto Correa, as causas são as mais variadas para essas relações conflituosas. “Para muitas mães, ninguém será capaz de cuidar de seus filhos como elas”, diz. O psicólogo Roberto Chateaubriand lembra que as piadas sobre essa parente geralmente são ditas por homens, “mas os dramas reais são vividos pelas mulheres”, compara.
Ele lembra do dito “se caso uma filha, ganho um filho. Se caso um filho, o perco”. Essa é a teoria que muitas noras sabem na prática. “No dia a dia das mulheres, essa concorrência é quase desleal. Há muitos casos em que a mãe do homem entra no relacionamento muito idealizada por ele.” Segundo ele, isso vem da maternidade. “A relação da mãe com o filho homem tem traços de paixão. A própria psicanálise, em uma linha freudiana, cita o mito de Édipo (personagem da mitologia grega famoso por matar o pai e casar-se com a própria mãe). Essa paixão reescrita na relação materna mostra que há uma certa prevalência afetiva, em que a mãe vai cuidar desse filho quase colocando-o debaixo das asas. Ele é uma espécie de reizinho, de bem maior.”
Para muitas mulheres, então, ter uma nora é uma espécie de competição, ameaça. “Segundo a psicanálise, esse menino veio para completar a vida dela como mulher. Ao se tornar um homem, a mãe não consegue desgrudar dele e, muitas vezes, vai ser a jararaca.” Roberto diz que isso não é regra e nem acontece com a maioria da mães. “A nora não pode cair no jogo de provocação nem entrar na competição, porque vai sair ferida. Tem que pensar em uma estratégia de convivência. A melhor maneira é relevar e não permitir que as provocações tenham efeitos no relacionamento do casal.” Outra tática, segundo ele, é tentar compreender e se colocar no lugar dela. “As noras que conseguem se convencer de que não estão ali para tirar o filho da sogra conseguem driblar isso muito bem”, aconselha. (LE)
Dicas de convivëncia
Para genros e noras
Procure escutar mais que interferir. Tenha uma escuta ativa, procurando não julgar, apenas ouvindo.
Mesmo que você não concorde com nada do que ela diz, foque em pelo menos 1% do que você acredita e seja válido
para você.
Veja somente os lados positivos de sua sogra. Com certeza deve existir alguma coisa nela que seja admirável, não é mesmo? Pelo menos ela gerou alguém que você ama demais. Agradeça-a.
Seja curioso (a). Tenha interesse em saber mais sobre as opiniões, crenças e valores de sua sogra. Ela provavelmente irá compartilhar algumas coisas muito interessantes.
Não entre em provocações nem competições. O ferido pode ser você.
Em caso de ciúmes de sogra, tente mostrar com ações que você não vai roubar sua filha ou filho. E que vocês podem conviver em harmonia.
Respeite-a.
Para as sogras
Tente não interferir na vida do casal.
Respeite sua nora ou genro.
Dê opinião quando lhe pedirem.
Não aponte os erros do genro ou da nora. Tente enxergar as qualidades deles.
Jamais entre na casa do casal como se fosse a dona dela.
Tenha consciência que ninguém vai tirar o seu filho (a) de você, mas ele (a) amadureceu e tem direito de criar a própria família
Respeite as escolhas do seu filho (a). E apoie a sua felicidade.