A apresentadora de TV e chef inglesa Nigella Lawson vem ao Brasil em maio para o lançamento do livro "Na cozinha com Nigella". Considerada musa do "food porn" (moda da fetichização da culinária, que reúne vários cozinheiros, inclusive no Brasil), Nigella teve seus pratos avaliados por um estudo do Reino Unido que causou furor entre os fãs. A pesquisa inclui ainda Jamie Oliver, Hugh Fearnley-Whittingstall e Lorraine Pascale e aponta que as receitas encontradas em seus livros (sempre best sellers) têm calorias, açúcar e gordura saturada além do limite recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O que mais surpreendeu – negativamente – é que em alguns casos os índices foram piores até do que em pratos prontos, congelados e industrializados, vendidos em redes de supermercado.
O trabalho da Universidade de Newcastle, publicado pela revista especializada British Medical Journal, comparou receitas dos quatro chefs/apresentadores de TV com cem refeições prontas. As receitas “assinadas” ganharam apenas no quesito sal.
Os pesquisadores afirmaram que o objetivo foi verificar o senso comum de que cozinhar com ingredientes frescos é mais saudável do que comprar refeições prontas. O artigo diz ainda que valoriza as campanhas pela alimentação saudável e contra a obesidade feitas pelos chefs, mas sugere que o best sellers incluam informações nutricionais, para permitir que as pessoas conheçam o conteúdo dos alimentos. Segundo Martin White, do Instituto de Saúde e Sociedade da Universidade de Newcastle, educar e informar os consumidores é uma norma que deve se aplicar tanto para os chefs da TV quanto para os alimentos nas lojas.
Enquanto alguns chefs, como Jamie Oliver, consideram o debate bem vindo, outros, como Lorraine Pascale, apressaram-se em dizer que “algumas receitas são mais saudáveis que outras; e que os livros e programas de TV não são sobre alimentação saudável, e sim sobre cozinha".
Esse fogo cruzado não precisa alarmar as pessoas interessadas em ter uma alimentação saudável e, ao mesmo tempo, saborosa. Segundo a nutricionista Dircelene Rodrigues, é preciso ter cuidado com esse tipo de informação. “Algumas 'receitas de chef' apresentam exageros como no uso açúcares, óleos e gorduras, mas comparar um prato preparado com ingredientes frescos e refeições prontas (como os alimentos congelados) é um absurdo. Em geral, as comidas congeladas industrializadas possuem conservantes e um alto teor de sódio e gorduras saturadas”, afirma.
De acordo com a nutricionista, o excesso pode levar à obesidade e a doenças cardiovasculares, como a hipertensão; além de não serem fontes de fibras, vitaminas e minerais. Sobre as receitas, ela lembra que os pratos mais sofisticados, em geral, não são preparados diariamente. “Se for esporádico, não há tanto risco à saúde, ao contrário dos congelados, que normalmente são consumidos várias vezes por semana. Vale a pena ficar atento à quantidade de gordura acrescentada à receita: o azeite de oliva extra virgem, por exemplo, é uma gordura 'boa' mas se for acrescentado em grande quantidade pode aumentar muito o valor calórico da preparação”, explica Dircelene.
Para se ter uma ideia, uma colher de sopa de azeite possui aproximadamente 100 kcal. Alimentos como manteiga, sal e realçadores de sabor (glutamato monossódico, temperos como sazon, caldos de carne e de legumes industrializados) devem ficar de fora ou serem usados com muita moderação. “É bom lembrar que alguns vegetais congelados encontrados no mercado podem ser um escolha saudável e que facilita o armazenamento, como ervilhas, brócolis e milho verde, por exemplo.
Reclamões
Cuidar da saúde deveria ser algo natural, mas para muitas pessoas é um sacrifício. Como alguém que leva a vida de forma sempre apressada pode ter uma alimentação saudável? “Planejamento é tudo!”, resume Dircelene. “Quanto mais natural for a alimentação, melhor. Para quem leva uma vida muito corrida o ideal é frequentar o supermercado aos fins de semana e adquirir alimentos para lanches rápidos como biscoitos e pães integras, iogurtes e frutas (vale também as frutas secas e sementes oleaginosas, como as castanhas) que podem ser usados durante a semana. Para quem come fora de casa, o ideal é aumentar o consumo de verduras, legumes e frutas e manter uma rotina com intervalos de no máximo 3h para as refeições”. Ela reforça que evitar o consumo de alimentos industrializados contribui muito para uma alimentação saudável.
O chef Daniel Eitan Spach, que abriu o restaurante Mandala, em Belo Horizonte, preocupado com os efeitos de alguns alimentos sobre o corpo, entre eles o açúcar, cria receitas com grãos, legumes, verduras, frango e peixes preparados no vapor. Ele afirma que é necessário ampliar a visão. “Como tenho família de origem judaica e da Europa ocidental, feijão, arroz, batata frita e bife eram raros em nossa mesa. Não por serem mais ou menos saudáveis, mas pela tradição. Nossa alimentação era muito variada, sempre uma salada crua de entrada, cereais, legumes, carne e sopas. Mais tarde, aos 18 anos, quando comecei a ler sobre a história dos alimentos, percebi que esse universo é muito vasto”, explica.
“Há muitas sugestões e receitas para alimentação saudável, mas mudar algo tão enraizado nas pessoas só acontece quando se muda a visão de mundo. Parece radical, mas não é. Sua percepção sobre o dia a dia tem que se ampliar. Questionar valores, abandonar preconceitos e dar espaço para coisas novas e diferentes, ou seja, mudar o jeito que você vive, e não só a alimentação, são fundamentais para uma vida mais saudável e até um mundo mais saudável”, ensina ele.
E comida saudável pode ser saborosa? Spach, do alto de seus 25 anos à frente de um restaurante de sucesso e de comida saudável, diz que sim. “Há muitos sabores diferentes. Um mesmo ingrediente pode ser saboroso tanto para um vegetariano ou para um vegano, quanto para alguém que come de tudo. Por outro lado, se uma pessoa com hipertensão ou diabetes não mudar sua visão de mundo, haverá muito sofrimento para alterar a alimentação. Mudar a dieta depende de mudar a visão geral”, exemplifica.
A chef Maria das Dores Pazini, também do Mandala, ensina duas receitas práticas que combinam a delícia de fazer um prato com 'assinatura' e a tranquilidade de comer uma refeição saudável, confira:
Shitake recheado
Ingredientes:
5 shitakes in natura (procure padronizar o tamanho)
água a 180° para escaldá-los
Para o recheio:
1 pote de queijo cottage ou 1/2 ricota
100gr de quinoa pré-cozida
1 tomate sem sementes picadinho
1 xícara de café de pimentão vermelho
2 colheres de azeite
sal a gosto
salsinha
1 colher de chá de mel
Modo de fazer:
Misturar até ficar homogêneo. Rechear os cogumelos e levar ao forno apenas para aquecer.
Servir com arroz integral, salada de folhas, tomate cereja, palmito e molho de mostarda com mel.
Tropeiro de soja
Ingredientes:
Soja em grão cozida (2 xícaras)
Salsicha vegetariana (1 lata) - encontrada em casas especializada e supermercados
Torresmo de soja (100grs)
Ovos (2 unidade)
Farinha de mandioca (a gosto)
Óleo de boa qualidade (3 a 4 colheres)
Cebola picadinha (1 unidade)
Alho (a gosto)
½ pimenta dedo de moça sem semente (opcional)
Sal
Modo de fazer:
Para preparar a soja:
Coloque a soja selecionada e lavada com água para ferver. Quando levantar fervura, coe e coloque-a na panela com água fria. Cozinhe até ficar macia, como feijão. Escorra.
Refogue a cebola e depois o alho. Coloque a soja, o sal, a pimenta, os ovos (batidos e colocados em frigideira antiaderente) quebrados em pedaços grandes (para não desaparecer), o torresmo e a salsicha picada. Por último, a farinha.
Para fazer o torresmo de soja:
Deixar a proteína de soja grossa de molho em água quente. Depois de bem umedecida, coar. Levar para cozinhar em água e shoyu. Quando ela estiver macia, escorrer, cortar do tamanho desejado e fritar.
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