Criado em 1971, o Festival Nacional da Canção (Fenac) chega – sem interrupções – à 49ª edição. Realizado no Sul de Minas, é considerado um dos maiores eventos do gênero no Brasil. “É muita luta”, resume Gleizer Naves, idealizador e coordenador do festival, ao comentar as dificuldades para desenvolver projetos desse porte num momento de incerteza quanto ao futuro da política cultural do país.
“Viabilizá-lo é realmente difícil. Trabalhamos intensamente o ano inteiro para isso. Sempre conseguimos. Contamos com as leis de incentivo estadual e federal, a nossa principal fonte de recursos. O Fenac ganhou credibilidade e qualidade. Por isso, as prefeituras querem participar do circuito e ajudar de alguma maneira”, orgulha-se.
Este ano, cerca de
2 mil canções foram enviadas à organização – 120 entraram na disputa.
A “maratona” começou em julho e será encerrada em
7 de setembro, em Boa Esperança, a tradicional sede da
finalíssima. Neste fim de semana, o convidado para se apresentar na etapa classificatória de Nepomuceno foi o cantor e compositor Renato Teixeira. Perdões, São Thomé Das Letras, Coqueiral, Barroso e Três Pontas já receberam o 49º Fenac.
Gleizer Naves trabalha com uma equipe de 20 pessoas para levar música às cidades do interior. “As prefeituras ajudam financeiramente na festa, no festival em si e também nos shows, que são bancados pelo município. Tudo é feito em praça pública, com entrada franca. Recebemos, em média, de cinco mil a seis mil pessoas”, conta ele. Este ano, a premiação soma R$ 230 mil.
“Não é nossa função revelar alguém, mas incentivar talentos.
Isso é o mais importante, pois descobrimos que muitos compositores não têm onde divulgar seu trabalho. O Fenac proporciona isso, além ser uma forma de incentivo. Nossa missão é incentivar artistas e encantar por meio da arte”, reforça Gleizer Naves.
Este ano, o Fenac lançou uma novidade: a modalidade on-line, permitindo a artistas que moram no exterior participar da disputa. Os shows são transmitidos pela internet. “Recebemos músicas da Ucrânia, Estados Unidos e Portugal. Na etapa de Três Pontas, os ucranianos classificados mandaram mensagem dizendo que estavam acompanhando tudo ao vivo, direto lá do país deles”, orgulha-se Gleizer.
Inicialmente, a ideia era usar a internet para contemplar músicos de estados distantes do Sul de Minas. “Durante esses anos todos, compositores que moram longe reclamavam de não poder participar. Alegavam que viajar para Minas era inviável, pois a nossa ajuda de custo, de apenas R$ 1 mil, não dava para cobrir os custos.
Agora, todos podem concorrer em pé de igualdade com as canções presenciais”, garante Gleizer. Deu tão certo que o Fenac foi “exportado”, comemora ele.
Homens e mulheres disputam em pé de igualdade o Troféu Lamartine Babo. “As inscrições são meio a meio”, informa o organizador do Fenac. “São Paulo, Minas e Rio de Janeiro centralizam a maior parte. Os paulistas preponderam, talvez porque o pessoal do Norte e Nordeste se muda para lá, onde as chances são maiores”, acredita.
Quanto aos gêneros musicais, há um pouco de tudo no Fenac: sertanejo, samba, MPB, blues e rock. “As letras também variam bastante. Falam de amor, romances, natureza e até de política”, diz Gleiser.
A brasileira Débora Watts, que mora nos Estados Unidos, concorre ao Troféu Lamartine Babo com Só pro meu baião. "O Fenac é importante para artistas como eu, que se lançam no mercado de forma independente”, diz ela.
A Banda Paradush, formada por artistas de Kiev, na Ucrânia, classificou No meio do mundo – cantada em português! – para as semifinais. Comandado por Marina Chabanova e Anatoly Shmargunov, o grupo divulga a música brasileira no Leste Europeu.
Guilherme Arantes vai fechar o Fenac, em 7 de setembro, em Boa Esperança. Metade das músicas classificadas será apresentada na quinta-feira (5) e a outra metade, na sexta (6).
Dali sairão as 10 finalistas. O júri é formado por músicos, letristas, artistas, maestros e jornalistas. Entre os jurados confirmados estão Kiko Ferreira, presidente da Rede Minas, o poeta Murilo Antunes, um dos destaques do Clube da Esquina, e o artista plástico Fernando Pacheco.
“Foi um divisor de águas”. Assim a cantora e compositora Thaylis Carneiro, que venceu a edição do ano passado do Fenac, define o festival. Nascida em Cataguases, ela mora em Leopoldina, na Zona da Mata mineira. A música Carmim lhe rendeu o Troféu Lamartine Babo. “Essa canção é uma mistura de MPB, blues e rock alternativo. Logo depois do festival, criamos a Carmim Banda, que hoje é meu trabalho principal, com a qual me apresento em vários lugares. Já gravamos a música e a lançaremos em breve nas plataformas digitais”, informa.
Thaylis gostou tanto da experiência que está de volta ao Fenac. Já classificou o blues Conta de lágrimas, parceria dela com Marcos Alves, compositor de Cataguases.
“Estou confiante, mas o nível é muito alto. A cada ano, é uma emoção diferente. Pra mim, o principal é o intercâmbio entre os artistas, além da celebração da música popular brasileira”, diz.
Valéria Pisauro, letrista de Campinas (SP), conseguiu uma proeza inédita neste Fenac: classificou seis canções na primeira fase. Ela vai disputar as semifinais com Qualquer estação, parceria com Túlio Lima, integrante da banda belo-horizontina Daparte.
“Participar do Fenac é um sonho, uma emoção. Em 2015, recebemos os prêmios de música mais comunicativa e de aclamação popular, com Coração estradeiro, parceria minha com Luiz Dillah. Em 2017, ganhamos o troféu de melhor intérprete com Dose certa, interpretada por Júnior Almeida, de São João da Boa Vista (SP). Estou muito confiante. Quem sabe não alcançaremos o primeiro lugar este ano?”, diz Valéria
A banda capixaba Cinco Nós participa do Fenac desde 2014. Chegou às semifinais deste ano com Consumantes, mistura de rock e funk americano. Nano Vianna, integrante do grupo, conta que o festival deu visibilidade a ele e aos companheiros.
Em 2016, os capixabas venceram o Fenac com Runas. “Em 2018, ganhamos o troféu de música mais comunicativa com Clipes e clichês. Adoro participar do Fenac, pois o público mineiro é muito educado e receptivo. As pessoas vão ali para ouvir as canções”, afirma Vianna.
Morador em Três Pontas, o instrumentista e preparador vocal Oswaldo Duarte é jurado do festival desde 2014. “Este ano, participei das etapas realizadas em Perdões, São Thomé das Letras, Coqueiral e Barroso. Pude notar que o nível está cada vez mais alto. Várias canções têm chance de ganhar”, garante.
Do Fenac à fama
Nomes conhecidos já participaram do Fenac. Em 1975, o compositor e violinista Marcus Viana – autor das trilhas sonoras da novela Pantanal e do filme Olga – foi o vencedor do festival com a canção Passarada. Em 1983, Tadeu Franco venceu com Nós dois, de Celso Adolfo, depois de ficar em segundo lugar, no ano anterior, com Vazantes. Filho de Tetê Espíndola, o cantor e compositor Dani Black, de 31 anos, apresentou-se no festival ainda garoto.
Em 1971, a primeira edição do Fenac foi realizada em Boa Esperança. Duas canções venceram naquele ano: Uma noite quase sonho (de Michel Pedro Filho, Otacílio Misael e banda, de Varginha) e Morrer de amor (de Santusa Naves, de Boa Esperança).
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