Houve um tempo em que a apresentação de orquestras era um rito cerimonioso, cumprido por espectadores em trajes de gala e músicos sérios, que não prescindiam de suas casacas engomadas. Tamanha formalidade já desapareceu, mas explica por que, ainda hoje, adjetivos como descontraído ou irreverente costumam ser usados para descrever bandas de rock, mas não conjuntos dedicados à música clássica. Porém, o despojamento é justamente uma das características da Orquestra de Câmara Salzburg Chamber Soloists, que se apresenta neste sábado (7) em BH.
O grupo vem da Áustria, terra do gênio Mozart. Os integrantes acumulam anos de estudos em conservatórios e adotam rígida disciplina de ensaios. No entanto, a orquestra cultiva o espírito da juventude. Músicos posam para fotos de forma irreverente, sorridentes, com os instrumentos para o alto, pulando e até deitados no chão. Esse clima, diz o maestro Lavard Skou-Larsen, transborda para o palco.
Lavard, de 54 anos, gaúcho de Porto Alegre, é fundador e diretor artístico da orquestra, surgida em 1991, cuja sede fica em Salzburgo. O toque latino do regente seria responsável pela extroversão do grupo?
Não é o que ele diz. “Bom, somos uma banda com 16 pessoas de todas as partes do mundo. O mais velho sou eu. A faixa etária vai de 19 a 27 anos. Então, o fato de sermos um grupo majoritariamente jovem possivelmente contribui para que não sejamos sisudos e sérios. Mas essa particularidade tem a ver com a relação dos jovens com a música clássica na Europa, totalmente diferente do Brasil. Para os brasileiros, o que fazemos é música erudita. Na cultura europeia, não tem essa separação entre erudito e popular. Tudo o que é música boa eles ouvem e tocam. Lá, o pessoal jovem, de 20, 30 anos, vê os clássicos como algo da cultura deles”, explica o gaúcho.
DIÁLOGO O repertório da turnê prioriza composições dos franceses Ernest Chausson e Maurice Ravel. Peças de Antônio Vivaldi, Astor Piazzolla, Mendessohn e Mozart também estão no programa. A proposta é de que os instrumentistas dialoguem entre si, como se fossem solistas.
“No programa que vamos apresentar em BH, sou o spalla (nome dado ao primeiro violino, responsável pela afinação do grupo). Fico no primeiro assento – e não na frente dos músicos. Evidentemente, durante os ensaios, desenvolvo o trabalho de direção. Mas, no geral, raramente chego a reger a orquestra. A nossa organização tem estrutura um pouco mais horizontal. Todos são muito bons, comprometidos, conhecem muito bem as obras que tocam. Não preciso ficar falando nada. Então, a gente faz mais um diálogo musical bem inspirado, muito vivo. Um toca aqui, o outro responde ali, e assim vai”, explica Lavard.
GAROTO PRODÍGIO Filho de dinamarquês e brasileira, o maestro foi morar na Áustria aos 4 anos. As aulas de violino começaram aos 5. Antes do 30, ele já atuava como solista. O contato com o Brasil, onde mora sua mãe, é frequente. Lavard vem ao país pelo menos duas vezes por ano para visitar a família e para trabalhar com outras orquestras. Diz acompanhar com atenção o noticiário sobre o país natal.
Bem acolhido na Áustria, onde passou a maior parte da vida, Lavard não planeja voltar definitivamente para o país. “Nasci aí no Brasil e faço o maior esforço levar tudo o que aprendi na Europa para o país. Mas as coisas aí, às vezes, não são muito sérias, né? Há dois anos, estive no Rio de Janeiro para reger uma famosa orquestra. Até hoje não me pagaram. Vivo disso, não posso usar dinheiro do meu bolso para trabalhar. Gosto muito do Brasil, mas sei que minha vida aí, certamente, seria bem difícil”, conclui.
ORQUESTRA DE CÂMARA SALZBURG CHAMBER SOLOISTS
Sábado (4), às 21h. Teatro Bradesco. Rua da Bahia, 2.244, Lourdes. Inteira: R$ 140 e R$ 100. Meia-entrada: R$ 70 e R$ 50. Informações: (31) 3516-1360.