Quando o músico Leo Moraes decidiu abrir sua própria casa de shows em BH, a ideia era um lugar com estrutura acústica diferenciada, totalmente voltado para artistas autorais. Três anos depois da inauguração, A Autêntica vem cumprindo seu objetivo, na visão de seus proprietários. No entanto, é preciso criatividade e força de vontade para manter a agenda cheia, diante de um cenário em que uma banda no palco tocando suas próprias canções se tornou menos atraente para o público do que um DJ ‘dando play’ em hits do passado. Para manter o ritmo de suas propostas, casas tradicionais da cena independente e autoral de BH são obrigadas a dançar conforme a música para seguir em frente.
Com mais de mil shows nos três anos de atividades celebrados no último fim de semana, A Autêntica, localizada na Savassi, já recebeu artistas locais, nacionais e internacionais, dentro de vários estilos da música alternativa. O critério, como sugere o nome do estabelecimento, é tocar músicas próprias. No entanto, a boa vontade com artistas iniciantes e menos conhecidos do público não é o suficiente para manter as contas em dia. Com um custo operacional extra em torno de R$ 1,5 mil para cada evento, o retorno de bilheteria é fundamental para equilibrar as contas da casa, que ainda tem outras despesas mensais fixas.
“Nosso público depende muito do artista. Quando trazemos alguém de fora, por exemplo, o custo aumenta e é preciso vender ainda mais ingressos para ficar no zero a zero. Se trabalhasse com cover ou balada, o público seria mais frequente, com custos menores e previsibilidade maior. Mas não abrimos A Autêntica para ser uma balada, temos motivações além de dinheiro”, explica Leo, um dos proprietários do espaço. Segundo ele, depois de três anos houve muito aprendizado e o resultado é “uma programação mais cautelosa, sem abrir mão da autenticidade”.
Mesmo assim, acostumado a expor os custos e detalhes operacionais do estabelecimento no Facebook, ele ressalta a importância da organização financeira. “Procuramos sempre debater com público e artistas, explicamos muita coisa e justificamos por que não fazemos certas negociações. Nos eventos que realizamos, é preciso garantir o mínimo de bilheteria para não dar prejuízo. Muita gente alega que lucramos com o bar, mas na época em que trabalhávamos com cartela, era comum ter 50, 60 cartelas em branco na noite. A pessoa entra, vê o show, não consome nada e sai, por isso não conseguimos repassar mais às bandas”, explica o proprietário.
Quem está há mais tempo no mercado já se adequou ao interesse do público para seguir na ativa. É o caso d’A Obra, também na Savassi, inaugurada em 1997. Referência na cena do rock independente local, há alguns anos o espaço reserva as quartas e quintas para shows, enquanto a sexta e o sábado são de “baladas”. No passado, o funcionamento era de terça a domingo, ainda assim, a diminuição não assusta. “BH sempre teve picos e vales em relação à quantidade e qualidade de banda. Hoje, estamos no meio-termo. Tem muita banda boa, mas tem dia que nem abrimos por falta de gente querendo tocar”, argumenta Cláudio Rocha, o Claudão, um dos fundadores da casa.
Quando é responsável pela produção dos eventos, A Obra divide a bilheteria da noite com o artista. “Não pagamos cachê, porque não temos garantia de público, por isso dividimos isso com a banda, e oferecemos técnico e equipamento de som.” A capacidade do espaço é para 200 pessoas e o valor do ingresso nos dias de show costuma ser de R$ 15. A metade do preço cobrado nos dias em que há só DJ. Claudão lembra ainda que a responsabilidade de encher a casa deve ser dividida com os artistas: “Uma dica para as bandas é que a casa é parte de uma cadeia que envolve imprensa, produção e banda, todo mundo tem que fazer a cena funcionar”. Ele pondera ainda que hoje há uma concorrência de interesses aos shows. “Hoje, o pessoal pode ficar em casa e escutar música no Spotify tomando cerveja, é mais barato, tem a crise, tem a Netflix, que possibilita ver uma série toda de uma vez. Então, o público não tem tanto interesse pela música autoral como gerações anteriores tinham”, afirma.
Estabelecido abaixo do Edifício JK desde 2000, a Matriz Casa Cultural é outro símbolo da música independente e autoral na capital. Se no passado o local abrigava com frequência festivais com sete ou oito bandas locais no fim de semana, a retração da oferta musical alterou a dinâmica dos eventos. “Houve uma diminuição da cena, falta de interesse do pessoal mais novo em criar banda. Esse ciclo tem que permanecer, mas parece que parte do pessoal envelheceu e, hoje, prefere ficar em casa. Observamos isso não só no rock, mas até em alguns outros estilos com que trabalhamos aqui”, argumenta Edmundo Corrêa, que fundou a casa ao lado da esposa, Andrea Diniz.
Ele lembra que a crise no setor não é particularidade de BH, citando o recente fechamento do Hangar 110, em São Paulo, uma das principais casas do rock alternativo e independente do país. Para seguir na ativa, a Matriz tenta diversificar a agenda, intercalando festas temáticas, sem bandas, com os shows. “Essas festas existem desde a abertura da casa, temos festa de anos 1980, festas LGBT, de soul e rap. São projetos que estão desde o início, mas eram uma fatia pequena da programação e, hoje, têm pegado uma fatia maior. Isso se deve ao interesse do público. Sempre queremos colocar banda autoral para manter nossa autenticidade, mas é um desafio, a dificuldade é grande. Mesmo na música eletrônica autoral o interesse é menor. Aí temos ampliado a programação, mas sempre mantendo o espírito underground da casa”, explica Edmundo.
No Studio Bar, também no Centro de BH, a situação não é diferente. “Quando vem artista de fora o interesse é bem maior, as bandas daqui são menos valorizadas, é um mercado difícil de mexer. Muita gente quer tocar, mas poucas têm capacidade para atrair público. E aí não dá para fazer porque rola prejuízo”, explica Bruno Calil, sócio-proprietário da casa, que tem capacidade para cerca de 700 pessoas e precisa de pelo menos 150 pessoas, em média, para zerar os custos operacionais da noite. A casa alterna a programação entre eventos com artistas autorias, shows cover e festa só com DJs, que, além de mais procuradas, também têm um custo de produção menor.
Diante das adversidades, as casas se movimentam para melhorar o cenário. “Entre as casas há uma união bem legal, estamos tendo boas conversas com a prefeitura. Cumprimos uma função na cidade que não é ser só uma balada ou casa noturna, temos um compromisso com a cultura da cidade, de abrir espaço para artistas novos. Na hora de exigir meia-entrada, somos espaço cultural; na hora de pagar imposto, aí somos boate, não deveria ser assim. Mas temos visto uma boa vontade para ajudar e temos esperança de que isso vai se flexibilizar e de que sejam criados editais para a realização de mais shows”, revela Leo Moraes, d’A Autêntica.
Programação da semana
>> A Autêntica
(Rua Alagoas, 1.172, Savassi, (31) 3654-9251)
l Quinta-feira (15) – Show Paisagem lunar
em tributo a Cláudio Faria (vários músicos) R$ 20, com direito a CD
l Sexta-feira (16) – Shows de Henrique da Matta, Radiotape e Qairo R$ 20 e R$ 25
l Sábado (17) – Shows de Nina Becker e Maíra Baldaia R$ 20 e R$ 30
>> A Obra
(Rua Rio Grande do Norte, 1.168, Savassi, (31) 3261-9431)
l Quarta-feira (14) – Show de Marc OZ R$ 10
l Quinta-feira (15) – Shows de Grupo Porco de Grindcore Interpretativo e Ian Carvalho Project R$ 15
l Sexta-feira (16) – Festa 100% compactos (vários Djs – soul, funk, rock, disco, hip-hop e rare grooves) R$ 30
>> Matriz
(Rua Guajajaras, 1.353, Barro Preto, (31) 3212-6122)
l Sexta-feira (16) – Power night (DJ Ricardo Lima – freestyle, miami, flash house e mais) R$ 10
l Sábado (17) – Despedida de solteiros (DJs, discotecagem pop variada) R$ 15 e R$ 20
l Domingo (18) – Sinergia (shows de Lavrados, Esquina 4 e Wagner Almeida) R$ 15
>> Studio Bar
l Fechado para reforma
Com mais de mil shows nos três anos de atividades celebrados no último fim de semana, A Autêntica, localizada na Savassi, já recebeu artistas locais, nacionais e internacionais, dentro de vários estilos da música alternativa. O critério, como sugere o nome do estabelecimento, é tocar músicas próprias. No entanto, a boa vontade com artistas iniciantes e menos conhecidos do público não é o suficiente para manter as contas em dia. Com um custo operacional extra em torno de R$ 1,5 mil para cada evento, o retorno de bilheteria é fundamental para equilibrar as contas da casa, que ainda tem outras despesas mensais fixas.
“Nosso público depende muito do artista. Quando trazemos alguém de fora, por exemplo, o custo aumenta e é preciso vender ainda mais ingressos para ficar no zero a zero. Se trabalhasse com cover ou balada, o público seria mais frequente, com custos menores e previsibilidade maior. Mas não abrimos A Autêntica para ser uma balada, temos motivações além de dinheiro”, explica Leo, um dos proprietários do espaço. Segundo ele, depois de três anos houve muito aprendizado e o resultado é “uma programação mais cautelosa, sem abrir mão da autenticidade”.
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Quem está há mais tempo no mercado já se adequou ao interesse do público para seguir na ativa. É o caso d’A Obra, também na Savassi, inaugurada em 1997. Referência na cena do rock independente local, há alguns anos o espaço reserva as quartas e quintas para shows, enquanto a sexta e o sábado são de “baladas”. No passado, o funcionamento era de terça a domingo, ainda assim, a diminuição não assusta. “BH sempre teve picos e vales em relação à quantidade e qualidade de banda. Hoje, estamos no meio-termo. Tem muita banda boa, mas tem dia que nem abrimos por falta de gente querendo tocar”, argumenta Cláudio Rocha, o Claudão, um dos fundadores da casa.
Quando é responsável pela produção dos eventos, A Obra divide a bilheteria da noite com o artista. “Não pagamos cachê, porque não temos garantia de público, por isso dividimos isso com a banda, e oferecemos técnico e equipamento de som.” A capacidade do espaço é para 200 pessoas e o valor do ingresso nos dias de show costuma ser de R$ 15. A metade do preço cobrado nos dias em que há só DJ. Claudão lembra ainda que a responsabilidade de encher a casa deve ser dividida com os artistas: “Uma dica para as bandas é que a casa é parte de uma cadeia que envolve imprensa, produção e banda, todo mundo tem que fazer a cena funcionar”. Ele pondera ainda que hoje há uma concorrência de interesses aos shows. “Hoje, o pessoal pode ficar em casa e escutar música no Spotify tomando cerveja, é mais barato, tem a crise, tem a Netflix, que possibilita ver uma série toda de uma vez. Então, o público não tem tanto interesse pela música autoral como gerações anteriores tinham”, afirma.
Estabelecido abaixo do Edifício JK desde 2000, a Matriz Casa Cultural é outro símbolo da música independente e autoral na capital. Se no passado o local abrigava com frequência festivais com sete ou oito bandas locais no fim de semana, a retração da oferta musical alterou a dinâmica dos eventos. “Houve uma diminuição da cena, falta de interesse do pessoal mais novo em criar banda. Esse ciclo tem que permanecer, mas parece que parte do pessoal envelheceu e, hoje, prefere ficar em casa. Observamos isso não só no rock, mas até em alguns outros estilos com que trabalhamos aqui”, argumenta Edmundo Corrêa, que fundou a casa ao lado da esposa, Andrea Diniz.
Ele lembra que a crise no setor não é particularidade de BH, citando o recente fechamento do Hangar 110, em São Paulo, uma das principais casas do rock alternativo e independente do país. Para seguir na ativa, a Matriz tenta diversificar a agenda, intercalando festas temáticas, sem bandas, com os shows. “Essas festas existem desde a abertura da casa, temos festa de anos 1980, festas LGBT, de soul e rap. São projetos que estão desde o início, mas eram uma fatia pequena da programação e, hoje, têm pegado uma fatia maior. Isso se deve ao interesse do público. Sempre queremos colocar banda autoral para manter nossa autenticidade, mas é um desafio, a dificuldade é grande. Mesmo na música eletrônica autoral o interesse é menor. Aí temos ampliado a programação, mas sempre mantendo o espírito underground da casa”, explica Edmundo.
No Studio Bar, também no Centro de BH, a situação não é diferente. “Quando vem artista de fora o interesse é bem maior, as bandas daqui são menos valorizadas, é um mercado difícil de mexer. Muita gente quer tocar, mas poucas têm capacidade para atrair público. E aí não dá para fazer porque rola prejuízo”, explica Bruno Calil, sócio-proprietário da casa, que tem capacidade para cerca de 700 pessoas e precisa de pelo menos 150 pessoas, em média, para zerar os custos operacionais da noite. A casa alterna a programação entre eventos com artistas autorias, shows cover e festa só com DJs, que, além de mais procuradas, também têm um custo de produção menor.
Diante das adversidades, as casas se movimentam para melhorar o cenário. “Entre as casas há uma união bem legal, estamos tendo boas conversas com a prefeitura. Cumprimos uma função na cidade que não é ser só uma balada ou casa noturna, temos um compromisso com a cultura da cidade, de abrir espaço para artistas novos. Na hora de exigir meia-entrada, somos espaço cultural; na hora de pagar imposto, aí somos boate, não deveria ser assim. Mas temos visto uma boa vontade para ajudar e temos esperança de que isso vai se flexibilizar e de que sejam criados editais para a realização de mais shows”, revela Leo Moraes, d’A Autêntica.
Programação da semana
>> A Autêntica
(Rua Alagoas, 1.172, Savassi, (31) 3654-9251)
l Quinta-feira (15) – Show Paisagem lunar
em tributo a Cláudio Faria (vários músicos) R$ 20, com direito a CD
l Sexta-feira (16) – Shows de Henrique da Matta, Radiotape e Qairo R$ 20 e R$ 25
l Sábado (17) – Shows de Nina Becker e Maíra Baldaia R$ 20 e R$ 30
>> A Obra
(Rua Rio Grande do Norte, 1.168, Savassi, (31) 3261-9431)
l Quarta-feira (14) – Show de Marc OZ R$ 10
l Quinta-feira (15) – Shows de Grupo Porco de Grindcore Interpretativo e Ian Carvalho Project R$ 15
l Sexta-feira (16) – Festa 100% compactos (vários Djs – soul, funk, rock, disco, hip-hop e rare grooves) R$ 30
>> Matriz
(Rua Guajajaras, 1.353, Barro Preto, (31) 3212-6122)
l Sexta-feira (16) – Power night (DJ Ricardo Lima – freestyle, miami, flash house e mais) R$ 10
l Sábado (17) – Despedida de solteiros (DJs, discotecagem pop variada) R$ 15 e R$ 20
l Domingo (18) – Sinergia (shows de Lavrados, Esquina 4 e Wagner Almeida) R$ 15
>> Studio Bar
l Fechado para reforma