Odair José completa, em 16 de agosto, 70 anos. Acha complicado ver os anos passando, tanto que cita Keith Richards para falar da efeméride próxima. “A gente só chega nesta idade porque não morreu antes.”
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É um Odair José roqueiro, com uma banda de bambas com a metade da idade dele, que retorna a Belo Horizonte nesta semana. No sábado, ele se apresenta n’A Autêntica. É o show de seu mais recente álbum, Gatos e ratos (2016), seu 36º disco, que, inclusive, foi visto há um ano no Teatro Bradesco.
“Brasileiro gosta de uma coisa mais calma, é acostumado com rádio. Até gosto de uma baladinha, mas show é festa.” Foi um ótimo show para um público diminuto, que certamente estaria mais confortável numa casa noturna. A música do Odair José de hoje é para dançar por vezes, cantar sempre e ouvir alto, muito alto. “A gente não tem certeza de nada, mas acho que o show tem mais a ver com esse tipo de ambiente. Fazemos barulho e às vezes um teatro pede uma coisa mais contida.”
O cantor e compositor goiano chega a BH num ótimo momento. No último fim de semana, fez três apresentações no Sesc 24 de Maio, em São Paulo, dentro do projeto O lado B da censura. Depois de Chico Buarque, Odair José foi o compositor brasileiro mais censurado durante a ditadura militar. “Como se isso fosse vantagem”, comenta ele a respeito da “colocação”. “Só atrapalhou a gente de trabalhar e trouxe muitos problemas.”
Um dos maiores foi com seu álbum O filho de José e Maria (1977), recuperado em dois dos shows em São Paulo. Gravado com o trio jazzístico Azymuth, é uma ópera-rock que acompanha a história de um Jesus bem diferente ao da Bíblia. A descoberta da sexualidade e o envolvimento com drogas fazem parte da narrativa do personagem.
A censura caiu de pau. Originalmente, o álbum teria 18 canções, só 10 foram liberadas. Odair José era um dos artistas mais populares da época. Lançado em compacto em 1972, Vou tirar você deste lugar, sobre uma prostituta, vendeu 1 milhão de cópias, mesmo tendo acendido a luz vermelha dos censores.
“Minha música sempre foi muito espontânea, baseada em minhas observações da rua. Defendo a tese, desde aquela época, de que a prostituição tem que ser vista como profissão e ser respeitada. Quando gravei, foi a primeira vez que me chamaram na censura. Disseram-me que Vou tirar você deste lugar não era boa para o momento, afinal, estávamos no governo militar. Eu disse que era sobre uma prostituta. O censor disse: ‘Pior ainda, como dizer no rádio que você vai se casar com uma puta’?”
Mas com O filho de José e Maria não teve como escapar. Mesmo cortado quase pela metade, o trabalho foi condenado, não tocou em lugar nenhum e Odair José foi ameaçado de excomunhão pela Igreja Católica. Praticamente ignorado, o álbum acabou sendo abandonado pelo autor – hoje, o LP é disputado a tapas em sebos.
Com o Azymuth – Ivan Conti na bateria, Alex Malheiros no baixo e o mineiro Kiko Continentino nos teclados, em substituição a José Roberto Bertrami, morto em 2012 –, Odair José recriou 40 anos mais tarde a ópera-rock. O show de São Paulo será reprisado no início de maio, no Rio. O cantor espera pode viajar com ele para outras cidades, como também gravar um novo álbum com o Azymuth.
Por ora, ele deve trazer alguma parte deste repertório para o show d’A Autêntica – a definição das músicas será feita no ensaio de amanhã. “Como já estou tocando com a banda há bastante tempo, temos uma facilidade de entendimento. Toco Pílula (o apelido de Uma vida só, outro hit também combatido pela censura), Vou tirar você deste lugar também. Só não vou tocar tudo porque senão seria um show de clássico. Gosto que as pessoas esperem uma coisa e vejam outra.”
ODAIR JOSÉ
Show sábado, às 22h, n’A Autêntica (Rua Alagoas, 1.172, Savassi). Abertura com Cabezas Flutuantes. Ingressos: R$ 25 (promocional), R$ 35 (antecipado) e R$ 45 (na portaria).