Seis meses já se passaram desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a pandemia do novo coronavírus. De lá para cá, alguns hábitos mudaram, tendências vieram e não ficaram, muita gente teve que reinventar a própria rotina para se adequar ao dia a dia em casa. Na tentativa de compreender esse período, a cantora e compositora Marina Melo lançou mão da música para expor suas conclusões no recém-lançado EP O mundo acabou mas continua girando.
A artista paulistana revela um olhar particular para o agora e sintetiza a ideia de que o chamado “novo normal” não se estabeleceu como esperado. “A pandemia trouxe muitas transformações mundiais e pessoais, desde os cuidados de higiene com que não estávamos acostumados até mudanças físicas mesmo. Eu, por exemplo, me vi obrigada a mudar de casa. Mas agora tudo deu uma estabilizada. O primeiro semestre foi um limbo e agora vejo as pessoas entrando na correria da vida de antes”, analisa.
LOOPING
Foi nesse lugar indefinido que Marina escreveu as três músicas de seu novo trabalho, produzido por Naná Rizinni – sucessor dos álbuns Estamos aqui (2019) e Soft apocalipse (2016). Na primeira, que dá nome ao projeto, a cantora repete a frase-título em looping. À medida que o melancólico arranjo cresce, a letra vai se desconstruindo.
Cara vizinha, (assim mesmo, com a pausa da vírgula sustentada no título) abre com a gravação caseira da artista anunciando uma homenagem. Lúdica e divertida, a canção foi a forma que Marina encontrou de agradecer a uma pessoa, então desconhecida, que morava no prédio ao lado de sua casa e, todas as noites, escolhia uma canção para tocar alto e bom som para a vizinhança.
“Essa história é totalmente verídica. Eu morava numa vila que ao lado tinha um prédio. Diariamente, alguém colocava músicas e, com o tempo, se tornou o momento mais esperado do meu dia. A gente ficava lá dançando, com as lanternas dos celulares acesas. Para homenageá-la, fiz essa serenata, meu jeito de agradecer algo que fez muita diferença pra mim e pra todos os meus vizinhos”, conta.
Segura firme na live da tt completa a tríade. A música, cujo título se refere às transmissões ao vivo da cantora Teresa Cristina, traz uma mensagem sobre não deixar a tristeza e o desânimo tomarem conta. “Tinha o sonho de um país/ Algo passou e tanta gente eu vi sumir/ Tinha fevereiro, março, abril/ Algo passou e o calendário espatifou”, diz a letra.
“Essa música fala sobre o novo mundo que encontrei depois que o antigo 'acabou'. São questões simples, que cabem na vida de muita gente. Eu tinha certezas pessoais, uma casa linda, uma agenda – e tudo isso acabou. Mas também é uma letra que busca pontos de apoio, como as lives da Teresa Cristina”, explica.
DESIGUALDADE
Questionada se o “pós-fim do mundo” é um lugar melhor, Marina Melo se mostra pessimista. “A gente vive num mundo muito perverso. De fato, tivemos a oportunidade de olhar para o que é importante, mas as desigualdades estão piores, a doença continua matando e existe a chance de piorarmos muito.”
Ainda assim, ela sente a necessidade de enviar ao mundo uma mensagem positiva. “Enquanto artista, tenho a possibilidade de gerar sensações nas pessoas, propor sentimentos e conduzir viagens. Eu tinha uma música pronta, chamada Sorriso verde e amarelo, que falava justamente das mazelas que o Brasil vem vivendo, principalmente no campo da política. Mas descobri que chover nesse pântano não é uma boa saída. Escolhi habitar um lugar mais solar e esperançoso – e a resposta que venho recebendo do público é de que a mensagem chegou. Este trabalho é um afago”, conclui.
O MUNDO ACABOU MAS CONTINUA GIRANDO
EP de Marina Melo
Três faixas
Disponível nas plataformas digitais