Paul McCartney chegou em junho aos 75 anos. Mas o maior artista vivo da música mundial não se acomoda frente a qualquer título. Somente em 2017, ele foi visto no cinema (numa pequena participação na franquia Piratas do Caribe), fez parcerias com grandes nomes da música pop (se aventurou até nas baquetas com o Foo Fighters) e iniciou a produção de um novo álbum.
E, incansavelmente como há décadas, continua protagonizando uma turnê mundial. One on one, que chega ao Brasil em outubro, onde percorrerá quatro cidades. Belo Horizonte, que assistiu, em maio de 2013, à estreia da turnê Out there!, vai recebê-lo, no dia 17, no Mineirão.
Serão 39 canções em três horas de apresentação. Antes de chegar ao país (a estreia será em Porto Alegre, no dia 13), ele ainda tem estrada pela frente. São cinco datas para encerrar a parte norte-americana da turnê. Paul McCartney conversou com o Estado de Minas na tarde de quinta-feira, por telefone, de Nova York, após a passagem de som no Barclays Center, arena no Brooklyn.
O peso da idade, da carreira, de ser Paul McCartney, nada o faz parar. Não pensa no que está por vir.
“O futuro? É igual para você e para mim. Futuro, para mim, é amanhã”, diz, na entrevista a seguir.
Essa será sua segunda vez em Belo Horizonte. Muitas pessoas da plateia já terão visto seu show ao menos uma vez. Outras o terão visto muito mais vezes. Como contentar um fã que já viu vários shows e aquele que o vê pela primeira vez?
Enquanto as pessoas quiserem ir ao show, seja o que for, uma, duas, ou 100 vezes, o que queremos é promover uma ótima noite. Isso é tudo. O que queremos é fazer um grande show, tocar boa música, para nós e para o público.
Desta vez, 70% do repertório vem dos Beatles. Entre as canções, foram incluídas A hard day’s night e Love me do, que você só havia tocado ao vivo com os Beatles. E há ainda uma do Quarrymen (In spite of all the danger). Quais são os critérios para selecionar canções que não costumam fazer parte de suas turnês?
Escolhemos canções de que gostamos. Olhamos para todas as músicas que já gravei e vemos quais poderão funcionar tanto para nós quanto para o público. Às vezes, reunimos algumas que tocamos antes e outras que nunca foram vistas ao vivo. O único critério é realmente escolher canções que queremos tocar. Tem sempre alguém me lembrando de canções antigas.
O repertório traz ainda Four five seconds, que você gravou com Rihanna e Kanye West (também produtor da faixa). Como foi a gravação dessa canção?
A maneira com que Kanye trabalha é interessante. Ele grava muito e você fica sem saber o que ele vai realmente usar. Se vou trabalhar com ele, vou fazer exatamente da maneira que ele gosta. Se sair alguma coisa boa, ótimo. Se não, é só não contar para ninguém que trabalhamos juntos. Então fizemos as gravações até que, ao final, ele convidou Rihanna para cantar. Quando me mandou o material pronto, foi uma surpresa e tanto. Para mim, foi uma maneira pouco usual de trabalhar. Normalmente eu me envolvo com a canção inteira. Mas nesta o que fiz basicamente foi inspirá-lo com a minha guitarra.
Recentemente, você gravou bateria com o Foo Fighters (na canção Sunday rain, do álbum Concrete and gold, lançado semana passada). Como foi essa experiência, ainda mais numa banda que tem dois bateristas?
Muito boa. Quando me chamaram, achei a ideia louca. No Foo Fighters você tem Dave Grohl e Taylor Hawkins. Não entendi porque eles precisavam de mim. Mas veio o convite, era para tocar numa música que o Taylor iria cantar, conheço Dave já há muitos anos, fizemos coisas juntos, então eu fui. Quando cheguei, me passaram a ideia que queriam e gravamos ao vivo.
Ainda falando sobre gravação, em que pé está seu próximo álbum?
Já gravei um bom número de músicas, mas ainda não sei quais poderão entrar no álbum. Algumas eu realmente gostei. Estou ainda no meio do projeto, então não há muito o que falar, porque realmente não sei muito como ele será.
Em junho foi lançada no Brasil a biografia Paul McCartney (Cia das Letras, 824 páginas), escrita por Philip Norman (um dos maiores biógrafos dos Beatles, autor de Shout!, sobre a banda, e A vida, sobre John Lennon, que já teve um entrevero com o músico no passado). Você leu? Aliás, costuma ler o que se escreve a seu respeito?
Não, não li. Mas um amigo leu e me disse que gostou. O que acontece é que posso ler 100 páginas de uma biografia e gostar, mas aí posso chegar a uma página e ver que há um erro, que aquilo não é verdade. Leio muito pouco sobre mim mesmo, de verdade. Leio algumas resenhas dos shows, e estou com sorte, elas estão positivas. Sabe o que é? Você fica lendo que é incrível, maravilhoso etc. E aí vem um comentário negativo. E vai ser naquilo que vai se concentrar. Então prefiro não ler para não me preocupar.
No show de 2013, Blackbird foi um grande momento. E ela está no repertório da nova turnê. A canção foi composta nos anos 1960, durante a luta pelos direitos civis nos EUA. Hoje, com um mundo tão caótico e dividido, acha que ela pode ganhar um novo significado?
É uma questão interessante a se pensar sobre uma canção como esta. À medida que o tempo muda, também muda o significado da canção. E isto se aplica não só a Blackbird, mas a outras canções mais espirituais, como Let it be. Gosto da ideia de que ouvir uma música pode ajudar alguém a se levantar, independentemente dos problemas por que cada um está passando.
Qual sua opinião sobre a divisão social que vários países, entre eles EUA, Brasil e Inglaterra, enfrentem neste momento?
Não penso muito nisto. Os tempos estão sempre mudando, mas não perco meu tempo pensando nisto. O que tento é fazer coisas boas, tocar boas canções para todo mundo. Tenho minhas opiniões políticas, mas não me preocupo muito com isto.
Da primeira vez que esteve em BH, você estava estreando uma turnê. Agora chega quando ela está pela metade. O que a nova turnê tem que a outra não tinha?
Sempre tento apresentar novidades, mas há coisas que vêm de outros shows. É como eu te disse: você só vai poder dizer depois que assisti-lo. Não gosto de dar muitas dicas, falar muito. Na era da internet, todo mundo sabe e vê tudo. O que acho uma pena, porque gosto de ser surpreendido.
O que há de melhor em passar tanto tempo viajando pelo mundo em turnês?
Ver as pessoas. Elas têm pequenas diferenças, mas, no final, todos somos pessoas. Temos famílias, irmãos, irmãs, pais, filhos e é isto que nos une. Então, ao viajar, vejo as diferenças, mas também as semelhanças. É um sentimento bom, ver como um show consegue reunir as pessoas. Este poder da música é algo que nos orgulha muito.
Aqui em BH, você pretende, mais uma vez, falar “uai”?
Definitivamente. Já comecei minhas aulas de português.