Com 10 anos de uma premiada trajetória recém-celebrados, a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais vive um momento de preocupação. A exemplo de tantos outros setores, a orquestra se vê ameaçada pela falta de recursos. O orçamento anual para a manutenção de todas as atividades da orquestra é de R$ 30,5 milhões – desse total, R$ 18,3 milhões são oriundos de um termo de parceria com o governo estadual.
A verba repassada pela Secretaria de Estado da Cultura é destinada à remuneração dos músicos e da equipe técnica, entre outros itens do orçamento da instituição. Segundo o Conselho Administrativo da Filarmônica, a primeira das quatro parcelas acordadas para este ano, no valor de R$ 5,1 milhões, cujo desembolso estava previsto para fevereiro, não foi paga. A próxima parcela – de R$ 4,9 milhões – tem o próximo dia 31 como data agendada para pagamento.
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As outras receitas que complementam o orçamento da Filarmônica são provenientes de patrocínios via Lei Rouanet (R$ 9 milhões) e venda de assinaturas e ingressos (R$ 3 milhões), segundo a administração da orquestra. No entanto, é vedado o uso de recursos obtidos via lei de incentivo para pagamento da folha, que gira na casa dos R$ 22 milhões anuais.
“Trabalhamos num nível de planejamento muito alto. Nosso comitê já está planejando 2019 e 2020. Está tudo fechado. Temos muito cuidado com a agenda e temos que antecipar a programação para captar os recursos da Lei Rouanet, que complementam nosso orçamento. Mas nada disso adianta se não tiver orquestra. É com os recursos do termo de parceria do governo que pagamos nossos músicos e nossa equipe técnica, que também é muito importante”, afirma Roberto Mário, presidente do Conselho Administrativo da Filarmônica.
“Não podemos dar pão para o funcionalismo público e brioches para a Filarmônica”, diz Angelo Oswaldo. O secretário afirma reconhecer a importância da orquestra e ter avaliação positiva sobre seu desempenho, mas ressalta que ela tem alto custo de operação, num cenário complicado para toda a economia estadual.
COMPROMISSO “Estamos mantendo o pagamento dos recursos destinados à Filarmônica, que perfazem o total de R$ 18 milhões por ano. Exatamente a metade do total de recursos de que dispomos para políticas públicas. Isso demonstra, de saída, o compromisso e o comprometimento do estado com a manutenção da Filarmônica, que, como diz a própria palavra, é uma orquestra filantrópica e deveria levantar recursos junto à iniciativa privada e à sociedade civil. O governo Fernando Pimentel, no entanto, reconhecendo a importância da Filarmônica, já executa o quarto orçamento de R$ 18 milhões desde 2015, sendo que temos ainda a responsabilidade da manutenção da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais e da Orquestra Sinfônica da PMMG, que também são um grande patrimônio de Minas”, afirma o secretário.
O conselho da Filarmônica afirma que, embora haja alguma reserva, o atraso no repasse por parte do estado pode comprometer a atividade. “Entendo a crise (financeira do estado), mas a regularidade é fundamental, e isso pode nos matar. A Filarmônica não é um projeto para cinco anos, é para décadas. Queremos essa longevidade, temos bilheteria, amigos que colaboram, mas, sem esse repasse do estado, ficamos comprometidos”, diz Roberto Mário.
O presidente do conselho da orquestra cita os resultados e o prestígio alcançados pela formação para reafirmar seu valor como patrimônio cultural do estado. “Não quero dizer que é um projeto melhor que os outros, mas basta ver os resultados que temos de público, de mídia e também entre os músicos. Sei que o dinheiro é curto, mas, se há um projeto bem-sucedido em Minas Gerais, é a Filarmônica. Temos turnês programadas fora do país, muito concertos pela frente. É lamentável ver que tanto já foi feito e que isso pode ser perdido”, diz.
Por sua vez, Angelo Oswaldo afirma que “ninguém atrasa pagamentos por vontade própria. São dificuldades, crises, ambas do conhecimento de todos e esperamos compreensão. Não temos deixado de fazer os pagamentos, mas há um atraso e não vamos conseguir quitar isso de uma vez só. Nem é necessário. Se formos repondo os recursos de reserva de que eles lançaram mão, continua num quadro aceitável. A Filarmônica precisa entender que está em Minas Gerais, no Brasil, na América do Sul, diante de um quadro de dificuldades, e nunca negamos nosso empenho”.
Agenda cheia e turnê na Europa
No próximo sábado (26), a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais apresenta em sua sede, a Sala Minas Gerais, inaugurada em 2015, o concerto Expedições: Rússia. O programa inclui composições de Rachmaninov, Borodin e Tchaikovsky. Até o fim do ano, outros 43 concertos estão agendados na sala e mais três no interior do estado – em Poços de Caldas (29/6), Passos (30/6) e Betim (29/7).
Para outubro está prevista uma turnê por Lisboa, Amsterdã, Paris, Praga e Berlim, em uma parceria com o Ministério das Relações Exteriores e com apoio do Ministério da Cultura. Em seus 10 anos, a Filarmônica contabiliza 731 concertos realizados (com 975 obras apresentadas) para um público de 950 mil pessoas. Desses concertos, 38 foram fora de Minas Gerais e cinco fora do país, num sinal do reconhecimento que a orquestra foi adquirindo para além do estado – formalizado também na forma de prêmios ao conjunto dos músicos e ao seu regente.
A instituição conta hoje com 18 patrocinadores, que escolheram associar suas marcas à Orquestra Filarmônica de Minas Gerais e são responsáveis pelos R$ 9 milhões anuais que vêm sendo captados com benefício da renúncia fiscal.
Além das séries regulares de concerto realizadas pela Filarmônica, a orquestra se dedica a projetos de formação de público, com iniciativas educacionais como os Concertos para a Juventude, os Concertos Didáticos, o Festival Tinta Fresca, o Laboratório de Regência, os Concertos Comentados e os Concertos de Câmara. A Filarmônica também vem investindo num projeto de audiodescrição para incrementar a acessibilidade aos seus concertos.
Nas apresentações agendadas até o final deste ano a orquestra deverá receber, entre outros solistas e convidados, o barítono Paulo Szot (em julho), a violinista Rachel Barton Pine e o regente Isaac Karabtchevsky (em agosto) e os pianistas Nelson Freire (em setembro) e Arnaldo Cohen (em dezembro).