Fã de Ozzy Osbourne, coveiro dá nome do ídolo a cemitério no interior de Minas

Breno Baeta é estudante de ciências sociais e passou em concurso para se tornar coveiro em Cristiano Otoni. Além de homenagear o Príncipe das Trevas, ele pretende reorganizar a necrópole local

por Pedro Galvão 25/03/2018 08:00

 

Fotos: Beto Novaes/EM/D.A Press
(foto: Fotos: Beto Novaes/EM/D.A Press)
CRISTIANO OTONI - Ter a morte como material de trabalho pode ser o caminho para um jovem do interior de Minas Gerais realizar o sonho de sua vida. Breno Baeta, de 24 anos, nasceu e cresceu em Cristiano Otoni, a 118 quilômetros de BH. Desde 2016, é o responsável pelo cemitério local, tendo sido selecionado em concurso público para o cargo de coveiro do município de apenas 5 mil habitantes.

Fã de rock e heavy metal, com especial devoção por Ozzy Osbourne, Breno resolveu homenagear o ídolo batizando (extraoficialmente) o cemitério com o nome do ex-vocalista do Black Sabbath. Agora, ele tenta tornar a homenagem oficial. Mais que um ato de reverência, ele acredita que isso poderá trazer melhorias para o espaço e talvez levá-lo a conhecer pessoalmente o Príncipe das Trevas, que faz show em BH em 18 de maio.

A admiração pelo astro começou na adolescência. No ensino médio, quando tinha seus primeiros contatos com sons mais pesados que o “sertanejo raiz” popular na região, o estudante leu a autobiografia Eu sou Ozzy. “Aquele livro mudou minha vida”, relata Breno, que, aos 14 anos, foi ao seu primeiro show, em São Paulo. O fã tem três faces do ídolo tatuadas no braço. Ao posar para a foto que ilustra esta página, na entrada do cemitério, fazendo o típico gesto da “mão chifrada”, ele ressalva: “Esse gesto faz mais referência ao Dio (Ronnie James Dio, um dos vocalistas que sucederam Ozzy no Black Sabbath, inventor do gestual associado ao heavy metal) do que ao Ozzy, mas tudo bem”.

Depois da transformação de sua vida causada pelo contato com a história de Osbourne e o heavy metal, a rotina de Breno voltou a mudar em 2016. No ano anterior, ele havia prestado concurso público para o cargo de coveiro. Empatado com outro candidato em primeiro lugar, foi preterido no edital por ser mais novo. No entanto, o servidor selecionado teve que lidar com seis mortes logo no primeiro dia de trabalho, número pouco usual para a cidade, que costuma ter dois ou três sepultamentos por mês, e acabou desistindo. Breno assumiu a função.

O recém-empossado coveiro investiu o primeiro salário na compra de passagens para o Rio de Janeiro e ingresso para o show da turnê de despedida do Black Sabbath naquele ano. Antes disso, ele já havia visto o ídolo de perto em 2011, no Mineirinho, em show solo, e em 2013, na Esplanada do Mineirão, com o Sabbath.

TRABALHO
Apesar da baixa demanda por sepultamentos, Breno percebeu que teria muito trabalho. “O coveiro anterior a esse último concurso ficou no cargo por 35 anos e nunca houve uma organização de quadras para otimizar o espaço, que hoje está quase esgotado. Além disso, não há um cômodo próprio para guardar as ferramentas. Tenho que guardar no velório, que não é lugar para isso. Vi que era um grito da comunidade reorganizar nosso cemitério.”

A primeira etapa das mudanças que ele idealizou foi dar nome ao local, que até então não tinha nenhum. “Por que não reorganizar e regulamentar o cemitério? Para que isso fosse feito, a primeira coisa que ele precisava era de um nome. Quem mais eu poderia homenagear, senão o grande Ozzy Osbourne, o cara que mudou a minha vida?”, diz o coveiro, que dá aulas de sociologia na escola estadual do município e cursa ciências sociais na Uemg de Barbacena. Para colocar o plano em curso, ele contou com a empresa que fabrica as placas de metal para as lápides.

“A fábrica de fundição sempre me procurava para saber o nome das pessoas que faleceram e as datas para produzir as lápides. Então, encomendei e comprei uma placa para o cemitério, homenageando o Ozzy”, conta Breno. A primeira placa que emprestava ao cemitério o nome do roqueiro foi roubada, mas o coveiro encomendou outras duas, uma para substituir a que desapareceu e outra que pretende entregar nas mãos do homenageado em sua próxima passagem por BH. “Gostaria muito de conhecê-lo pessoalmente e entregar essa homenagem. É um grande sonho.”

Breno já tentou um contato com o ídolo (sem sucesso) em 2013, na porta do hotel em que Ozzy se hospedou em BH. Em Cristiano Otoni, poucas pessoas conhecem Ozzy ou compreendem a natureza da homenagem que ele fez ao ídolo. “Tem gente que pensa que John Michael Osbourne é algum inglês que trabalhou antigamente na ferrovia da nossa região”, diz ele.

Embora possa parecer delicada a associação de um ídolo polêmico do rock com o cemitério interiorano, Breno não teme reações negativas e garante contar com apoio de muita gente a sua iniciativa. Reforça que o nome, por enquanto extraoficial, é apenas detalhe em um projeto maior para melhorar o espaço. “As pessoas não falam muito sobre cemitério, pois a morte é um dos maiores tabus que temos. Espero que o nome seja um impulsionador para resolver os problemas do cemitério daqui, e não a maior preocupação das pessoas”, argumenta.

 

Burocracias 

Para oficializar o batismo do cemitério, o coveiro prepara um Projeto de Lei de Iniciativa Popular a ser entregue aos vereadores. Ele recolheu 92 das 210 assinaturas necessárias para o texto entrar em tramitação. O poder público, inclusive, reconhece a demanda. “O Breno é novo na função, uma pessoa muito inteligente e está pensando em um planejamento interessante para o nosso cemitério, que é antigo e nunca teve aquele cuidado necessário. É um local que mexe com o sentimento das pessoas e requer do poder público a devida atenção”, afirma o vice-prefeito de Cristiano Otoni, Márcio Rezende (PTB). Porém, ele lembra que as questões burocráticas devem ser bem discutidas com todos os setores da sociedade antes de qualquer execução.

O presidente da Câmara, Evaldo Jesus de Souza (PT), afirma que iniciativas de melhoria têm apoio da casa, desde que devidamente discutidas. No entanto, o ousado plano de nomear o cemitério oficialmente com o nome de Ozzy pode esbarrar na Lei Orgânica do Município, que proíbe tal prática com pessoas ainda vivas, conforme explicou nota oficial da Câmara divulgada na quinta-feira.

Pelo mesmo motivo, a casa solicitou que o coveiro retirasse a placa do local, ainda que ela não fique exposta permanentemente, por conta do primeiro roubo. Breno não se preocupa: “O batismo simbólico está feito, assim como a homenagem de alguém que ama o metal e é grande fã do Ozzy. É isso que importa”, garante.


DESPEDIDA EM BH

Aos 69 anos, o inglês Ozzy Osbourne anunciou que fará sua última turnê mundial. O giro, que começa com dois shows nos EUA em abril, virá a BH depois de passar por México, Chile, Argentina, São Paulo e Curitiba.  Apelidado de Príncipe das Trevas, “o pai do heavy metal” é idolatrado pelo visual inconfundível – unhas pintadas, sombra nos olhos e cabelos compridos –, além da surpreendente resistência aos abusos de álcool e drogas, dos quais garante estar longe atualmente, além de bizarrices como a mordida na cabeça de um morcego durante um show em 1982.

OZZY OSBOURNE – NO MORE TOURS 2

Sexta-feira, 18 de maio, às 21h, na Esplanada do Mineirão.Ingressos: Pista premium – R$ 600 (inteira) e R$ 300 (meia). Pista em pé – R$ 300 (inteira) e R$ 150 (meia). À venda no site www.ticketsforfun.com.br e na bilheteria do KM de Vantagens Hall (Av. Senhora do Carmo, 230 , Savassi). Mais informações: (31) 4003-5588.

MAIS SOBRE MUSICA