"Vem comigo, vem" é a frase que MC Elvis faz questão de repetir em suas músicas. Cantado de forma irreverente, o bordão soa como um convite para que os ouvintes se joguem nas batidas envolventes de canções como Confesso, Idiota e Tá rocheda - um dos hits do carnaval pernambucano de 2018, originalmente lançado pela banda A Loba. Sucessos como esses foram responsáveis por tornar o jovem de 22 anos, ex-malabarista em sinais de trânsito, uma das principais figuras da atual cena do brega local.
Em abril deste ano, o morador do bairro de Areias, na Zona Oeste do Recife, ultrapassou fronteiras regionais e assinou um contrato com a Start Music, uma das principais gravadoras de funk de São Paulo - o time de artistas é composto por nomes como Jerry Smith, MC WM e MC Loma e as Gêmeas Lacração. Para selar a parceria, o cantor viajou de avião pela primeira vez. "De início, eu nem acreditei. Fiquei bastante feliz porque nós do Recife sonhamos muito em conhecer outros lugares”, contou o MC, em entrevista ao Viver.
Quando questionado sobre a possibilidade de migrar para um estilo mais próximo do funk do Sudeste, Elvis é contundente: "Jamais. Se a Start me procurou não foi pelo funk. Se fosse para mudar, eu não mudaria. Vou continuar cantando brega funk e tentar fazer com que vários de lá cantem também”. Ele também afirma que, por enquanto, não pretende sair de Pernambuco: "Vou dividir minha rotina de trabalho entre São Paulo e Recife".
TRAJETÓRIA
Até chamar atenção dos paulistas ou tornar-se uma celebridade da cena bregueira, Juan Elvis Victor dos Anjos Oliveira percorreu uma trajetória árdua, construindo uma biografia semelhante à de outros artistas de música de periferia. Ainda criança, largou o sonho de ser jogador de futebol para fazer malabarismo nos sinais de trânsito. "Foi com essa função que eu juntei dinheiro para gravar as músicas nos estúdios, que na época cobravam em torno de R$ 100 ou R$ 150", relembra.
Para ter maior visibilidade no meio brega, ele contou com um “padrinho”, o MC Troia. Juntos, eles lançaram músicas como Bota bota, Ai pai, para e Sarradinha. Com o passar do tempo, Elvis começou a ser reconhecido nas ruas e nos transportes públicos. Hoje, tem uma agenda de shows lotada. Só neste fim de semana são sete apresentações. No sábado, ele canta nas casas Pier House (Olinda), Mistura Show e Arena Perimetral (ambas em Recife). "Eu não me vejo no auge ainda. Não consigo me ver como um MC 'estourado' ou famoso, mas é claro que sentimos algo de diferente”.
UM NOVO MOMENTO PARA O BREGA
Hoje, o brega vive uma de suas fases de maior evidência, com a projeção nacional de artistas como MC Loma e a recente contratação de MC Elvis por uma gravadora do eixo cultural Rio/São Paulo. Para compreender mais esse momento, conversamos com Thiago Soares, professor e pesquisador do Programa de Pós-graduação em Comunicação (PPGCOM) da UFPE e autor do livro Ninguém é perfeito e a vida é assim: a música brega em Pernambuco (2017).
Entrevista - Thiago Soares / jornalista e pesquisador do brega
Como o brega conseguiu adquirir essa projeção para fora de Pernambuco?
O brega esteve nas rádios nos anos 1970, foi consagrado pela TV pernambucana nos anos 2000 com programas de auditório e, desde o advento do YouTube, que foi em 2005, houve um espraiamento do ritmo para a cultura digital. Assim, ele chega em um mercado que não consumia esse tipo de música até então. Isso aconteceu em um momento bem significativo, que acompanhou a ascensão das classes populares no Brasil e consumos ligados aos aparelhos eletrônicos, sobretudo o celular e o computador.
Quais as transformações estéticas que essa exportação acarretou?
A partir desse espraiamento da cultura digital, apareceram MCs como Sheldon e Troinha. Ali temos uma tentativa de deixar o brega esteticamente mais jovem através de ritmos hegemônicos, que no caso foi a música pop e especialmente o funk, que é a música pop de periferia mais hegemônica do país. São movimentos que fazem parte da expansão mercadológica de qualquer gênero musical. Os ritmos vão se atualizando e negociando esteticamente, ainda mais nesse tipo de música mais comercial, que está muito inserida na lógica das produtoras.
É nesse contexto que surgem MC Loma e as Gêmeas Lacração?
Sim, a cultura digital está presente desde a origem delas. A primeira pessoa que falou delas foi o Felipe Neto, que é um youtuber. No clipe de Treme treme, temos os Irmãos Rocha e o Júlio Cocielo, que são meninos do YouTube. A estratégia delas está totalmente voltada para a cultura digital e da música teen. Não é de funk, não é da ‘funkeira’ tradicional. No ponto de vista de sonoridade, Loma não fez nada do que artistas como Troinha já não faziam, mas houve essa contingência de mercado através do acionamento da cultura digital, que transformou ela em uma figura nacional, além mediação do Felipe Neto e da Anitta.
É possível afirmar que a MC Loma abriu portas para outros bregueiros nessa expansão do ritmo?
Sim, pois foi ela que gerenciou esse movimento. Existe uma playlist no Spotify chamada Brega Funk. Nela, você tem Dadá Boladão, Elvis, Sheldon, Troinha, mas a Loma tá na capa. Foi tudo feito a partir dela, devido a uma singularidade performática que elevou o status de interesse mercadológico. Ela vai abrir portas para outros MCs, mulheres, grupos de brega, não apenas de Pernambuco. Também é preciso que exista um movimento de adesão. Os artistas não vão ser chamados apenas porque são de Recife. É interessante analisar os fatores performáticos que podem agenciar o mercado nacional. Foi isso que Loma fez, fazendo surgir novas possibilidades para o brega funk.
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