Décadas depois da voz de Kurt Cobain ser ouvida pela primeira vez nas ondas do rádio, o líder do Nirvana continua encantando pessoas que não eram nascidas quando ele morreu. Vinte e cinco anos após o suicídio do símbolo da contracultura da década de 1990, seu ex-empresário Danny Goldberg afirma que finalmente está pronto para refletir publicamente sobre o legado do artista.
No livro Serving the servant: Remembering Kurt Cobain, lançado na sexta-feira (5) para marcar o aniversário da morte, aos 27 anos, do cantor nascido em Seattle – Goldberg recorda um Cobain que estava à frente de sua época e como sua genialidade e humanidade brilharam através de sua personalidade melancólica e sombria. “Sua imagem na imprensa ficou um pouco distorcida e se concentrou de maneira desproporcional em sua morte, não tanto em sua vida e sua arte”, opina Goldberg. “Foi um cantor incrivelmente comovente, sua voz transmitia uma vulnerabilidade e uma intimidade raras”, completa.
Goldberg considera que Cobain “sintonizou com algo que ajudava as pessoas a sentir que eram menos ‘estranhas’, menos sozinhas”. Justamente por isso sua obra continua sendo relevante, inclusive para adolescentes que vivem em um mundo diferente da angustiante costa noroeste do Pacífico onde nasceu Cobain. “Integra um grupo de artistas com uma arte que transcende seu tempo”, explica o empresário.
O depressivo, mas singular artista que cresceu em uma região a duas horas da cidade de Seattle se tornou um “deus” do rock subitamente quando Nevermind, o segundo dos três álbuns de estúdio do Nirvana, catapultou a banda de rock alternativo a uma fama estratosférica e iniciou o culto a Kurt.
Nos três anos e meio que trabalhou com Cobain, Goldberg foi testemunha do salto do Nirvana à fama, da selvagem, mas carinhosa relação do artista com a cantora Courtney Love, assim como das tentativas de intervenção para que abandonasse o vício em heroína. “Não tenho ideia do que provocou as últimas semanas de desespero de Kurt”, escreve Goldberg no livro. “Talvez tenha sido uma intensa cristalização das depressões que o atormentavam por muito tempo”. “É melhor queimar do que desaparecer”, escreveu Cobain em uma carta encontrada ao lado de seu corpo, uma citação a uma música de Neil Young.
GÊNIO Mas o ex-empresário do Nirvana, que Cobain considerava um segundo pai, enfatiza que por trás do consumo de drogas e da depressão havia “um gênio musical”. Também era um “bobo” romântico, lembra Goldberg. O cabelo loiro e desgrenhado de Cobain, os olhos claros e o famoso casaco marrom esfarrapado davam um ar preguiçoso ao artista, mas Goldberg assegura que isto escondia um “intelecto altamente sofisticado”.
O empresário ainda dá crédito a Cobain pela defesa das mulheres e por ajudar a “redefinir a masculinidade” no mundo da música. “Podia ser muito poderosos e convincente e, ao mesmo tempo, sensível e carinhoso. Isto quebrava a ortodoxia do rock da época”, opina Goldberg, que recorda um show na Argentina no qual Cobain ficou enfurecido com as vaias à banda de abertura Calamity Jane, formada apenas por mulheres. A vingança do líder do Nirvana foi não tocar o hit Smells like teen spirit. “O público não merecia”, disse o cantor à época. “Ele estava comprometido com um ideal feminino e o respeito por todos, uma espécie de ethos antimachista”, recorda Goldberg, que também destaca o compromisso de Cobain com a defesa dos direitos dos homossexuais. (AFP)