“Iludido e enamorado, convenço-me de que tudo isso aqui é mágico e louco, apesar do desencanto e do desencontro entre livro e autor.” Assim Jacques Fux descreveu em 2015 as suas impressões sobre a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), em blog da editora Rocco.
Dois anos depois, o escritor mineiro volta não como visitante, mas como uma das atrações da 15ª edição da Festa. Ele estará na mesa Fuks & Fux, na próxima quinta-feira, com o escritor Julián Fuks (do premiado A resistência), e intervenção de Josely Vianna Baptista, por meio de videopoema. “Vender livros, ser lido e ser conhecido é uma verdadeira guerra. Como eu acredito na qualidade do meu trabalho, me empenho em divulgá-lo. Penso que se as pessoas gostarem das minhas colocações e das minhas falas – que sempre estão relacionadas aos temas e tramas dos meus livros –, talvez possam se interessar pela minha obra”, acredita Fux.
Nascido em Belo Horizonte, Fux é autor dos livros Antiterapias (vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura em 2013), Brochadas: confissões sexuais de um jovem escritor (Rocco) e o mais recente, Meshugá: um romance sobre a loucura (José Olympio, 2016). “A literatura é a minha maior paixão – apesar da dor e do sofrimento com as palavras. É a literatura que me move, que me encanta, que me fantasia – que me torna fantasioso, fabuloso, fabulado.
A seguir, uma entrevista com o autor sobre o seu mais recente romance, que, como define o escritor, mistura ensaio, biografias e lendas de nomes tão díspares como o cineasta Woody Allen, o enxadrista Bobby Fischer e o ator de filmes pornô Ron Jeremy.
Por que você lançou no ano passado Meshugá, um romance sobre a loucura?
A loucura e a genialidade são temas que sempre me interessaram e que, de alguma forma, caminham juntos. Ao longo da minha vida, brinco, venho ‘colecionando loucos’. Histórias fantásticas e lúdicas, mas também muito tristes, de gênios que acabaram enlouquecendo. Como o tema é vastíssimo, resolvi dar ênfase aos mitos e aos preconceitos acerca da loucura judaica. A princípio, achei que o livro seria sério e lúdico como meus outros dois – Antiterapias e Brochadas – mas, ao entrar na cabeça dos meus personagens, ‘vi’ a loucura de perto, com todo o seu sofrimento e com toda sua angústia, e acabei me envolvendo bastante.
Como escolheu os personagens de Meshugá? E como o narrador se insere entre os personagens?
Todos os personagens do livro – Woody Allen, Sarah Kofman, Bobby Fischer, Ron Jeremy, Otto Weininger, Grisha Perelman, Daniel Burros e Sabataii Zevi – são parte do narrador. O narrador conta suas histórias, suas biografias ‘reais’, suas questões mais polêmicas, mas, ao entrar na cabeça de seus loucos, o protagonista enfrenta os próprios monstros e as falsas acusações atribuídas aos judeus: a sexualidade exacerbada, a maior prevalência de doenças mentais, o culto desvairado ao dinheiro, a genialidade nas áreas intelectuais, entre outros.
“A dor do conhecimento é ainda maior, muito maior, que a dor da ignorância”. Você pode comentar o significado dessa frase? Ela se aplica ao Brasil atual?
Estar consciente do ódio que os outros sentem por você, simplesmente por conta de algo que você é – sua religião, sua raça, sua opção sexual, seu sexo, etc. – é extremamente doloroso e difícil de se enfrentar. O meu romance fala dessa dificuldade – quase impossibilidade histórica – de simplesmente aceitar o outro como ele é.
“Lutou contra a dor e a guerra do silêncio.” Esta também é a guerra dos escritores brasileiros?
A arte e as humanidades estão sendo silenciadas. O investimento e o interesse estão desaparecendo. Resta-nos a luta, ainda que inglória, para que a literatura brasileira contemporânea sobreviva... e encontre um pouco mais de leitores. Philip Roth é citado em Meshugá.
O que você mais gosta na obra do escritor de O complexo de Portnoy? Adoro Philip Roth. Recentemente, ele deu uma entrevista dizendo que o Fux mineiro é sua grande inspiração para continuar escrevendo! (Lembrem-se de que ele parou de escrever.) Acho que o Roth escreveu sobre grandes tabus. Gosto da sua ironia, do senso de humor, das críticas ao judaísmo que também revelam uma reverência ao conhecido ‘povo do livro’.
A autoficção é um dos temas anunciados para o seu debate na Flip. Afinal, é autoficção ou autoexposição? Quais as vantagens e riscos de expor a própria vida nas páginas?
Acho que esse termo está muito banalizado. Tudo é, de alguma forma, ‘autobiográfico’. Mesmo não falando explicitamente de ‘sua’ vida, o autor fala do que conhece, do que já leu, do que já vivenciou ou imaginou. Não é possível escrever ou pensar em algo que, de alguma forma, ele não tenha se inteirado. E eu me divirto com a ‘autoficção’. Será que o meu livro Brochadas é 100% verdade? Será que de fato o ‘Jacques Fux’ escreveu para suas ex-namoradas contando o motivo de suas brochadas com elas? E será que o narrador do Meshugá realmente é especialista em sexo oral (um dos mitos tratados) e que ele enlouqueceu junto com seus personagens? Eu vos convido a conhecer minhas autoficções.
Escrever pode “adormecer monstros” ou despertá-los? E escrever Meshugá foi uma libertação?
Puxa, a escrita do Meshugá afrontou e libertou todos os meus monstros. Eu tive que enfrentar as palavras, dialogar com meu pânico e com meus medos. Ao vasculhar histórias terríveis, mas extremamente humanas, e exorcizar a minha própria questão judaica, eu sofri a dor legítima e já muito narrada do ‘escritor’. Eu me descobri finalmente esse escritor, ainda que falte muito trabalho e que isso seja um grande sonho.
Jacques Fux na Flip Mesa Fuks & Fux, na próxima quinta-feira, às 17h15, na 15ª edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Com Julián Fuks e videopoema de Josely Vianna Baptista.
Ingressos no site www.ticketsforfun.com.br
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