Pernambucano Siba traz a BH sua musicalidade regional e engajada

Músico apresenta o show de Baile solto, seu segundo álbum solo, lançado em 2015, quando já falava das tensões que o país vivencia hoje

por Pedro Galvão 28/07/2018 08:00
José de Holanda/Divulgação
José de Holanda/Divulgação (foto: José de Holanda/Divulgação)
"Teremos muros, grades, vidros e portões, mais exigências nas especificações, mais vigilância, muito menos exceções, que lindo acordo de cidadania!” Em Marcha macia, os acordes dançantes na guitarra acompanham a letra cheia de ironias. A música abre Baile solto, álbum lançado pelo pernambucano Siba em 2015. Trata-se de uma introdução certeira para o que vem nas nove faixas a seguir e também para o cenário de tensões sociais que já se desenhava naquela época.

Em turnê desde então, Siba vem alterando o repertório, incluindo outras peças de sua rica carreira, iniciada na década de 1990. O Baile solto aporta neste sábado (28) em BH com show n’A Autêntica antecedido por apresentação do mineiro Arthur Melo.

Aos 49 anos e há 20 vivendo em São Paulo, Siba foi responsável pela guitarra, rabeca e vocal no Mestre Ambrósio. A banda se destacou ao lado de Chico Science, Nação Zumbi e Mundo Livre S/A, quando o Brasil voltou os ouvidos para a música feita em Pernambuco, diante da explosão do Manguebeat. A mistura do maracatu com o forró, coco e outros ritmos locais que se tornou característica do grupo marcou também a trilha de Baile perfumado (1996), de Paulo Caldas e Lírio Ferreira, exemplar cinematográfico da onda pernambucana que conquistou o país.

Com o fim do Mestre Ambrósio, Siba seguiu com outros projetos e outros parceiros, muitos deles resultado de um período vivendo em Nazaré da Mata, na Zona da Mata pernambucana. Com a Fuloresta do Samba, ele lançou quatro discos desde 2002, sendo o mais recente deste ano, pelo Selo Sesc. Com Barachinha, gravou No baque solto somente (2003), mergulho nesse estilo de maracatu. Avante! (2012) foi o primeiro disco solo, seguido de Baile solto.

“A gente liga tudo o que é popular, tudo o que é herança africana ou indígena a raiz, origem, passado e nega toda possibilidade de agenciamento político no presente. Sem querer, até a gente que ama isso reforça os estereótipos do simples, do folclórico, do coletivo, do não autoral. São preconceitos profundos e antigos, que servem para manter a exclusão, a penúria e a falta de reconhecimento do valor que essas tradições têm no país inteiro”, avalia Siba.

Ele diz que, mesmo em Recife, “há um discurso de gostar da cultura popular do estado, mas, quando se chega perto, a intimidade da classe média com a cultura popular é muito pequena, sobretudo quando cai em questões mais políticas”. Em Baile solto, ele usa o maracatu e outros “ritmos de rua de Pernambuco” para abordar de forma sutil injustiças sociais, fome, desigualdade e abusos de poder do estado. Em 2014, foi imposto um polêmico toque de recolher aos ensaios de maracatu no interior de Pernambuco, limitando-os até um horário específico, contrariando a tradição de amanhecer o dia tocando.

“Desde 2013, o país começou a derivar para uma posição mais violenta, mais excludente, mais injusta de um modo geral. Isso começou a aparecer de modo específico no maracatu de baque solto para discutir nossa ideia de país. Há momentos do disco em que parece que estou adivinhando o que viria a acontecer. O impacto local já era forte. Já discutíamos a imposição de um toque de recolher a uma tradição secular do maracatu. Não era violenta fisicamente, mas já mostrava o autoritarismo dos governantes, que se mostrou bem mais abrangente depois. Baile solto traz tudo isso e faz um resgate rítmico da rua”, diz Siba, que enxerga a cultura popular como “uma força que mantém o país vivo”.

Sobre a transposição do disco para o palco, ele diz: “O show é um corpo vivo para mim, nunca é fechado, então entram outras contribuições. Temos hoje um formato sem a tuba, diferente do disco. São duas guitarras, bateria percussão, tudo construído na estrada do Baile solto”.

Siba + Arthur Melo
Show neste sábado (28), às 22h, n’A Autêntica (Rua Alagoas, 1172, Savassi). Ingressos: R$ 30 (antecipado no site Sympla) e R$ 40 (na portaria). Mais informações: (31) 3654-9251.

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