Em janeiro passado, às vésperas de apresentar a 62ª edição do Grammy Awards, Alicia Keys anunciou o lançamento de seu sétimo álbum de estúdio. Previsto inicialmente para o dia 20 de março, ALICIA (RCA Records) foi adiado primeiramente em razão da pandemia do novo coronavírus e, posteriormente, em virtude das manifestações do Black Lives Matter, movimento do qual a cantora é uma apoiadora obstinada. Com seis meses de “atraso”, o disco chegou às plataformas no último dia 18.
Nesse meio tempo, Alicia aproveitou para divulgá-lo. Das 15 faixas que compõem o disco, sete viraram single: Show me love (com Miguel), Time machine, Underdog, Good job, Perfect way to die, So done (com Khalid) e Love looks better.
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Entre as já citadas, somam-se artistas como o músico inglês Sampha, autor do elogiado disco de estreia Process (2017). Parceiro de músicos como Drake e Kanye West, ele aparece na ótima 3 hour drive. Já a rapper estadunidense Tierra Whack, outro nome para se ficar de olho, exibe seu afiado flow em Me x 7. Ela estreou em 2018 com o disco Whack world, composto por 15 músicas que não passam de 1 minuto de duração cada uma.
ALICIA também conta com a presença do músico africano Diamond Platnumz em Wasted energy, de levada reggae; da sueca Snoh Aalegra, em You save me; e da estadunidense Jill Scott, na música que leva o nome da convidada.
Mas Alicia Keys também brilha sozinha. Truth without love, responsável por abrir o trabalho, traz a cantora renovando sua própria marca: voz e piano. Já Authors of forever, talvez a música mais pop do disco, mostra a cantora com total poder de sua voz. Em Gramercy park ela experimenta uma pegada folk especialmente melancólica e nostálgica.
Nesse conjunto afinado de referências e sonoridades, Alicia Keys dá continuidade a algo que ela iniciou no disco HERE (2016), demonstrando uma abordagem mais conceitual e atenta às novas tendências da música, como comprovam a lista de convidados e a sonoridade das faixas. No novo trabalho, ela dá um passo a mais e se desfaz da obrigação de lançar músicas dançantes, estacionando o álbum numa serenidade sincera para falar de amor em tempos tão obscuros.
Ao divulgar o disco, a cantora e compositora escreveu que ele ''tem tudo o que eu curto em termos de música e arte neste momento da minha vida''. Na mesma nota, explicou que deu ao trabalho o nome ALICIA porque ele ''traz tudo o que eu sou e já senti gravando em estúdio. Durante o processo de criação, me senti confortável com todas as minhas facetas. Espero que todos que ouvirem o álbum consigam senti-lo como a versão mais verdadeira de si mesmos''.
Esse discurso vai ao encontro ao que ela revelou em sua autobiografia, More myself - A journey, lançada em março passado. No livro, a artista relata seus difíceis anos de juventude em Hell's Kitchen, bairro de Nova York. Naquela época, ela morava num apartamento de um quarto com sua mãe, solteira.
''Havia cafetões e prostitutas por toda parte. Havia aqueles cinemas com filmes pornográficos em todos os lugares. Por isso aprendi cedo como chamar o mínimo de atenção possível para mim'', conta, no livro. Ela vestia roupas masculinas, evitava cores brilhantes e carregava uma faca para se defender.
Mais tarde, quando precisou lidar com sua própria sobrevivência na indústria da música, essas habilidades de autopreservação aprendidas nas ruas se fizeram necessárias. Por anos, Alicia manteve um controle frio de seu som, imagem e vida privada.
Em entrevista ao jornal britânico The Independent, ela afirma que atualmente tem lutado para manter sua dignidade como ''uma mulher negra que fala e canta regularmente sobre questões de igualdade racial e de gênero''.
Todo o esforço tem valido a pena. Vencedora de 15 Grammy's, Alicia Keys deve adicionar mais alguns em sua prateleira na próxima edição do prêmio. E, para o futuro, bem, um álbum homônimo é sempre bem-vindo na discografia de cantoras já consolidadas - vide o já clássico BEYONCÉ (2015). Com Alicia Keys, as coisas não devem ser muito diferentes daqui em diante.
ALICIA
Alicia Keys
RCA Records
Disponível nas plataformas digitais