Uma batida dançante e, ao mesmo tempo, arrastada, engatinhando e entrando sorrateiramente em direção ao ouvido. Assim a cantora e compositora paulista Lara Aufranc define a sua música. Depois de estrear, em 2017 com Passagem, ela lança agora Eu você um nó (YB Music).
A primeira canção, que dá nome ao disco, fala da relação com o outro. “Esse é o assunto que conduz este novo trabalho”, diz ela. E Lara faz questão de perguntar: “Como viver em grupo numa sociedade que supervaloriza o indivíduo? Num mundo que vemos refletido nas telas dos celulares, com pouca escuta e senso crítico, o que é imagem e o que é real? Como é o amor na contemporaneidade? O que significa ser mulher?”
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São essas as questões que permeiam Eu você um só. “Nunca parei de compor e as ideias vêm junto com a vida, no dia a dia”, diz ela. O projeto do disco venceu o edital de Apoio à Criação Musical da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo e conta com a direção artística de Rômulo Fróes.
O disco tem faixas assinadas em parceria com Meno Del Picchia, Tarso Jones, Clima, Allen Alencar e Romulo Fróes, além da participação da cantora Júlia Branco em Gritos na avenida, que fecha o CD.
“Este é o segundo disco que faço em carreira solo, com meu nome. Tinha feito um outro que era uma proposta mais de banda, numa pegada mais de blues e soul. Passagem foi uma transição para um negócio mais livre, quando percebi que minhas músicas não estavam mais se enquadrando na banda na qual eu tocava. Acho que Eu você um só é mais sombrio, talvez mais urbano. Passei minha vida toda em São Paulo e acho que isso acaba refletindo nessa coisa de um som mais 'sujo', meio sombrio.”
Além disso, há o próprio tema do disco, que esbarra na incomunicabilidade. “Acho que estamos num momento complicado, não só no Brasil, mas no mundo. Tudo está muito polarizado e estamos com dificuldades de ouvir, pois todo mundo quer falar, mas ninguém quer ouvir. As pessoas parecem estar meio doidas hoje. A internet está aí para podermos expressar um monte de coisas, mas a gente nunca escuta. Então fica essa comunicação cheia de ruídos. Acho que isto está em todas as relações, sejam amorosas, afetivas ou mesmo com a vizinha do condomínio.”
OUTRO
Ela afirma que seu disco “passa muito por isso – essa coisa de tentar se relacionar com o outro e de como isso fica, muitas vezes, desconexo, numa relação que não flui. Conversando, pode-se chegar a outros lugares, mas não é tão fácil assim. De repente, cada um acha que a sua opinião é que é a mais importante. Tem algumas músicas que são mais sobre amor passional e outras que falam da relação em sociedade, da relação com o outro, tendo qualquer outro. Mas estamos naquela de não conseguir.”
A cantora diz, no entanto, que Eu você um nó não é um disco pessimista. “Nas cidades grandes existe muito aquela ideia de não se preocupar com nada, cada um seguindo a sua vida, mas a internet trouxe essa sensação de vila, com as pessoas vigiando e querendo cuidar da vida das outras, observando o que o outro fala”.
Afirmar que este é um disco de rock não é fácil para ela. “Muitos dizem que sentem uma coisa meio Rita Lee em mim. Não sei se é por causa de minha performance no palco ou se pelo meu som, mas é uma coisa de que gosto. Tem também algo de David Bowie, que sempre foi uma influência forte, assim como a própria Rita Lee.”
Embora esteja sempre compondo, Lara conta que não tem exatamente um método para isso. “Há uma canção do outro disco que foi meio psicografada, pois veio inteira, pronta para mim. Mas depende realmente de cada canção. Tem umas que faço um pedaço e acabo vendo se tem algum parceiro para concluí-la. É muito legal fazer música com parceiros. Para fazer os arranjos ou composições a gente troca muito, a música-título mesmo foi meio assim. Fiz uma parte e estava legal, mas ainda não tinha ideia da outra e mandei para o Meno del Pichia, que concluiu.”
Eu você um nó
. Lara Aufranc
. YB Music (9 faixas)
. R$ 15
. Disponível nas plataformas digitais