Flávio Henrique compôs hit 'Na coxinha da madrasta'; relembre a carreira musical

Um dos principais nomes da música de Minas, Flávio Henrique se dedicou ao quarteto Cobra Coral e foi parceiro de grandes músicos brasileiros, sem perder a irreverência, traço das marchinhas que compôs

por Márcia Maria Cruz 18/01/2018 11:00
Era 11 de agosto de 2017, quando o Cobra Coral subiu ao palco do Teatro Bradesco para apresentar o último show do quarteto. O clima era de festa. Os músicos Flávio Henrique, Kadu Vianna, Mariana Nunes e Pedro Morais faziam algo que trazia a Flávio muita alegria: interpretar Caetano Veloso - o tropicalista era inspiração para o grupo. Naquela noite, não faltaram as brincadeiras de Flávio. Os ingressos para as duas apresentações se esgotaram rapidamente. Como o réptil exaltado por Caetano, o quarteto se apresentava "com langor e elegância". Flávio Henrique morreu, em decorrência de complicações da febre amarela, nesta quinta-feira (18/01).

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Ele foi figura de destaque no 'reflorescimento' do carnaval em Belo Horizonte. Na véspera da folia de 2012, compôs a marchinha 'Na coxinha da madrasta', uma crítica ao vereador Léo Burguês, que havia sido denunciado pelo Ministério Público por gastos exorbitantes na compra de coxinhas, produzidas no buffet da madrasta do vereador. "Milhares de reais por mês pro lanchinho do Burguês, o nosso dinheiro ele gasta na coxinha da madrasta. Tira mão, tira mão é hora de dar um basta..." dizia a marchinha  que venceu o concurso do Baile da Banda Mole.
 
Leandro Couri/EM/DA PRESS
Flavio Henrique e Juliana Perdigão lançaram a marchinha 'A coxinha da madrasta' em 2012 (foto: Leandro Couri/EM/DA PRESS)

Flávio era presidente da Empresa Mineira de Comunicação, à qual estão vinculadas a Rede Minas de Televisão e a Rádio Inconfidência. O músico estava em seu segundo casamento e deixa uma filha de 13 anos.

O Cobra Coral
De maneira descontraída, sempre fazendo piada até de algum problema técnico no palco, o músico mineiro era conhecido pelo bom-humor. “Uma das características dele era a alegria. Se divertia, contava piada no palco. O humor nos shows vinha do Flávio. Se a corda do violão arrebentava, não virava problema”, diz a produtora do quarteto Cobra Coral, Clarisse Salles.

O grupo apresentava o formato acústico de quatro vozes, dois violões e piano. As composições próprias e as de outros compositores trazidas para o repertório eram cuidadosamente arranjadas por Flávio. “Ele não se considerava grande cantor. Costumava convidar as pessoas para gravar suas músicas. Foi quando teve a ideia de fazer um grupo vocal e convidou as pessoas que estão até hoje. Formamos uma grande família”, afirma a produtora.

Em oito anos, o Cobra Coral gravou dois álbuns: o homônimo, Cobra Coral (2012), com 12 faixas e o Para Cada um ser o que é (2015), com 10 faixas. A edição de maio do projeto Sinfônica Pop, da Fundação Clóvis Salgado, seria com a banda - ainda não há informações sobre a confirmação da agenda.
 
O quarteto se apresentou com Milton Nascimento e Ed Motta, Boca Livre, Toninho Horta, Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, Túlio Mourão e Wagner Tiso.

Parcerias
Com 35 anos de carreira, Flávio Henrique gravou mais de 120 músicas. Algumas em parceria com Chico Amaral, Fernando Brant, Zeca Baleiro, Vander Lee, Murilo Antunes e Toninho Horta. Flávio também dividiu os palcos com artistas como Ed Motta, Maria Rita, Sylvia Klein, Marina Machado, Regina Spósito, Chico Amaral, Nelson Ângelo e Amaranto.

Mesmo não se considerando integrante do Clube da Esquina, Flávio se aproximavam da musicalidade do movimento.

“O Murilo Antunes foi do Clube da Esquina, e foi o meu primeiro parceiro. Ele começou a fazer música comigo, foi um cara muito generoso, que estreitou muito a minha relação com o Clube e fez questão de me aproximar do Márcio Borges. Ele me aproximou do Fernando Brant, do Tavinho Moura, do Flavio Venturini, principalmente do Marcinho e do Ronaldo Bastos”, disse em entrevista ao site do Museu do Clube da Esquina.

O começo
Nascido em Belo Horizonte, Flávio, encantou-se pela música na adolescência, por influências da mãe, Delza Cecília Alves de Oliveira, professora de música e integrante de um coral.

Aos 12 anos foi presenteado por sua mãe com um CD de Toninho Horta.  “Era diferente. E eu gostei da música dentro dele, músicas difíceis, complexas,” disse Flávio também em depoimento ao Museu do Clube da Esquina.

Aos 14 anos,  Flávio ganhou de presente  um piano, um violão e um cavaquinho. “Sou autodidata, com um ano que os instrumentos estavam na minha casa, acho que eu já tocava todos, tocava um pouco de piano, de cavaquinho, de violão. Isso com uns 14 anos mais ou menos. E foi uma coisa forte mesmo na minha vida, foi até difícil eu terminar aquele curso da escola normal, tive até certa dificuldade porque desde essa época eu tinha um interesse pela música, ele era maior do que tudo,” contou.

Aos 16 anos, criou o Grupo Candeia junto a Robertinho Brant, seu colega de colégio, sobrinho de Fernando Brant.  “A gente se atreveu a tocar em festivais e montamos uma banda. Isso foi uma coisa muito importante de fato, porque eu já tinha vindo da experiência desse disco do Toninho Horta, gostava da coisa, e o Robertinho era um cara que na casa dele tinha tudo. O pai dele, o Roberto, tinha uma discoteca maravilhosa, tinha todos os discos do Lô Borges, todos os discos do Beto Guedes assinados, autografados, Milton Nascimento nem se fala,” relembrou. 

Influências
As características do Clube da Esquina afloraram nas composições de Flávio “A maior importância do Clube da Esquina é essa questão da identidade musical com Belo Horizonte. É uma coisa muito forte, a gente chega num concurso desses e se uma pessoa nunca me viu e me vê passando som, o cara imediatamente fala: ‘Aquele cara é mineiro’. Pelo meu violão, pela sequência de acordes que eu faço, as pessoas já me identificam rapidamente. Porque eu acho que são várias as influências, o violão, o jeito de harmonizar que partiu do Milton Nascimento, do Toninho Horta, do Wagner Tiso.” 

Prêmios
Venceu por quatro vezes consecutivas o prêmio de “melhor trilha sonora” do Festival de Cinema Universitário da Universidade Católica (1988 – 1989 – 1990 – 1991). Flávio também foi o vencedor do primeiro Prêmio BDMG Instrumental (2001) com quatro arranjos para quarteto de saxofone para o grupo Monte Pascoal. Representou o Brasil nas “Romerias de Mayo” festival de arte latinoamericana realizado em Holguin – Cuba (1998) em cinco concertos ao lado de Marina Machado.

(Colaborou Simon Nascimento)

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