As palmas, o frequentador de salas de concerto bem sabe, obedecem a um protocolo. Só se aplaude ao final de uma obra, nunca entre os movimentos (ou seja, as partes da música).
Mas foi com alegria que o maestro Fabio Mechetti as ouviu, mesmo que discretas, quando a Orquestra Filarmônica pisou no palco da Sala Minas Gerais na noite da última quinta-feira (8/07). Foram os primeiros aplausos na sede da orquestra em quatro meses.
Mas foi com alegria que o maestro Fabio Mechetti as ouviu, mesmo que discretas, quando a Orquestra Filarmônica pisou no palco da Sala Minas Gerais na noite da última quinta-feira (8/07). Foram os primeiros aplausos na sede da orquestra em quatro meses.
O regente espera, como todos, que este novo retorno da plateia seja “contínuo e ininterrupto”. Desde o início da crise sanitária, esta é a terceira vez que a Filarmônica volta a ter plateia presencial. Uma frequência ainda tímida, vale dizer.
Duzentas e cinco pessoas assistiram ao concerto dedicado a Mendelssohn e Brahms – este último, com o “Concerto para piano nº 2”, contou com o solista israelense Alon Goldstein.
Duzentas e cinco pessoas assistiram ao concerto dedicado a Mendelssohn e Brahms – este último, com o “Concerto para piano nº 2”, contou com o solista israelense Alon Goldstein.
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Álbum produzido na pandemia é documentário sonoro do períodoUai, Indica Essa #33: top 10 lançamentos musicais de junhoAntes de embarcar para shows nos EUA, Ego Kill Talent lança disco acústicoÉ um número inferior ao permitido pelos protocolos da própria Filarmônica, que autoriza a presença de até 393 pessoas (26% da lotação da Sala Minas Gerais, que comporta 1.493 lugares). Neste momento, mais do que números, é o significado da presença física o que mais importa. E, desta vez, diferentemente das outras duas retomadas de apresentações ao vivo, a vacinação está em curso.
Enquanto o concerto de sexta (9/07) foi aberto ao público em geral, a noite de quinta foi exclusiva para assinantes da orquestra. Parte dessa plateia não mudou sua programação no último ano. Continuou assistindo regularmente à Filarmônica, só que de casa. O programa de transmissões ao vivo teve início em agosto de 2020, quando a Sala Minas Gerais foi reaberta para os músicos da orquestra.
ÓRFÃO
Giovane Medeiros, assinante “desde a época do Palácio das Artes”, não perdeu uma só transmissão.
Na TV da sala de casa, acompanhou todos os programas, inclusive os das séries que não assina. Nos intervalos das apresentações, corria para o celular para publicar no chat da Filarmônica no YouTube. “Eu, que tinha ficado meio órfão, continuei a manter o vínculo com as transmissões. Estreitei os laços”, disse ele, de volta à Sala Minas Gerais com a amiga Sônia Cury, sua companheira de Filarmônica.
Na TV da sala de casa, acompanhou todos os programas, inclusive os das séries que não assina. Nos intervalos das apresentações, corria para o celular para publicar no chat da Filarmônica no YouTube. “Eu, que tinha ficado meio órfão, continuei a manter o vínculo com as transmissões. Estreitei os laços”, disse ele, de volta à Sala Minas Gerais com a amiga Sônia Cury, sua companheira de Filarmônica.
Ela, por seu lado, só aprecia o formato presencial. “Gosto do programa, me aprontar, vir aqui.” Sônia nem precisou ver o e-mail que a Filarmônica enviou aos assinantes informando da retomada da programação presencial. Giovane já a havia informado. “A emoção de estar de volta é grande.
A gente mata a saudade e aquece o espírito”, diz ele.
Já vacinado, o casal Mauro Macedo e Vânia Paiva, assinantes das séries Allegro e Presto, aguardava com ansiedade o início da apresentação desta semana. Ele chegou a assistir a algumas transmissões – ela gosta mesmo é do ao vivo. Os dois não perderam um só concerto na sala. A cada nova reabertura marcavam presença.
SORTE
Em meio a tantas adversidades, a Filarmônica teve sorte. No final de 2019, antes de se falar em COVID-19, foi inaugurado no quinto andar do prédio que abriga a Sala Minas Gerais um estúdio de transmissão.
Naquele momento, o objetivo era fazer cinco transmissões em 2020. Somente no ano passado, foram 20 transmissões ao vivo, além de várias gravações exibidas nos canais digitais da orquestra.
“Não há como negar que, com a tecnologia que temos à disposição, levamos a orquestra para mais pessoas. Não consigo provar com dados absolutamente concretos, mas acho que nenhuma orquestra fez tanto quanto a Filarmônica durante a pandemia. Fizemos concertos, a Academia Filarmônica, apresentações de câmara”, comenta Mechetti.
Impossibilitada de fazer as turnês que empreende a cada ano pelo interior de Minas, a Filarmônica vai exibir, em breve, para as cidades que a receberiam neste ano, um vídeo com uma apresentação gravada em Inhotim. “É impossível duplicar a experiência do concerto pela tecnologia, mas essa é a maneira de as pessoas terem contato com a música”, acrescenta o regente.
No amplo espectro de incertezas que nos cercam, não há dúvidas de que o digital permanecerá. O concerto de anteontem foi transmitido pelo YouTube – o mesmo vai ocorrer com datas subsequentes da programação de 2021. Mas não basta se equipar de máquina, tem que ter gente também. E são sete profissionais que fazem com que cada movimento da batuta do maestro, cada página de partitura, fiquem bem próximos das pessoas que, de casa, assistem aos concertos.
Há inclusive um maestro na equipe – o regente carioca Leandro Oliveira dirige as transmissões. Sem casaca ou gravata-borboleta, mas de partitura em mãos, ele comanda o posicionamento de câmeras (são seis, remotas, colocadas em locais estratégicos da sala de concertos).
Oliveira estuda cada repertório da Filarmônica para saber o momento em que a câmera deve focar no maestro ou em um instrumentista específico. Assisti-lo, na sala de transmissões, é vê-lo quase bailar. O silêncio da sala é quebrado apenas com os comandos que ele dá aos dois assistentes para cada corte de cena.
Oliveira estuda cada repertório da Filarmônica para saber o momento em que a câmera deve focar no maestro ou em um instrumentista específico. Assisti-lo, na sala de transmissões, é vê-lo quase bailar. O silêncio da sala é quebrado apenas com os comandos que ele dá aos dois assistentes para cada corte de cena.
Dividindo-se entre o Brasil e os EUA, Mechetti afirma que a situação das orquestras difere. “Há duas semanas, regi um programa no Texas em que todos, músicos e o público estavam sem máscaras. Por outro lado, a maioria das orquestras americanas parou completamente desde o início da pandemia. Houve aqueles que nem fizeram transmissão.”
VACINADOS
Com o avanço da vacinação, um terço dos 90 instrumentistas da orquestra foi vacinado.
Neste momento, só é possível executar um repertório com um número menor de músicos – em torno de 50 vão para o palco a cada concerto. A programação de 2021 vai sendo redesenhada de acordo com o andamento da crise sanitária.
O pianista Alon Goldstein, que mora nos Estados Unidos, primeiro solista estrangeiro a tocar com a Filarmônica desde março de 2020, substituiu o italiano Benedetto Lupo, que originalmente seria o convidado da noite. “Há mais facilidade em trazer aqueles que vêm dos EUA do que os da Europa, com mais restrições”, comenta Mechetti.
A pandemia impediu que uma das maiores estrelas brasileiras da música de concerto, o pianista Arnaldo Cohen, que anualmente se apresenta com a orquestra, venha ao Brasil neste ano.
Ele faria dois concertos, em 22 e 23 julho próximos, executando o “Primeiro Concerto de Brahms”. Em seu lugar virá o pianista carioca Eduardo Monteiro, que vive em São Paulo.
Ele faria dois concertos, em 22 e 23 julho próximos, executando o “Primeiro Concerto de Brahms”. Em seu lugar virá o pianista carioca Eduardo Monteiro, que vive em São Paulo.
Desde o decreto da Prefeitura de Belo Horizonte que autorizou, a partir do sábado passado (3/07), o funcionamento de cinemas, museus e casas de espetáculos na capital, foi a Filarmônica a primeira formação a apresentar música ao vivo em um espaço cultural. É o início de um longo caminho rumo à almejada normalidade.
Não é o ideal tocar para um público restrito, com muito distanciamento entre as pessoas, que têm que usar máscara o tempo todo, estejam elas no palco ou na plateia.
Mas é possível e seguro. Esse foi o recado que a noite deixou.
Mas é possível e seguro. Esse foi o recado que a noite deixou.
José Soares no “Harmonia”
Maestro-assistente da Filarmônica, José Soares é o entrevistado do programa “Harmonia”, que vai
ao ar neste domingo (11/07), às 14h, na Rede Minas. Soares, que assumiu o cargo no início de 2020, fala sobre suas referências e as responsabilidades do papel que exerce junto à orquestra. Também serão exibidos concertos que ele regeu junto à formação, executando obras de Strauss e Brahms.