Quem acompanha a rotina de turnês e gravações da Boogarins sabe que uma pausa, antes da pandemia, era bastante improvável. Com shows adiados no Brasil e no exterior, a banda goiana experimenta, pela primeira vez desde a estreia com o disco As plantas que curam (2013), uma vida mais sedentária, sem a atribulada rotina na estrada.
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Isso não significa que os trabalhos estão completamente paralisados. Nesta sexta-feira (28), o grupo libera o primeiro volume de Manchaca (OAR), que reúne gravações não utilizadas nos dois últimos discos, Lá vem a morte (2017) e Sombrou dúvida (2019). Trata-se de “uma compilação de memórias, sonhos, demos e sobras da Boogarins de Austin, Texas”, conforme revela o subtítulo.
“Desde o Sombrou dúvida, a gente discute a existência e o lançamento desse material. No primeiro momento, a ideia era lançá-lo de forma mais exclusiva, para os fãs que quisessem fazer o download no nosso site. Na pandemia, a gente acabou ressignificando o que poderia ser esse lançamento, para nós e para os fãs. Acabou que é uma maneira de manter a banda produtiva e não deixar que a distância do palco diminua a conexão com os fãs”, conta Benke. Dinho Almeida, Raphael Vaz e Ynaiã Benthroldo são os outros integrantes do grupo.
Manchaca (palavra do idioma nativo da América do Norte que significa “atrás de”) é o nome da rua onde ficava a casa alugada pela banda em Austin, capital do Texas (EUA). Foi no festival mais famoso dessa cidade, o South by Southwest (SxSW), que ela foi revelada para público e crítica americanos em 2014, antes mesmo de ser conhecida no Brasil.
Com 13 faixas, o primeiro volume reúne músicas que remetem às gravações realizadas no contexto dessa casa, além dos singles Inocência e Tanta coragem, liberados anteriormente no compacto Fefel 2020. O trabalho conta com faixas nunca antes divulgadas – Aquele som, Noite bright e LVCO 2, além de demos e versões ao vivo.
“Nosso processo de composição parte muito de voz e violão, mas a gente também gosta de fazer coisas superproduzidas, do mesmo jeito que nos identificamos com o que é orgânico e primitivo”, comenta Benke. “Boogarins é muito sobre ir de acordo com o que a música está pedindo. A gente faz isso nos shows e não é diferente quando estamos compondo. É claro que chega um momento da gravação em que é preciso arranjar a música de determinada maneira e fechá-la. Mas até chegar lá, a gente gosta de ir sentindo.”
A faixa instrumental Are you crazy, Julian? expõe uma das habituais sessões de improvisos da banda. Em outros momentos, o disco revela a faceta inventiva do grupo e sua influência sobre a música brasileira. Prova disso é Make sure your head is above, gravada pela cantora Céu em Apká! (2019), e João 3 filhos, faixa de Trança (2017), álbum de Ava Rocha.
“Ainda que a gente tenha a oportunidade estar em estúdio, temos o hábito de priorizar visões musicais bem intuitivas. Elas podem até soar esquisitas, ficam barulhentas, levam as pessoas para outros estados. É o que a gente vem fazendo desde o início, construindo paisagens sonoras e tentando encaixar isso no repertório da melhor maneira”, diz Benke.
No segundo volume, ainda sem previsão de lançamento, a banda pretende priorizar as sobras de estúdio de Sombrou dúvida, captando o momento de gravação do disco mais pop que ela já lançou – ainda que bastante psicodélico.
Distanciado por imposição da pandemia – Dinho e Raphael estão em São Paulo, Ynaiã mora no Rio de Janeiro e Benke, no Recife –, o quarteto mantém a rotina das chamadas de vídeo com fãs aos domingos, às 10h, seguindo a lógica das missas católicas.
“Esses encontros surgiram espontaneamente com a ideia de compartilhar as gravações, em áudio, de alguns shows que a gente fez. Fizemos uma vez, a galera gostou e sempre pede para fazermos de novo. É bom estar ali, manter a conexão e proporcionar um momento de escape para quem está em casa, confinado. É massa dar esse combustível para que as pessoas possam queimá-lo da maneira que quiserem”, conclui Benke Ferraz.
MANCHACA VOL.1
De Boogarins
OAR Records
Disponível nas plataformas digitais