À frente da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, o maestro Sílvio Viegas é taxativo ao defender a necessidade de rever a visão equivocada que associa música clássica a ouvintes de maior poder aquisitivo. “As pessoas que fazem com que ela sobreviva vêm de ambientes muito pobres”, diz, referindo-se a integrantes de orquestras brasileiras.
A etiqueta exige atenção aos instrumentistas, silêncio e aplausos só no final do concerto. Correto? Nem sempre. Em alguns deles, quebrar o protocolo é parte do espetáculo. É isso que a Orquestra Multiplayer vai fazer nesta terça-feira (26) à noite, no Teatro Bradesco. No concerto, que reúne trilhas de cinema, a plateia é convocada a interagir com os músicos e até a subir ao palco.
Na terça e na quarta-feira (26 e 27), a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais se apresentará com o Coral Lírico no Palácio das Artes. Hoje, gratuitamente; amanhã, com ingressos a preços populares.
No campo erudito, o maestro Sílvio Viegas diz que certos repertórios são mais atrativos. A Nona sinfonia, de Beethoven, Tchaikovsky e Ruggero Pagliacci costumam ter casa cheia. Hoje e amanhã, por exemplo, o programa terá peças de Tchaikovsky, um dos mais expressivos compositores do período romântico: O lago dos cisnes, coros da ópera Eugene Onegin e Abertura 1812. A execução dessa última terá a participação da Orquestra Sinfônica da Polícia Militar de Minas Gerais.
Os concertos gratuitos de meio-dia têm atraído cerca de 930 pessoas a cada sessão. De fevereiro a agosto deste ano, 6.506 pessoas foram ao Palácio das Artes assisti-los.
TELONA A Multiplayer aposta na música que encanta os cinéfilos. Serão 16 peças no repertório desta noite, no Teatro Bradesco. O maestro Waltson Tanaka não revela os filmes, mas garante: a plateia se emociona a cada trecho que reconhece. “São filmes que marcaram a história do cinema. É difícil descrever a exaltação do público. Quando as pessoas começam a reconhecer as músicas, há muitos aplausos e até gritos. Em outros momentos, há um silêncio absoluto”, diz.
Parte do repertório vem de três importantes compositores de trilhas de cinema: Ennio Morricone, John Williams e Danny Elfman. Morricone compôs para Django livre (2012), do diretor Quentin Tarantino; Cinema Paradiso (1988), de Giuseppe Tornatore; e vários faroestes – entre eles, Três homens em conflito (1966). Williams é autor das trilhas de ET – O extraterrestre (1982), Jurassic Park: Parque dos Dinossauros (1993) e da saga Star Wars, que fascina o mundo desde 1977.
“Procuramos quebrar a barreira que coloca a orquestra de um lado e o público do outro. Propomos a interação direta”, adianta Waltson Tanaka. A ideia é também atrair os jovens. “Cerca de 80% do nosso público tem de 24 a 34 anos, curte a cultura nerd e assiste a muitos filmes”, conta o regente.
No momento destinado à interação, a plateia é convidada a escolher um entre dois instrumentistas que participam de um duelo de improviso depois de executar o tema informado na hora. Em outro desafio, o público deve adivinhar qual é a música executada a partir de apenas alguns acordes.
JOVEM GERAIS
O esforço para popularizar a Orquestra Jovem Gerais, ONG criada pelos músicos Renato Almeida e Rosiane Reis, fez com que 250 mil espectadores assistissem a 400 apresentações em 20 anos. O projeto começa pela formação dos alunos, moradores de áreas em situação de vulnerabilidade social da Região Metropolitana de BH. De 5 a 15 de outubro, o grupo, com 32 alunos, vai tocar na Argentina, Uruguai e Chile. Em comemoração à sua 15ª turnê internacional, a orquestra faz concerto na quarta-feira (27/9), às 19h30, no Teatro Sesi de Contagem, com entrada franca.
LUZES, CÂMERA, MULTIPLAYER
Terça-feira (26/9), às 20h30. Teatro Bradesco.
SINFÔNICA E LÍRICO AO MEIO-DIA
Terça-feira (26/9), às 12h. Peças de Tchaikovsky. Grande Teatro do Palácio das Artes. Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro. Entrada franca. Quarta-feira (27/9), às 20h30. R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada).
Três perguntas para Sílvio Viegas
Concertos ao meio-dia e preço mais em conta têm contribuído para popularizar a música clássica em BH?
Com toda certeza. Sempre às terças-feiras, o projeto Sinfônica ao Meio-dia é um dos mais exitosos que temos. Podemos constatar isso porque o público é cada vez maior. Conversamos com a plateia, convidamos as pessoas para se sentarem no palco. Quatro ou cinco assistem dentro da orquestra. Ficam tocadas e emocionadas ali, ao lado do artista que executa a obra. Veem o maestro de frente, têm outra perspectiva sonora e visual. Muita gente leva até cartaz pedindo para subir ao palco. O sucesso do Sinfônica ao Meio-dia tem atraído público para quarta-feira à noite. Ainda não é o que a gente deseja, não é tão bom quanto o de meio-dia. E não é questão do preço, pois o valor é ínfimo. Estamos fazendo pesquisa para saber como atrair as pessoas para a quarta-feira.
Sinfônica Pop traz nomes da MPB para se apresentarem com a orquestra. Essa diversificação amplia o público?
Os resultados têm sido muito positivos. São arranjos para orquestra muito bem escritos, artistas bem selecionados. Os concertos no Parque Municipal Renné Giannetti recebem de 3 mil a 4 mil pessoas. É fundamental esse tipo de iniciativa. A nossa função é difundir música erudita, sinfônica e ópera. Música clássica não é chata. Pelo contrário, é muito interessante. Dizer que ela é elitista é um grande erro. A elite não está ouvindo música clássica, ouve funk e pagode. Quem faz música clássica no Brasil são pessoas que vêm de camadas sociais mais baixas. As pessoas que fazem com que a música clássica sobreviva vêm de ambientes muito pobres. O maestro Carlos Prazeres propôs a ‘deschatização’ da música clássica e foi muito criticado, mas entendi o que ele quis dizer. Temos que aproximar as pessoas desse universo fantástico que é a música.
O que pode ser flexibilizado na liturgia dos concertos para torná-los menos formais?
Em concertos de gala, à noite, temos que seguir a liturgia e a tradição de aplaudir ao final. Fazer silêncio é o ideal para a concentração do público. A partir do momento em que as pessoas desenvolvem o gosto, sentem necessidade de fazer silêncio e compreendem que a concentração é inerente ao nosso trabalho. Liturgia bem-vinda, desde que não seja para ceifar a fruição, a apreciação musical. Nesse sentido, gosto muito da ópera, pois as pessoas podem aplaudir a qualquer hora. A liturgia foi criada com o tempo. Temos um relato de que Mozart compôs uma passagem virtuosíssima de concerto para piano porque sabia – e esperava – que o público aplaudiria. Temos projetos mais abertos, em que as pessoas podem filmar, fotografar e interagir.