Ressaca, luto, mal-estar. Mal dos trópicos (Queda e ascensão de Orfeu da Conceição), quarto álbum do cantor e compositor paulistano Thiago Pethit, de 32 anos, é, como boa parte da produção artística dos últimos anos, um reflexo do conturbado Brasil desta década.
Mas Pethit, há cinco anos sem um novo álbum (o mais recente era Rock’n’roll sugar darling, de 2014), volta à cena em cima do salto, por assim dizer. Um dos melhores autores da cena indie de São Paulo que emergiram neste início de século, Pethit já passeou pelo folk e rock.
Aqui, ele ambiciona algo mais. Mistura a versão do mito grego criada por Vinicius de Moraes com Zé Celso Martinez Corrêa com Villa-Lobos. Jazz, orquestra, samba, trip-hop. “Quando entendi que estava falando de um tempo mais épico, ou mais trágico, vi que a sonoridade do disco teria que refletir isso. Estamos em um Brasil à beira da destruição. Queria temas grandiosos que conseguissem refletir o quão complexo é viver agora”, conta.
Mal dos trópicos foi concebido por Pethit e o produtor Diogo Strausz, também responsável pelos arranjos.
“Na época, a Alemanha era libertária, com ideias de sexualidade muito abertas. Na segunda parte do livro, o autor volta para lá em 1938. Os amigos da primeira fase que sobraram tinham entrado para o exército hitlerista. O desfecho é meio trágico”, diz Pethit. Um dos personagens reais de O templo é o fotógrafo alemão Herbert List. “Muitas das fotos dele têm uma ideia gay quase mitológica.
CASAMENTO ESTRANHO Com os conceitos na cabeça, Pethit partiu para a sonoridade. “Vi que o trabalho demandaria bastante tempo, exercício, estudo, até porque algumas ideias pareciam estranhas de serem casadas. Como você junta Villa-Lobos, que vem de um Brasil erudito, com uma sonoridade mais urbana?” O álbum reúne nove faixas, sendo que a última é a versão instrumental da faixa-título.
Para contar a trajetória desse personagem épico, que, ao contrário do mito original, vai do inferno ao céu, Pethit colocou seu Orfeu como um homem urbano que se apaixona na noite da São Paulo atual – dos bares da Consolação ao tecno da Praça da República.
Mal dos trópicos começa com Abre-alas, uma introdução orquestral em que Pethit repete os versos “Volto em luto e choro em pleno carnaval”. À exceção da balada Orfeu, todas as outras têm instrumentação eloquente, graças à participação do Quarteto da Cidade de São Paulo e de um sexteto de sopros. Noite vazia, o primeiro single, mistura uma batida eletrônica com violinos e violoncelos; Rio é uma bossa triste, iniciada com metais e que tem sequência ao som de um violão. Já Nature boy, única faixa do trabalho que não é de autoria de Pethit, é uma versão do standard jazzístico de Eden Abhez composto no final dos anos 1940. Aqui, o destaque vai para o trabalho vocal a capella, em participação do grupo Seis Canta.
Sem pressa, Pethit só deverá levar seu Orfeu tropical para os palcos a partir de junho.
Mal dos trópicos (A queda e ascensão de Orfeu da Conceição)
• Thiago Pethit
• Independente
• Disponível nas plataformas digitais.