BH faz parte da história do polêmico Planet Hemp

Livro de Pedro de Luna sobre os 25 anos da banda relembra fatos marcantes ocorridos na capital. Músicos foram perseguidos por defender a legalização da maconha

por Pedro Galvão 09/02/2019 07:26
Dani Dacorso/Divulgação
A primeira formação do grupo carioca, perseguido por defender a legalização da maconha: BNegão (C), Marcelo D2 (E), Rafael Crespo, Skunk e Formigão (D) (foto: Dani Dacorso/Divulgação)

“Adivinha, doutor, quem tá de volta na praça? Planet Hemp! Ex-quadrilha da fumaça.” O verso da segunda faixa do álbum A invasão do sagaz homem fumaça (2000) rima com vários momentos de uma das bandas mais emblemáticas e polêmicas do rock brasileiro, cuja trajetória é marcada por idas e vindas. A história do Planet Hemp, cuja gênese chegou recentemente ao cinema como ficção, volta à praça, mas desta vez sob a narrativa documental, na biografia escrita pelo jornalista Pedro de Luna. Neste sábado (9), ele participará de duas sessões de autógrafos em BH, com direito a show.

Autor de outras publicações sobre o tema, como Niterói rock underground 1990-2010, Pedro teve acesso a vasto material sobre o grupo criado por Marcelo D2, Skunk, BNegão, Rafael Crespo, Bacalhau e Formigão. Ao perceber que a força da banda pedia uma biografia exclusiva, nasceu Planet Hemp: mantenha o respeito, lançado em dezembro pela editora Belas Letras.

Em 496 páginas, o livro mostra como tudo começou, as influências musicais de seus integrantes, como eles se conectaram e toda a caminhada até a banda se tornar referência pela mistura do punk rock com hip-hop, pela contestação social e a militância declarada em defesa da legalização da maconha.

“Foi uma feliz - ou infeliz - coincidência o livro ter saído agora, neste contexto de conservadorismo, repressão e ascensão da extrema-direita. Parece distante, mas a gente sabe que há 25 anos havia um cenário em que o Planet Hemp era uma banda muito perseguida. Até os fãs eram perseguidos”, diz Pedro. “Havia coisas absurdas, como ser abordado pela polícia e ter de tirar a camisa da banda para não ir preso. Isso mostra o quanto o discurso deles ainda é atual, sempre expondo as mazelas da sociedade e os preconceitos de gênero, raça e classe econômica”, afirma Pedro de Luna.

BH

O complicado contexto dos primórdios da banda está presente em vários fatos resgatados pelo biógrafo. Um deles se passou em Belo Horizonte. Em 1997, o grupo veio à capital mineira fazer show na Estação 767, que acabou cancelado. Durante a madrugada, no Studio Bar, músicos e a equipe foram abordados por policiais. Todos acabaram na delegacia, sob acusação de “apologia às drogas”. Pedro de Luna conta que, na época, o caso não repercutiu muito na mídia, porque sete pessoas morreram em um show do Raimundos, em Santos, na mesma noite.

“Esse é um dos episódios que eu mesmo não conhecia antes de começar a escrever o livro. Consegui ouvir várias versões deste fato. Técnico de som, músicos e outras pessoas narram a história. Cada um estava num canto da balada e viu de um jeito. O pessoal ficou uma noite detido em BH, no Bairro da Lagoinha, e caiu na estrada no dia seguinte, rumo a Brasília, onde a banda acabou presa de verdade”, conta Luna. Desta vez, sob os holofotes da mídia. Outro fato histórico do Planet em BH: o primeiro show do grupo depois da morte do vocalista Skunk, em 1994, ocorreu na Praça da Estação.

ENERGIA

Marcos Hermes/Divulgação
BNegão e Marcelo D2 na gravação do disco MTV ao vivo, em 2001 (foto: Marcos Hermes/Divulgação)

Com muitas histórias - parte delas bem controversas -, o autor fez questão de incluir a linha do tempo nas últimas páginas, registrando os acontecimentos mais importantes ao longo de 25 anos de trajetória. Há vasto acervo de imagens, como fotos e cartazes.

“Esse trabalho consumiu dois anos de trabalho e energia. Como tudo é dos anos 1990, muita coisa não está na internet. Pesquisei arquivos de amigos, parentes e fãs, além de várias entrevistas. Tem gente que tocou no Planet Hemp e ninguém sabe. É o caso do Seu Jorge, percussionista do terceiro disco”, revela o escritor, referindo-se ao álbum A invasão do sagaz homem fumaça. No embalo da efeméride dos 25 anos da banda, celebrados em 2018, o filme Legalize já - A amizade nunca morre, estreou em outubro. No entanto, Pedro de Luna reforça que sua biografia e a trama dirigida por Gustavo Bonafé e Johnny Araújo, estrelada por Renato Goés (Marcelo D2) e Ícaro Silva (Skunk), têm abordagens totalmente distintas.

“O filme é centrado na amizade do D2 com o Skunk. Como é cinema, isso é romantizado. No filme, o primeiro encontro deles é fugindo da polícia, uma cena tensa. Na realidade, não foi assim. Foi mais tranquilo, uma coisa normal, no metrô. Fiz questão de contextualizar a cena musical daquele tempo. É importante entender essa cena para compreender o Planet Hemp”, destaca.

“Não tinha boates tocando rock e hip-hop no Rio, era outra atmosfera”, observa. “A galera que veio a criar o Planet Hemp frequentava o Point Punk. Foi ali que eles conheceram DJs e tiveram contato com o punk e outras ideias musicais. O filme não mostra isso”, diz Pedro.

Belas Letras/Divulgação
(foto: Belas Letras/Divulgação )
PLANET HEMP: MANTENHA O RESPEITO
• De Pedro de Luna
• Belas Letras
• 496 páginas
• R$ 70
• Sessão de autógrafos neste sábado (9), das 11h às 14h. Livraria Quixote. Rua Fernandes Tourinho 274, Savassi. Informações: (31) 3227-3077.
• Sessão de autógrafos e shows neste sábado (9), a partir das 21h, n’A Obra Bar Dançante. Rua Rio Grande do Norte, 1.168, Savassi.
Vão se apresentar os rappers Roger Deff e Matéria Prima. Ingressos: R$ 20 (até 22h30) e R$ 30. Informações: (31) 3215-8077.

SKUNK

O vocalista Skunk, antes de conhecer o rap, transitou por vários estilos de rock, até mesmo pelo rockabilly. As mudanças eram tantas que, segundo o biógrafo, o apelido dele não era alusão à droga. Certa vez, o fundador do Planet raspou a cabeça, abrindo mão do corte moicano, típico dos punks. Para se adequar ao novo emprego, ficou careca, como os skinheads. Aí surgiu a brincadeira: “Um dia skin, um dia punk, Skunk”. “Ele era um cara fantástico. O livro mostra isso de uma forma melhor do que o filme”, garante Luna.

Criativo, inteligente e antenado, Skunk foi amigo e fonte de inspiração para D2. Ele morreu em 1994, de Aids. “A história deles é muito boa. São caras que cortaram um dobrado só por causa do que cantavam. Eram amigos, mas brigavam muito. Leitores contam que riem muito de alguns casos, pois eles eram muito doidos. Tudo contado ali é verdade, sem nenhum floreio”, garante o autor.

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