Se fosse por ele mesmo, Martinho da Vila não estaria com um disco novo. Não por falta de material novo, não por desinteresse no desafio, mas por já desacreditar do formato. "Eu não ia mais gravar discos, agora é tudo digital. Mas era um ano comemorativo, meus 80 anos de vida, 60 de carreira. Então, resolvi fazer." E o que ele fez passa por isso, um disco sem a pressa da juventude, sem a euforia dos iniciantes. Martinho declama, evita formações clássicas do samba, investe em formatos menores e, por algumas vezes, fala com a nostalgia dos homens de 80 anos. O primeiro show será em São Paulo para lançar o disco "Bandeira da Fé" , no dia 9 de dezembro, no Teatro Bradesco.
"Eu mesmo acho que não sou saudoso de nada", garante Martinho. "Que sou o hoje, o futuro.
Leia Mais
I love jazz agita praça do papa'Não se pode cair no quanto pior melhor. Temos que ajudar o Brasil', diz Caetano Veloso Sem Paulo Ricardo e em batalha judicial, RPM volta a compor com novo baixistaA biografia de Martinho da Vila é um estudo sobre ancestralidade e negritudeDjonga, Baco Exu do Blues e BK consolidam trajetórias no hip hop nacional'Só quando me chamam de esquerda caviar eu reclamo', diz Luis Fernando VerissimoPesquisador lança livro que derruba mitos e muda a percepção sobre a economia de MinasO samba Bandeira da Fé, de Martinho com Zé Catimba, tem um engavetamento curioso.
'Minha Nova Namorada', vale o spoiler, é inteiramente declamada sobre uma base de cordas e uma percussão suave. Uma sonoridade bastante cabo-verdiana sem tempos marcados. É mais um momento em que Martinho deixa a festa, a divisão clássica do samba, e parte para uma narrativa falada. A "nova namorada" à qual ele declama seu amor será revelada no final, a Barra da Tijuca.
'Ser Mulher', que começa com os toques de terreiro, foi composta com o eu feminino. Quem declama aqui as frases é Glória Maria. Pode ser sim um contraponto à infelicidade poética de 'Você Não Passa de Uma Mulher', que Martinho fez e cantou para o disco 'Maravilha de Cenário', de 1975. O feminismo à época, mesmo despertando, o acusou de machismo. Ou ao supersucesso 'Mulheres', gravado em 1995 no álbum 'Tá Delícia, Tá Gostoso', embora já haja interpretações de que o homem que diz que já teve mulheres de várias idades e muitos amores, ao final, ficaria com um homem se tornando assim, um raro samba com tema gay.
A conversa com Martinho da Vila ganha outro rumo e para em Beth Carvalho. Impossibilitada de ficar de pé por sérios problemas na coluna, a rainha do samba fez neste ano um show deitada, rodeada pelo grupo Fundo de Quintal. Foi uma das imagens mais fortes e tradutora do espírito que Beth mesmo reforça de que "o show não pode parar".