Os Titãs acabam de lançar o DVD do espetáculo Doze flores amarelas – A ópera rock, gravado ao vivo, em São Paulo. O show cênico narra o drama de três universitárias vítimas de estupro, ponto de partida para canções sobre temas como misoginia, religião e violência. O formato é inédito na história da banda, mas as abordagens correspondem ao velho anseio dos integrantes de levantar questões pertinentes ao contexto brasileiro.
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A trama de Doze flores amarelas surgiu durante brainstormings entre os músicos. Eles queriam narrar a história de um grupo de faculdade e perceberam que a violência sexual seria um gatilho para tratar de diversas questões. “O estupro, um tema forte e atual, abre um leque de assuntos que precisam ser discutidos”, afirma Britto. Após o crime, as três protagonistas – todas chamadas Maria – juram vingança a seus estupradores. As atrizes e cantoras Corina Sabbas, Cyntia Mendes e Yás Werneck dão vida às personagens e fazem os vocais de apoio à banda.
O molde do projeto bebe na fonte do álbum The wall, do Pink Floyd, entre outras óperas-rock de sucesso – formato pouco explorado no Brasil. Os integrantes também buscaram referência no estilo da banda canadense The Kings, em filmes musicais e óperas clássicas. Com 25 canções, o espetáculo é dividido em três atos, além de interlúdios e instrumentais curtos que costuram uma faixa à outra. Na narração, há a participação especialíssima de Rita Lee.
Ouça Doze flores amarelas:
ÓTICA Em Doze flores amarelas, a violência contra a mulher ganha uma ótica inteiramente masculina. O texto é assinado por Marcelo Rubens Paiva e a direção-geral é de Hugo Possolo e Otávio Juliano. “Sentimos que não estamos tomando o lugar de fala de ninguém. Falamos sob o ponto de vista dos personagens, algo legítimo, que se faz há seculos”, observa Sérgio Britto. “Essa visão de que a mulher é um objeto do qual os homens podem dispor é uma estupidez sem tamanho. Tomamos bastante cuidado para tratar o tema de forma sensível. Diz respeito a todos nós, homens e mulheres.”
Na faixa Me estuprem, os Titãs criticam o hábito comum de se responsabilizar a vítima pelo crime sofrido: “Me estuprem/ A culpa é toda minha/ Me desculpem/ Me vestir assim/ Me estuprem/ Eu quis sair sozinha/ Me desculpem/ Estar falando em mim”.
Britto nega que a discussão sobre o lugar de fala (que limita o direito de pessoas que não sofrem a violência ou discriminação a falarem a respeito) tenha imposto limitações ou um distanciamento no processo de concepção da narrativa. “Sabíamos que (o projeto) geraria discussão. Nem sempre é possível agradar a todos. Mas, se não pudéssemos contar essa história com personagens femininas, o trabalho seria extremamente limitado. Nesse caso, qualquer outra história que não fosse sobre roqueiros de meia-idade também poderia ser considerado ilegítimo. Tomamos todos os cuidados possíveis e resolvemos tentar convencer as pessoas de que isso não é um problema.”
O instrumentista ressalta que, apesar de ser seu tema central, a violência contra a mulher não é a única problemática evocada pelo espetáculo. Com as canções A festa e Disney drugs, a banda fala sobre o consumo de drogas. “São questões do dia a dia. Quando ligamos a TV, há uma amostra de tudo que está presente nas músicas. Nas ruas, o tráfico de drogas segue reinando. São questões que, assim como as implicações que as sucedem, fazem parte do nosso cotidiano”, avalia o músico. “Como uma banda, mais que ditar normas, levantamos questões. Nossas músicas sempre tiveram esse viés e, nesse caso, não é diferente.”
O tamanho do projeto, que envolve grande aparato técnico em iluminação e cenografia, inviabiliza sua circulação pelo Brasil. A turnê deve passar pelas capitais brasileiras a partir de março de 2019. Enquanto isso, o grupo dá uma palhinha do novo repertório nos shows dedicados aos grandes sucessos.
Doze flores amarelas – A ópera rock
. Titãs
. Universal Music
. 34 faixas
. Disponível em CD duplo, DVD e nas plataformas digitais