Erasmo Carlos: 'Ficar em casa vivendo só do passado não dá'

Aos 77 anos, o Tremendão chega a BH nesta sexta (10) com a turnê de Amor é isso, disco em que homenageia a mulher e no qual teve a participação de convidados como Marisa Monte e Samuel Rosa

por Ana Clara Brant 10/05/2019 08:00

 



No último ano, Erasmo Carlos foi homenageado pelo Grammy, o Oscar da música, se casou, fez um filme e lançou um disco em que mostra a sua melhor faceta: a de romântico. “A gente vai vivendo e as coisas vão aparecendo. Temos que movimentar a vida. O importante é sempre estar atuante e antenado com o que está acontecendo para ser lembrado. Ficar em casa vivendo só do passado não dá. A vida passa e por isso tem que sempre buscar novidades”, acredita.

Após três trabalhos majoritariamente dedicados ao rock’n’roll, Amor é isso, nome do novo álbum e da turnê que chega hoje a Belo Horizonte (os ingressos estão esgotados), tem o amor como mote e conceito, como o próprio título sugere. “A ideia foi abordar aquele amor infinitamente elástico, que abraça e encampa o amor pelos pais, pelos vizinhos, pelos irmãos, pelos amigos, pela pessoa amada e até pelos objetos. É um amorzão em que cabe tudo e não faz distinção”, explica.

Boa parte das 12 faixas surgiu a partir de versos que o Tremendão escreveu para a mulher, a pedagoga Fernanda Passos, de 28 anos. Ao longo de sete anos, foram 111 poemas dedicados a ela, que vão se transformar em breve em livro. “A maioria das músicas foi inspirada nessas poesias e, aí, resolvi musicar. Chamei várias pessoas bacanas para me ajudar nessa empreitada”, conta.

Parcerias

Entre os convidados estão artistas que já haviam trabalhado com Erasmo ou que eram próximos a ele,  como Marisa Monte, que assina com ele e Dadi Convite para nascer de novo; Adriana Calcanhotto, parceira em Seu sim, e Arnaldo Antunes, que comparece em Parece que foi hoje. “Marcelo Camelo também está no disco e compôs e canta Sol da Barra. É um cara que admiro demais. Eu o gravei antes mesmo de ele ficar conhecido”, comenta.

O álbum, o 31º da carreira, traz também um parceiro das antigas, Tim Maia. New love (Novo love), composição gravada e escrita em inglês pelo Síndico nos anos 1960, época em que foi morar nos Estados Unidos, ganhou nova roupagem e versos em português de Erasmo Carlos. A faixa é uma das mais bonitas do disco. “É uma música especial para mim. Tim a fez quando era adolescente e me mandou para eu ouvir. Eu nunca me esqueci e sempre tive a ideia de gravá-la”, revela.

Em Amor é isso também há espaço para novidades como as participações de Samuel Rosa, parceiro em Novo sentido, e Emicida, que canta e compôs junto com o ídolo da Jovem Guarda Termos e condições. “Foi muito bacana poder contar com os dois. No caso do Emicida, eu já tinha feito uma música com ele para a Gal Costa (Abre-alas de verão), que entrou no último disco dela (A pele do futuro). Achei que a canção que fizemos agora ficou muito legal, com uma fala contemporânea”, comenta.

Apesar de ter ficado marcado durante um bom tempo como roqueiro, o lado romântico nunca foi deixado de lado. O cantor e compositor que completa 78 anos em junho acredita que, precisamente por falar de afeto e amor, sua obra sempre foi atual. “O amor nunca sai de moda. E ele parece o mesmo, mas não é. A cada dia muda, é diferente.” No entanto, mesmo com todo esse discurso amoroso, o Tremendão acredita que não é fácil tratar dessa temática. “Por incrível que pareça, amor é um sentimento fácil de explicar com gestos, mas muito difícil com as palavras. E quem for ao meu show vai entender sobre isso nos vídeos que apresentaremos no palco. Não posso adiantar muito, senão estraga a surpresa”, avisa.

Daryan Dornelles/Divulgação
(foto: Daryan Dornelles/Divulgação)

O repertório do show traz não só canções do novo álbum, mas também sucessos da Jovem Guarda e de outras fases do artista da Tijuca. “Não dá para fazer um show e deixar de lado Sentado à beira do caminho e Mulher, por exemplo. O público até cobra”, afirma.

O cinema não é novidade no currículo de Erasmo Carlos. Nos anos 1970, ele participou, ao lado dos companheiros de Jovem Guarda Roberto Carlos e Wanderléa, de produções como Roberto Carlos e o diamante cor-de-rosa e Roberto Carlos a 300 quilômetros por hora, de Roberto Farias (1932-2018). Mas foi Os machões, de 1972, dirigido por Reginaldo Faria, que comprovou que o Gigante Gentil, além de cantar, compor e tocar, sabia também atuar. “Ganhei o Coruja de Ouro, prêmio máximo do cinema na época, pelo meu desempenho. Adorei fazer o filme. Era uma comédia e tinha gente de peso, como o próprio Reginaldo, o Flávio Migliaccio”, recorda.

A faceta de ator se fez presente novamente, quando ele foi convidado para participar de Paraíso perdido, longa de Monique Gardenberg (O paí, ó e Benjamim), que estreou no ano passado e contou com outros cantores no elenco, como Jaloo e Seu Jorge. Na história, Erasmo interpreta José, gerente de um clube noturno que se chama Paraíso Perdido. O cantor diz que adorou mais uma experiência cinematográfica, principalmente o fato de trabalhar com Gardenberg. “É uma diretora formidável, que te passa confiança. E agora o filme está na Netflix. Mais pessoas, até de outros países, poderão assisti-lo. Gostei demais de fazer.”

Foi na telona também que o artista carioca viu a sua vida literalmente passar diante dos olhos. O filme Minha fama de mau, lançado em fevereiro passado, é baseado no livro homônimo de memórias escrito pelo cantor e compositor e traz um recorte de sua história: o começo da carreira, a parceria e a amizade com o Rei e o sucesso da Jovem Guarda. Eramos Carlos afirma que assistir ao longa, que tem direção de Lui Farias, filho de Roberto Farias, foi impactante.

“É forte e ao mesmo tempo curioso ver a sua história, as suas vivências sendo representadas por outras pessoas. Eu me emocionei e achei a atuação não só do Chay Suede (que interpreta Erasmo), como a do Gabriel Leone (Roberto Carlos) e da Malu Rodrigues (Wanderléa) muito boas”, diz. Erasmo assegura que não deu palpites em nada e que só viu o filme quando ele ficou pronto. Os músicos que integram a sua banda participam de Minha fama de mau. “Eles fizeram uma farra, porque colocaram aqueles trajes, o figurino dos anos 1960. Tiveram que remoçar” (risos).

Outro motivo de comemoração foi o fato de ter sido laureado com o Prêmio de Excelência Musical no 19º Grammy Latino. A cerimônia ocorreu em dezembro passado, em Las Vegas. “Com um prêmio como esse a gente sempre fica lisonjeado. Essa homenagem me fez sentir um orgulho muito grande.”

A apresentação em BH será na antevéspera do Dia das Mães. Erasmo Carlos teve na figura de dona Diva, interpretada em sua cinebiografia por Isabela Garcia, a figura mais importante de sua vida. Ela o criou sozinha e morreu em 2004, aos 83 anos. “Eu sou um cara que sou todo amor por conta da minha mãe. É o maior tesouro que ela me deu. Não admito nada de má-fé, de inveja, coisas ruins. Tenho nojo de tudo isso. Foi ela que me passou esses valores e eu nunca os perdi. Por isso continuo cantando e me guiando pelo amor”, salienta.

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