CD Garimpo de João Cavalcanti e Marcelo Caldi revela 'ouro puro'

Em carreira solo depois de chamar a atenção com o grupo Casuarina, João Cavalcanti se junta a Marcelo Caldi no álbum Garimpo. Dupla apresenta canções elaboradas e parcerias variadas

por Estado de Minas 10/06/2018 08:38
Eduardo Martino/divulgação
João Cavalcanti e Marcelo Caldi, crias da Lapa carioca, são amigos há 20 anos (foto: Eduardo Martino/divulgação)

João Cavalcanti compõe desde garoto, mas, em 16 anos de Casuarina, grupo de samba do qual foi vocalista até o fim de 2017, pouco cantou suas músicas em shows. Agora solo, e, aos 38 anos, na plenitude como cantor, ele se apropria de sua produção mais recente. No CD Garimpo (Som Livre/ MP,B), em duo com o amigo Marcelo Caldi, acordeonista, pianista e arranjador, João apresenta inéditas e composições que haviam sido gravadas por outros intérpretes.

Na peneira dos garimpeiros, ficaram letras e melodias buriladas como hoje pouco se ouve. “Tem muito a ver com minha saída do Casuarina eu me reconhecer cada vez mais veículo de mim mesmo”, João conta. “Não queria mais comprar aquele barulho de ser crooner de baile. O grupo veiculava só um pedaço meu. Conseguia emplacar as músicas nos discos, mas não nos shows. Ficou doído. Agora, nesse formato tão cru e enxuto, embora o Marcelo seja múltiplo, a canção está sublinhada. E ficamos com uma palheta muito abrangente, multitonal.”

As composições vêm de 2011, de antes do primeiro CD solo, Placebo. Em Garimpo, 13 das 14 faixas são suas, 12 com parceiros – de Joyce Moreno (a bucólica Dia lindo) e Mario Adnet (Valsa de baque virado, um maracatu ao piano) ao pai, Lenine (a densa A causa e o pó, com participação do português António Zambujo).

XOTE


João e Caldi assinam o xote SerCidade e Bem melhor,  sobre um “amor de tantos poréns, reduzido a senões”. Consumido é parceria de João com o uruguaio Jorge Drexler. Pêndulo, ele fez com Cláudio Jorge. Não sós é de João apenas. A carnavalesca Serpentina é parceria de Caldi com o carioca Edu Krieger.

A sensual O nego e eu, feita no passado por João para Roberta Sá, é a mais conhecida do conjunto. Escolhida para um clipe com Camila Pitanga dirigido por Alexandre Nero, a deliciosa milonga Indivídua havia sido registrada por seu coautor, Pedro Luís, e também por Luana Carvalho, filha de Beth Carvalho.

Goncalo F. Santos/Divulgação
O cantor português António Zambujo é o convidado especial do álbum (foto: Goncalo F. Santos/Divulgação)

Ao falar do processo da escrita e de uma musa que “não inventa crises nem exige crases”, a letra é cheia de ressignificações: “É uma fonema que me enche a boca/ toda correlata me substantiva/ tão objetiva, superadjunta/ sou uma prisioneira de sua sentença”.

Garimpo, sobre um amor que é “uma pedra a mais/ que é extraída/ de uma jazida em mim/ pode virar pó/ ou valer por dez/ mas por um momento/ é sem fim”, já saíra na voz da parceira Antonia Adnet.

Os temas de João incluem a solidão da cidade grande, a origem do carnaval, uma reflexão sobre a gravidade. São tão variados quanto a sonoridade que resulta de seu encontro com Caldi. “Poderia cansar, sendo um CD de duo, mas pelo fato de eu tocar dois instrumentos a gente pôde dar coloridos diferentes”, considera o músico.

“As escolhas das canções foram para a construção de uma narrativa, não para ser um catálogo de parceiros. Na varanda fala da minha relação com meus filhos. Hoje, o exercício da paternidade em sua plenitude é um dos atos políticos mais fortes do meu cotidiano. A Valsa de baque virado propõe um processo de criação de identidade brasileira, uma reflexão sobre o racismo, em que o rei e a rainha são os do maracatu, e não os de uma monarquia falida”, explica João.


LAPA

Garimpo é um CD forjado em afetos. Ambos da geração que dividiu noites na Lapa, João e Caldi começaram juntos há 20 anos, no grupo de sabor nordestino Rodagente. A inspiração veio da revolução musical ecoada de Pernambuco por nomes como Chico Science e Mestre Ambrósio.

Na virada para os anos 2000, veio a carreira no Casuarina. Caldi seguiu com seu trabalho como compositor, instrumentista e cantor. “A gente sempre esteve ligado, o duo era para acontecer”, diz Caldi. “Ele criou arranjos supermetalinguísticos e estou tomando conta do meu repertório, numa reintegração de posse bem-vinda. Esse disco é a síntese da vivência da gente”, define João.

João Cavalcanti prepara outro trabalho, com participação de Jorge Drexler, e tem mais um em andamento, com o Coletivo 3, que criou com Alfredo Del-Penho e Pedro Miranda, duas outras crias da Lapa carioca. (Estadão Conteúdo)


FAIXA A FAIXA


Consumido
De João Cavalcanti e Jorge Drexler

Pêndulo
De João Cavalcanti e Cláudio Jorge

A causa e o pó
De João Cavalcanti e Lenine. Com António Zambujo

Garimpo
De João Cavalcanti e Antonia Adnet

Dia lindo
De João Cavalcanti e Joyce Moreno

Serpentina
De Marcelo Caldi e Edu Krieger

Valsa de baque virado
De João Cavalcanti e Mario Adnet

Domingos
De João Cavalcanti e Zé Renato

Bem melhor
De João Cavalcanti e Marcelo Caldi

Indivídua
De João Cavalcanti e Pedro Luís

Na varanda
De João Cavalcanti, Tiê e Plínio Profeta

O nego e eu
De João Cavalcanti

SerCidade
De João Cavalcanti e Marcelo Caldi

Não sós
De João Cavalcanti


Som Livre/divulgação
(foto: Som Livre/divulgação)
GARIMPO
De João Cavalcanti e Marcelo Caldi
Som Livre/MP, B
Preço médio: R$ 24,90

MAIS SOBRE MUSICA