Conheça jovens artistas que desafiaram 2020 e lançaram suas carreiras

Estrear durante a pandemia do novo coronavírus não era o que eles planejaram, mas esses músicos de BH não desistiram de pôr o pé na estrada (virtual)

Frederico Gandra* 01/11/2020 04:00
Paulo Puiati/Divulgação
(foto: Paulo Puiati/Divulgação)
A Pandemia provocou uma pausa forçada na carreira dos artistas que estão na estrada há muitos anos e frustrou as expectativas de quem se preparava para estrear neste 2020. 

É o caso da banda belo-horizontina Bordoá, formada por Mateus Gregori (vocal e guitarra), Arthur Santos (guitarra), Jojo Myrrha (baixo), Felp Brandão (bateria) e Gustavo Glasser (teclado), que concluiu a gravação do seu primeiro álbum, Divagar, em janeiro passado. 

Formado no início de 2019, o grupo planejava fazer sua estreia no palcos neste ano, mas a duas semanas de lançar o primeiro single, viram a capital mineira entrar em quarentena para deter a disseminação do vírus, com o consequente cancelamento dos eventos culturais.

“Foi uma semana em que a gente estava naquela tensão (do lançamento) e aí explodiu a pandemia. A gente viu que teria que fazer tudo on-line mesmo e lançar a banda sem poder fazer shows. A partir daí, começamos a nos programar”, conta Mateus Gregori, de 21 anos. 

A data de lançamento do single Vai dizer foi mantida em 27 de março nas plataformas digitais e o resultado logo surpreendeu a banda - mais de 30 mil reproduções no Spotify em um mês. Traduzido em reais pela plataforma, esse número rendeu R$ 100 aos artistas.   

Desde então, a Bordoá disponibilizou mais duas músicas (Imóvel e Erva doce),  apostando em métodos de marketing digital para promover as faixas. Lançada em 18 de setembro, Erva doce entrou nas playlists Viral Belo Horizonte e Indie Brasil, do Spotify, onde a banda acumula mais de 7 mil ouvintes mensais. 

“Estamos conseguindo ter um resultado muito bom sem nunca ter mostrado a cara ao público. A gente falava: 2020 vai ser o nosso ano. E não rolou como a gente imaginava, mas mesmo assim tem dado certo”, diz Gregori.    

Para Imóvel, a banda decidiu fazer um videoclipe, dirigido por Mariana Ávila. Lançado no dia 3 de julho (juntamente com a faixa), o clipe reflete o contexto de reclusão social, a partir de imagens em preto e branco dos artistas interagindo com objetos em suas casas. 

“A música conversava com esse momento de estar sozinho, isolado, preso em casa e de não conseguir sair. Daí surgiu essa ideia do clipe para traduzir isso em imagens. É uma alternativa muito boa para a divulgação, porque um acompanhamento visual faz muita diferença”, diz o vocalista.  

A banda agora planeja lançar Divagar, composto por sete faixas, no próximo dia 13, em todas as plataformas digitais. A banda teve dúvida sobre lançar o disco sem nunca ter feito um show ou angariado grande público, mas decidiu apostar na sorte neste ano inusitado

“A carga emotiva do álbum casa muito com esse momento atual. Imaginamos que seria legal lançar neste ano porque, no futuro, uma pessoa que pegar o disco e vir que foi lançado em 2020, que é um período histórico, pode falar: ‘Isso tem alguma coisa’.”

Rafael Urbanin/Divulgação
(foto: Rafael Urbanin/Divulgação)


SEM CORRERIA

João Pedro Cruvinel, de 20 anos, também lançou seu primeiro single, Ainda espero, nas plataformas digitais durante a pandemia. “Foi um desafio, mas ficou mais fácil na quarentena. O foco foi muito grande, a gente conseguiu planejar tudo muito certinho, sem a correria do dia a dia”, diz. 

Disponibilizado no dia 31 de julho, a faixa é acompanhada por um videoclipe produzido pela Música aos Montes. A pandemia acabou  dificultando o cronograma de lançamento, mas o artista solo, com raízes voltadas para a MPB, decidiu manter a programação e gravou a faixa na quarentena, fazendo voz e violão.  

Apesar de escrita há três anos, Ainda espero encontra eco no contexto do confinamento imposto pela pandemia da COVID-19. O verso “vejo que já está normal a gente não se ver”, por exemplo, abre a canção, encaixando-se acidentalmente com o momento atual. 

“Eu quis dizer muito sobre essa questão da distância e encaixou nessa ideia da pandemia. Foi uma questão que a gente só foi perceber depois de lançar e faz muito sentido. Essa foi a primeira letra que compus inteira e senti que estava pronta para lançar”, diz o músico.       

Na ausência dos shows, Cruvinel investiu em anúncios no Facebook e Instagram para impulsionar o single nas mídias digitais e conseguiu mais de 64 mil plays no Spotify.  “A gente não esperava essa proporção pelo fato de eu ser um artista novo e estar lançando meu primeiro single. 

Ele espera obter em breve uma remuneração da plataforma. “Essa quantia vai ajudar a pagar o investimento da gravação, então a gente não vai sair no prejuízo. Mas é um valor que também vai colaborar bastante na produção de um clipe ou em outra música”, explica.  

Segundo o cantor, as ferramentas de publicidade das redes sociais servem mais na “filtragem” do conteúdo. Ele atribui à sua base de seguidores (5.097 no Instagram) a repercussão positiva do single. “Contratamos um gestor de tráfico para cuidar dessa parte, mas é muito dinheiro envolvido, não dá para atingir muitas pessoas que a gente não conhece. Então o melhor que tem é o engajamento orgânico da galera que já me conhece e curte meu trabalho. Isso que me ajudou muito.” 

Agora ele prepara o lançamento de seu segundo single, Esse assunto, com produção de Rick Bonadio. Cruvinel também retomou os ensaios com a banda Noema, dedicada à MPB, que ele divide com Luiz Fernando (guitarra), Gui Fausto (baixo) e Léo Martins (bateria). O grupo gravou seu primeiro single na pandemia e prevê lançá-lo no fim do ano ou no início de 2021. 

Lucas Brito/Divulgação
(foto: Lucas Brito/Divulgação)


AMADURECIMENTO

A estudante de publicidade da UFMG Laís Skackauskas - com o nome artístico Lis - de 21 anos, também investiu no lançamento de sua carreira solo durante a pandemia. Ela canta desde 2013 e mais recentemente se apresentou em festivais como o de Jazz de Tiradentes e o Festival de Jazz da Savassi.  

“Foi um tempo positivo que a gente ganhou. Ganhamos tempo para errar, essa é a palavra. Particularmente, foi uma fase também para amadurecer como artista”, afirma. Lis aproveitou o tempo livre sem aulas no primeiro semestre para comprar um teclado e investir nos estudos musicais. 

Ela compôs seu primeiro single, Outono, e lançou-o na última sexta-feira (30). “A música fala sobre os sentimentos despertados neste momento. É uma reflexão sobre esse cenário traduzida em forma de música”, diz.

O single começa com um áudio que a artista enviou na semana em que compôs Outono e no qual dizia: “O que me ajudou nesses dias foi pegar o violão e cantar, só”. Lis escreveu a letra e formou a base melódica da canção sozinha, em agosto. Ela contou com a colaboração de Arthur Melo na produção da faixa, a distância. 

“O Arthur não pode ir ao estúdio, porque ele mora com pessoas do grupo de risco. A gente teve que resolver a música remotamente. Foi um ponto que pegou, mas acabamos conseguindo responder superbem.”

Em setembro, a cantora gravou o videoclipe. “Tivemos que tomar 1 milhão de cuidados. Tinha que ser uma equipe mais enxuta mesmo e tudo era pensado com antecedência para evitar problemas relacionados ao coronavírus”, comenta. 

Antes do lançamento, ela adequou suas expectativas. “Estou em casa, então não vou conseguir ver ninguém reagindo. Tenho expectativa de receber mensagens, ligações de amigos e ter essa resposta nas redes sociais. Esse vai ser meu termômetro para saber se a recepção foi legal”, afirma.

Alternativa para outros artistas, as lives de lançamento são um empecilho para quem está começando agora e ainda não conta com um grande repertório ou base de fãs significativa. Lis e seu produtor, Luiz Brazil, preferiram investir em mídia patrocinada nas redes sociais, retirando o valor do próprio bolso. 

“Esperamos um retorno positivo, mas recompensa financeira a gente não espera tão cedo. Já investimos sabendo disso”, diz ela. Além da questão financeira, a cantora cita como maior desafio da empreitada nesse cenário atípico o contexto do distanciamento. 

“Temos que resolver muitas questões dentro de casa. Não dá pra ficar encontrando e fazendo um networking. Não há um evento com alguém da cena musical para a gente entrar em contato, trocar ideia e se promover. Acaba que precisamos conhecer essas pessoas pelo Instagram mesmo.”

*Estagiário sob a supervisão da editora Silvana Arantes

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