“O sabiá no sertão/Quando canta me comove/Passa três meses cantando/E sem cantar passa nove/Porque tem a obrigação/De só cantar quando chove.”
Ouvir esses versos é voltar no tempo, pelo menos uns 15 anos. Apresentados por José Paes de Lira, o Lirinha, anunciavam o fim do show do Cordel do Fogo Encantado. Como a calma que antecede a tempestade, os versos davam início à catártica Chover (ou Invocação para um dia líquido), canção do primeiro álbum da banda de Arcoverde, e também o hit do grupo.
Hit é uma palavra que quase não casa com o quinteto, criado na pequena cidade que serve de porta de entrada para o sertão pernambucano. Formado como um grupo teatral com bases sólidas na cultura popular (o nome da banda já entrega), nasceu a partir do espetáculo Cordel do fogo encantado. Sua música, baseada nas cordas e na percussão, sempre fugiu do padrão da canção pop.
Como banda, o Cordel existiu por 10 anos. Parou em 2010 e só veio retornar neste 2018. Para o público, na verdade. As conversas iniciais entre os cinco integrantes – Clayton Barros (violão e voz), Emerson Calado (percussão e voz), Nego Henrique (percussão e voz) e Rafael Almeida (percussão e voz), além do vocalista Lirinha – datam de 2016.
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Em grande estilo, Ozzy Osbourne presenteia público com ótimo show no Mineirão Cercado de simbologias, novo disco de Elza Soares extrapola os limites do políticoCordel do Fogo Encantado faz show no Central Park, em Nova YorkCom o filho, a ex e a atual mulher, Antonio Fagundes traz peça a BHO trabalho, mesmo passados 12 anos do disco anterior (Transfiguração, de 2006), dialoga diretamente com a discografia do grupo. Parte de um tema central – a procura pela liberdade – que é contado através das canções. “São cinco personagens (os próprios músicos) que estavam adormecidos num sono profundo embaixo da terra, envolvidos em casulos. Acordamos deste grande sono e seguimos em direção ao coração solar.
A sonoridade é basicamente a mesma, acrescida da guitarra de Fernando Catatau. Produtor do álbum, o músico cearense participou da maior parte das canções. No palco, o Cordel conta com a voz de Isadora Melo, que acompanha Lirinha em algumas das músicas.
STREAMING O retorno da banda começou aos poucos. Ausente das plataformas digitais, o Cordel vinha recebendo demanda para que lançasse seus três primeiros discos via streaming – os três títulos, Cordel do Fogo Encantado (2001), O palhaço do circo sem futuro (2002) e o já citado Transfiguração estavam fora de catálogo.
Quando realizaram as primeiras reuniões, Lirinha vivia em São Paulo, e Emerson Calado, em Palmas, no Tocantins; Clayton, Nego Henrique e Rafa Almeida continuavam no Recife. “Quando nos separamos, tudo ficou muito disperso. Pensamos em organizar nossa memória, pois era realmente importante ter o material discográfico disponível”, diz Lirinha.
Já que lançariam sua discografia no mundo digital, resolveram ir mais a fundo e fazer um novo disco. “A ideia era colocar o Cordel numa atividade do momento do agora, neste mundo que reencontramos. Isto nos deu um impulso enorme.”
Os dois integrantes que estavam fora de Pernambuco voltaram para Recife.
As 13 canções de Viagem ao coração do sol vieram aos poucos. Nos primeiros encontros, os integrantes relembraram fragmentos de músicas que tinham sido compostas no período em que a banda estava ativa, mas que nunca tinham sido gravadas. “Elas nunca mais tinham sido mexidas, então o disco é metade disso. A outra metade é pós-2006 (época do terceiro álbum), coisas feitas em ônibus, hotel, quando estávamos em turnê. Juntamos isto com novas composições que surgiram no reencontro”, conta Lirinha.
O novo show segue a linha dos espetáculos da primeira fase do Cordel. A partir do tema do disco que dá nome à turnê, a banda conta aquela história. O material antigo foi inserido no espetáculo, só que numa nova narrativa – Chover está no repertório, vale dizer.
REPERTÓRIO A volta, Lirinha antecipa, não é definitiva. A nova turnê deve durar entre um ano e meio, dois.
Este retorno à cena – nos discos e nos palcos – vem apresentando um outro universo para o grupo. “A banda surge na chamada crise das gravadoras. Vivemos o auge daquele momento e, depois, seguimos independentes. Na época, a internet que existia não era como é hoje. Em Arcoverde então, era algo muito raro”, comenta. O máximo que o Cordel da primeira fase teve no universo digital foram comunidades de fãs no extinto Orkut.
“Agora, voltamos para um novo mundo, que mostra uma sociedade alterada e modificada pelas redes socais. Por causa das plataformas, começamos a experimentar um público que nunca nos viu. Aconteceu nos shows de Salvador, Rio e Recife (os três já realizados), vimos pessoas de 18 anos, que tinham 10 quando nos separamos.”
E o novo público aprovou o novo Cordel. As cinco músicas mais executadas da banda no Spotify são de Viagem ao coração do sol.
CORDEL DO FOGO ENCANTADO
Show sábado (19), a partir das 22h, no Music Hall, Avenida do Contorno, 3.239, Santa Efigênia. Ingressos: R$ 45 (pista, meia, 3º lote); R$ 80 (pista, inteira, 2º lote); open bar (R$ 120, 2º lote). À venda no ticketbrasil.com.br..