Aproximadamente 1.500km separam Belo Horizonte e Salvador. Apesar da distância entre as duas capitais, os artistas João Carvalho e Ramon Gonçalves forjaram mais uma vez a “estrada natural” da Bahia a Minas para criar a obra audiovisual Vão.
Realizado durante a quarentena, o projeto que chega às plataformas digitais na próxima sexta-feira (17). Responsáveis respectivamente pelos projetos Sentidor e Aurata, os dois se conheceram há quatro anos, numa turnê organizada pelos coletivos independentes Geração Perdida e NHL Produções.
Depois de notarem grande afinidade criativa, eles desejaram produzir juntos, mas a ideia só saiu do papel em abril passado. “Virtualmente, começamos a trocar ideia sobre a solidão do isolamento, o desamparo e a sensação de vazio que esse momento nos proporciona”, explica o mineiro João.
“Ele cataloga e propõe-se a compor e remodelar paisagens e memórias numa espécie de espelho d’água que, em sua materialidade, permite que se deposite e preencha por referenciais subjetivas e outras resoluções, uma decodificação aberta, processual.”
saiba mais
Depois de notarem grande afinidade criativa, eles desejaram produzir juntos, mas a ideia só saiu do papel em abril passado. “Virtualmente, começamos a trocar ideia sobre a solidão do isolamento, o desamparo e a sensação de vazio que esse momento nos proporciona”, explica o mineiro João.
“Ele cataloga e propõe-se a compor e remodelar paisagens e memórias numa espécie de espelho d’água que, em sua materialidade, permite que se deposite e preencha por referenciais subjetivas e outras resoluções, uma decodificação aberta, processual.”
O soteropolitano Ramon defende que o projeto é o resultado de uma “necessidade de reelaborar as coisas”. “Tudo o que está acontecendo nos afeta emocionalmente. Estamos fadados ao vazio dessa situação por perceber o quanto algumas coisas nos fazem falta.”
Metáfora musical, o projeto se desdobra num curta-metragem e é o resultado de uma abstração sobre a pandemia. Com seis faixas longas - a menor possui 3min32s -, o disco é uma boa representação do que a música eletrônica experimental pode ser hoje: um trabalho expandido, criado para não trazer respostas fáceis, mas capaz de emocionar.
ETÉREO
“Todas elas têm uma sonoridade meio etérea, como se fossem pensamentos recortados e sobrepostos. Soam como meditativas, porque são o resultado de um processo interno. O Ramon, por exemplo, usou muito sons que são da casa dele, fazendo quase um mapeamento desses espaços. Na quarentena, somos convocados a reconhecer esses lugares da nossa própria casa com que provavelmente já tínhamos nos acostumado”, comenta João.
“Todas elas têm uma sonoridade meio etérea, como se fossem pensamentos recortados e sobrepostos. Soam como meditativas, porque são o resultado de um processo interno. O Ramon, por exemplo, usou muito sons que são da casa dele, fazendo quase um mapeamento desses espaços. Na quarentena, somos convocados a reconhecer esses lugares da nossa própria casa com que provavelmente já tínhamos nos acostumado”, comenta João.
Segundo ele, o título do projeto resume o estado em que as coisas estão atualmente. “Tanto nas músicas quanto na vida, estamos enfrentando esses momentos de silêncio. E tudo o que está ocorrendo tem um processo de quebra atribuído. É um momento muito difícil, estamos todos apertados e a capa nos mostra um pouco disso. Estamos tentando nos comunicar através do vazio, diante de uma necessidade de dizer o que não estávamos conseguindo.”
Lidos em ordem, os títulos das músicas formam o poema Brilho para adormecer/despindo de sonho/da brecha sem/sol interlocutor/oscila fraqueja/ama fica.
“Ele surgiu de uma forma muito espontânea”, conta Ramon. “Tenho tratado isso como um exercício sobre criar imagens. É mais uma pista para ajudar as pessoas a desvendarem o disco, mas sem dar respostas.”
O curta, que será lançado no YouTube no mesmo dia em que o disco, resulta da pesquisa multimídia realizada pelos artistas.
“Minha ideia foi propor imagens para as canções, criar uma visualidade para elas, que, no final, funcionam como um retrato sobre o que estamos vivendo na quarentena, ainda que não seja uma tradução literal. É a forma que encontramos que expressar o turbilhão de sentimentos que esse confinamento cria em nós”, explica Ramon.
Apesar de já estarem acostumados a trabalhar em casa, sozinhos, os dois acreditam que o isolamento físico imposto pela pandemia tende a resultar em trabalhos ainda mais introspectivos.
“De alguma forma, acho que o som que a gente fazia já era de quarentena”, afirma João. “Eu, pelo menos, sempre tive um processo criativo muito voltado para coisas não materiais. Agora, isso fica mais forte.”
“Atualmente, como não é recomendado o contato físico, acho que é um momento muito propício ao autoentendimento. Estamos em um processo de des-espera e também de entender como será o futuro, que a gente não sabe quando vai chegar”, reflete Ramon.
Vão
. João Carvalho e Ramon Gonçalves
. Álbum e clipe disponíveis nas plataformas digitais a partir de sexta (17)