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NOVO NORMAL

Pandemia força produtora a trocar a música pela fabricação de pão artesanal

Para a grande maioria dos produtores musicais, o ano geralmente só começa mesmo depois do carnaval. Janeiro é fraco, em fevereiro podem até surgir alguns trabalhos na folia, mas a agenda só se firma mesmo só em março. Era o caso de Amanda Souza, que tinha vários shows marcados até o segundo semestre do ano passado. Entre eles, os de Ana Cañas e da banda Maglore. Um disco de Benti, que sairia pelo selo Natura Musical, também estava previsto para 2020.



“Justamente depois do carnaval, com as coisas começando a engatar, veio a decretação da pandemia. Dias antes do decreto, alguns shows já começavam a cair. Em 15 dias, caiu tudo que tínhamos”, relembra. “De todas as datas, só o Itaú Cultural honrou o cachê. Assinamos um aditivo para fazer o show quando pudermos. Ninguém honrou cachê, a entrada de grana foi para o saco.”

Em situações tensas assim, Amanda tenta ser equilibrada e não perder as estribeiras. Mas ela começou a ficar aflita por não saber quando voltaria a trabalhar com o que ama, a música. O desespero em relação à questão financeira bateu ao imaginar como ficariam os colegas da área técnica. “Vivemos no perrengue, mas essa galera enfrenta perrengues piores. Eles realmente vendem o almoço para comprar a janta”, afirma.

Muito antes de ter plano B e constatando a inércia do poder público em relação ao setor, Amanda procurou um jeito de ser útil ao meio musical naquele momento tão delicado. Colaboração dada, percebeu que havia chegado a hora de se mexer para não pirar dentro de casa, onde cumpria rigorosamente o isolamento social.



O caminho veio da cozinha. “Faço minha comida, gosto de bolo, mas nunca havia feito pão na vida. Resolvi fazer pão”, conta. Os primeiros passos vieram com a ajuda de tutoriais no YouTube. Foi então que ela descobriu a fermentação natural. “Achei magnífico, complexo, lindo, mas muito difícil. Apanhei muito.”

Mesmo assim, não desistiu. Quanto maior o desafio, mais ela estudava. “Os primeiros pães com uma cara legal saíram em agosto. Demorou e eu resistia a vendê-los, não me achava pronta. Em setembro, a ficha caiu. Todas as fontes de música secaram”, diz a produtora, que participou de lives e shows organizados pelo Sesc São Paulo.

De lá para cá, a Absurda Padaria Artesanal (@absurdapadaria) é um sucesso. Amanda, que mora em São Caetano, no ABC Paulista, reserva de um a dois dias só para atender pedidos que chegam de São Paulo.



A produtora cultural garante que não vai trocar a música pela padaria artesanal, mas agora tem outro ofício. “Aprendi um novo caminho, que me dá prazer e dinheiro. Trabalho muito mais para ganhar um terço do que ganhava antes. Não estou falando em tom de reclamação, melhor isso do que ficar sem receber R$ 1.”

Ao comentar o futuro nesta era da pandemia, Amanda prevê um cenário complicado. “Estamos atrasados em relação ao mundo, não sabemos quando chegarão os insumos por conta da inabilidade diplomática com a China. O governo, por absoluta incompetência e um projeto genocida, não comprou vacina”, critica. E garante: “2022 será um ano muito difícil. Tenho a consciência de que ainda vou amassar muito pão.”