Os artistas portugueses expostos no Museu Amadeo de Souza-Cardoso, às margens do Rio Tâmega, pareciam ter dialogado com os músicos que subiam ao palco do Parque Ribeirinho ou no pátio interno da casa com a mesma intenção modernista, ainda que ninguém estivesse ali sob rótulo algum. Na tela, Julio de Almada Negreiros (1893-1970) fazia saltar um menino carregador de vinhos de rosto quente e alaranjado, de uma luz arrebatadora mas de corpo disforme pelo cubismo de Picasso.
No palco, a cantora da Mauritânia Noura Mint Seymali e seus três músicos desfiguravam as matrizes do blues norte-americano para apresentá-lo em sua origem, oeste-africano, esculpido pelas escalas árabes de Noura e pela guitarra crua de Jeich Ould Chighaly. Na tela, Paula Rego mostrava os conflitos de uma Rainha Santa Isabel em traços coloridos e muita angústia, traindo a placidez e a benevolência dos santos. No palco, o português Rui Veloso fazia sua tradução do lamento fadista sob o conforto de solos de guitarras monumentais, traindo a fúria do rock que lhe deu forma. Só atingiria a festa, como ensinaram os modernistas, quem primeiro passasse pela dor.
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Os brasileiros enfrentam um terreno curioso. Interessante ver o Baiana System sem a mesma recepção bombástica, testando a força de seu show sem subir ao palco com o jogo ganho.
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