“Faz de novo, um pouquinho mais tranquila.” Esse foi um dos pedidos que o maestro Fabio Mechetti fez a Maria Fernanda Gonçalves na segunda parte da audição da oboísta para a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, realizada última na segunda-feira. Dos 10 candidatos, apenas três passaram para a segunda fase.
“Geralmente, isso acontece em audições, pois você possivelmente poderia melhorar o trecho executado”, comentou Maria Fernanda logo ao final do teste, quando ficou sabendo que havia sido escolhida para ocupar a vaga. “O nervosismo é normal, você está exposta. Além disso, há uma autocobrança muito grande”, revelou.
A paulista integra a Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB). Vai pedir demissão para assumir seu posto na Filarmônica no início de 2019. Desde os 18 anos, trabalha em orquestras. “Tornar-se músico de orquestra é o caminho para meu instrumento, pois não se utiliza muito o oboé em música popular. Só que são poucas vagas”, diz.
Em outubro, um dia depois de se inscrever para a audição em BH, Maria Fernanda recebeu um telefonema da Filarmônica. Estava em Aparecida do Norte (SP) e pediram-lhe para vir à capital mineira substituir um oboísta. “Toquei meio na correria, mas foi bom até para ter a certeza de que queria fazer a prova.”
Feliz com a mudança para Belo Horizonte, Maria Fernanda já fez amigos na nova casa. Nascida em Espírito Santo do Pinhal, na divisa de São Paulo com Minas Gerais, ela começou a carreira em sua cidade natal com o conterrâneo Fabio Ogata, trompista da Filarmônica desde 2012.
Alexandre Barros, principal oboé da orquestra, era um dos sete integrantes da banca de Maria Fernanda. “Ela mostrou ter adquirido boa experiência no tempo que passou na OSB, uma orquestra do nível da nossa. Isso pesou na hora da prova, pois dava pra ver que já tinha interpretado aquele repertório algumas vezes.”
De acordo com o oboísta, o ideal é o músico ingressar no grupo a partir dos 25 anos. “Antes disso, ele não tem experiência, não tocou o repertório orquestral. Claro que tudo varia, depende muito do talento e da vivência”, observa.
Com 44 anos e 24 de orquestra, Barros já esteve dos dois lados – tanto integrou bancas quanto participou de audições. “Não é fácil decidir, pois o candidato toca muito pouco. Às vezes, na primeira fase, ele está num nível. Na segunda é outro músico, completamente diferente.”
TESTE Barros está na Filarmônica desde o início. Não passou por audição, pois na época da criação da orquestra, houve um acordo e os integrantes da Sinfônica de Minas Gerais, da qual fazia parte, não precisavam passar por testes. “Mas havia a condição de todos serem avaliados”, explica o maestro Fabio Mechetti.
Nos primeiros anos da Filarmônica, cada integrante do grupo era avaliado duas vezes por ano pelo próprio maestro. “A orquestra estava começando, tinha metade dos músicos da Sinfônica e outros do Brasil e de fora, que se encontraram aqui. Então, era necessário avaliar cada um deles”, explica Mechetti.
Foi uma época de “muito atrito”, de acordo com o regente, pois vários instrumentistas não correspondiam às expectativas. Dez anos depois, dos 31 músicos que vieram da Sinfônica, somente 11 permanecem na Filarmônica. As avaliações prosseguem.
“Como aqui (o regime) é CLT, não existe estabilidade estatutária como nas orquestras estatais. A pessoa entrou, se não dá certo, ela sai. E aqueles (mais antigos) que não estão correspondendo, a gente chama. Uma musicista foi mandada embora recentemente porque chegava atrasada constantemente”, conta Mechetti.
O salário bruto para novos integrantes da Filarmônica é de R$ 9.054,76 – inclui plano de saúde, seguro de vida e do instrumento, vales transporte e refeição. É um valor longe do ideal, admite Mechetti. “Quando a Filarmônica foi criada, a conversa era de que seria pelo menos a segunda orquestra mais bem paga do Brasil, pois atrairia os melhores músicos. Atualmente, somos a quarta, pois estamos congelados há praticamente quatro anos. Infelizmente, estamos perdendo músicos devido à competitividade do mercado”, conclui o maestro.