É com um misto de alegria e frustração que Roberto Frejat, de 58 anos, lança Ao redor do precipício, seu quarto álbum solo de estúdio e primeiro de inéditas em 12 anos. Oficialmente fora do Barão Vermelho desde o início de 2017, ele sabe que o novo trabalho, com 13 faixas, dificilmente irá para a estrada este ano. Mas resolveu não esperar mais.
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Ritchie colabora nos vocais de algumas faixas. As canções criadas com Zeca Baleiro (Te amei ali) e Antônio Cícero (Tudo que eu consegui) se destacam pela metaleira de Serginho Trombone – a primeira com acento blues, a outra mais brasileira. Alice Caymmi emula uma dominatrix em A sua dor é minha (Frejat/George Israel/Mauro Santa Cecília).
Nenhuma das canções nasceu agora. Frejat foi buscá-las em seu baú. Nesse reencontro, também vieram três momentos instrumentais, que foram inseridos no início, meio e no final do álbum. Não é fácil, ele admite, manter-se tanto tempo na carreira – caminha para quatro décadas de trajetória.
Nesta entrevista, Frejat fala sobre a produção do álbum, sobre o futuro dos shows e a relação com os fãs. “Muitas vezes, sinto como o público é refratário à novidade.”
Para quem só vinha lançando singles, Ao redor do precipício é um discão. Foi mais difícil tomar a decisão de fazer um álbum do que efetivamente colocar a mão na massa?
Esse trabalho envolveu quase seis meses, já que houve intervalos nas gravações. Gravar é uma coisa meio louca, fico muito envolvido com o trabalho, o que dá uma desequilibrada com o mundo exterior. Sentimentalmente, gravar é um trabalho que gosto de fazer, construir arranjos, isso tudo me agrada. Agora, é complicado fazer por meios próprios, o custo é grande. Até que ponto isso tem um resultado? Estas eram as questões.
Mas, num determinado momento, falei: Tenho prazer, acho que é importante para mim, não pode ser importante só para a minha relação com o público. Um álbum funciona como um registro cronológico da sua cabeça, uma música é muito pouco para dar conta de tudo. Um single não é o melhor veículo para demarcar seu pensamento como artista.
Mas, num determinado momento, falei: Tenho prazer, acho que é importante para mim, não pode ser importante só para a minha relação com o público. Um álbum funciona como um registro cronológico da sua cabeça, uma música é muito pouco para dar conta de tudo. Um single não é o melhor veículo para demarcar seu pensamento como artista.
Para a produção você uniu diferentes parceiros de gerações e estilos diversos. Como foi o processo?
Apresentei todas as músicas aos produtores e fomos batendo bola sobre elas. O Kassin tem outro ponto de vista, vem de outra geração, tem informação enorme sobre música. Eu achava que tinha vários singles, que poderiam gerar um EP. Eles me falaram de um álbum. Então, beleza... Eles não se conheciam pessoalmente, o convívio diário foi muito agradável. Tive também vontade de trabalhar com pessoas com quem nunca tinha trabalhado, como o Arthur Verocai (maestro responsável pelos arranjos de cordas), a Alice Caymmi (que assumiu a voz em A sua dor é minha) e o Leonardo Reis (que assinou as percussões).
O pessoal do coro canta com a Iza. É uma garotada. Sempre fiz os vocais dos meus discos, mas com duas passadas eles já gravavam. Ou seja, transitei com vários artistas de lugares bem diferentes daqueles onde transito.
O pessoal do coro canta com a Iza. É uma garotada. Sempre fiz os vocais dos meus discos, mas com duas passadas eles já gravavam. Ou seja, transitei com vários artistas de lugares bem diferentes daqueles onde transito.
É difícil se adaptar às novidades do meio fonográfico, mesmo tendo passado tanto tempo convivendo com ele, mas vendo tudo mudar tão rapidamente?
Como tenho 38 anos de carreira, sei que tenho de soar como sou. Ao mesmo tempo, não dá para você ficar parado no tempo, fazendo o mesmo que já fez. Não queria fazer um disco para dizerem que é um Amor para recomeçar 2 (referência a seu primeiro álbum solo, de 2001). Tenho de ir para outro lugar, algo que me acrescente e estimule. Há um momento em que as pessoas estranham as coisas novas, elas soam estranhas a um público mais conservador.
Seu público não gosta de sair da zona de conforto?
O artista quer, mas o público não, está cada vez mais preguiçoso. A minha geração e a anterior à minha, nós construíamos uma carreira em cima do público que saía de casa para ver o que não conhecia, que queria o novo. Hoje, não. Ele sai de casa para conferir, mais uma vez, a música que adora. Tem todo o direito, mas quando você toca uma música nova e a pessoa vira para o lado e começa a conversar, ela está sendo deseducada, indelicada e até grosseira. Vejo vários artistas comentando que tocaram duas novas e nego quase pedindo pelo amor de Deus para ouvir o sucesso. Como a gente vai pra frente assim?
Como resolver a equação entre sucesso antigo e novidade?
O show de voz e violão, que só faço em teatro, cumpre esse papel. As pessoas estão ali completamente dentro do espetáculo. O foco está no show. Às vezes, até me falam que se só tivesse sucesso, seria um estouro. Qual o sentido? É muito importante ter o público prestando atenção a cada respirada que você dá. Não é só ficar cantando música de olho fechado, mais uma vez. Adoro tocar música de sucesso, não vejo o menor problema em tocar Bete Balanço, mas não posso viver só do que já fiz. Lógico que vou buscar uma coisa que vai funcionar para todo o mundo, mas muitas vezes sinto como o público é refratário à novidade.
Já que você esperou tanto tempo para lançar um álbum de inéditas, por que não aguardar mais um pouco e lançá-lo depois da pandemia?
Antes do isolamento social, estava com a estratégia pronta para lançar o disco. Até mexi, alterei as datas, mas deixar para o ano que vem seria muito tempo. Tem as plataformas digitais para ouvir, clipe, os lyric vídeos que estamos fazendo. A ideia é deixar o trabalho seguir. Na hora em que puder ir para a estrada, eu vou. No caso dos shows, a história só vai se normalizar quando houver vacina. Antes, é tudo muito relativo.
A gente já trabalha com margem muito apertada de lucro. Não se pode, de uma hora para outra, onde colocavam quatro pessoas ficar só uma. Não há a menor condição de bancar um espetáculo dessa forma. Você pode continuar criando isoladamente, fazendo lives. Agora, para o dia a dia da estrada, as perspectivas são bem ruins. Vamos torcer para um remédio, que possamos testar todo o mundo, para tentar levar uma vida um pouco mais normal.
A gente já trabalha com margem muito apertada de lucro. Não se pode, de uma hora para outra, onde colocavam quatro pessoas ficar só uma. Não há a menor condição de bancar um espetáculo dessa forma. Você pode continuar criando isoladamente, fazendo lives. Agora, para o dia a dia da estrada, as perspectivas são bem ruins. Vamos torcer para um remédio, que possamos testar todo o mundo, para tentar levar uma vida um pouco mais normal.
AO REDOR DO PRECIPÍCIO
. De Frejat
. 13 faixas
. Disponível nas plataformas digitais