Fenômeno na internet, a banda Oriente, com oito anos de carreira, vem mostrar que o hip-hop brasileiro está na pista para brigar por seu espaço no universo digital, entre astros sertanejos e estrelas do funk pop. O canal dos rapazes no YouTube, com 1 milhão de inscritos, registra quase 300 milhões de visualizações. Só o clipe oficial de O vagabundo e a dama (2014) ultrapassou 63,8 milhões de views, enquanto o vídeo de Linda, louca e mimada, lançado em março deste ano, ganhou 4,9 milhões de cliques – a versão acústica desse mesmo rap romântico, no ar desde 2014, recebeu 80,8 milhões de views.
Não é pouco para o hip-hop brasileiro. Somando visualizações e acessos na internet, o grupo calcula ter alcançado meio bilhão de cliques. Depois de lançar o disco independente Desorientado (2011) e de estourar com seu projeto acústico há três anos (exclusivo para a web), a banda de Niterói assinou contrato com a Sony e acaba de disponibilizar as 15 faixas do disco Yin yang no universo digital. Cinco canções inéditas (Essa eu fiz pra você, R.A.P: Resistência ao poder, Oriente-se, Fugir com o sol e Isso é rap) chegaram à rede antes do álbum, cuja versão física está prevista para outubro. Os antigos hits Essa eu fiz pra você e Linda, louca e mimada também estão lá.
O vocalista e compositor Nissin garante: o contrato com a Sony, que trará vantagens financeiras a ele e aos companheiros Chino (vocal), Geninho (beatbox) e Nobru (violino, violão e baixo), não vai mudar a essência do grupo, até então fenômeno da cena independente. A palavra de ordem é ''liberdade total'', assegura Nissin, dizendo que o quarteto amadureceu e, agora, planeja ampliar o seu público em parceria com a gravadora.
As letras românticas da banda Oriente caíram no gosto das garotas – elas formam 70% do público nos shows, segundo Nissin.
Tony Garrido (Cidade Negra) e Zeca Baleiro estão entre os convidados, assim como o produtor e beatmaker Nave, Pedro Qualy (do grupo Haikaiss) e o rapper americano Self Provoked. Rap dos anos 1990, guitarras, ecos hardcore, reggae, balada e trap marcam a sonoridade do disco. As letras falam de espiritualidade, amor, do caos social brasileiro e do preconceito que sempre cercou o hip-hop.
Nissin diz que o time de convidados não é estratégia de marketing, oportunismo nem lobby para atrair likes e views. ''São nossos amigos e ídolos, pessoas que dialogam com a nossa essência”, garante. Contar com KL Jay, ícone do rap nacional, foi a concretização “de um sonho de moleque''. A amizade com Criolo é antiga, vem da época em que ele e Nissin organizavam batalhas de rimas. O paulista foi à casa do amigo, em Niterói, onde os dois compuseram a faixa Oriente-se.
O nome de Zeca Baleiro surgiu durante os primeiros acordes do que viria a ser Roda gigante. ''A melodia era a cara dele'', relembra Nissin. Os rappers entraram em contato com a assessoria do maranhense e, diante da dificuldade de sincronizar agendas, o jeito foi marcar um encontro no aeroporto, entre conexões de voos. ''Todos esses aliados são luz, expandem a nossa música'', resume o vocalista.
Marca do Oriente, a pegada romântica está em várias faixas. Lembrando Linda, louca e mimada, em Fugir com o sol o ''magrelo de bermuda'' faz de tudo para encantar a moça de vestido azul (''Quando ela quer/ Não adianta contrariar/ Dona da razão/ Isso não vai mudar/ Tá solteira/ Não te deve satisfação/ Perigo/ Só encoste com permissão'').
EMPODERADAS Nissin nega que a atenção às garotas seja oportunista, de olho no empoderamento feminino tão em voga. ''O rap se abriu para o mundo de maneira bonita, ampliando o entendimento tanto sobre a relação homem-mulher quanto sobre outras questões. A gente fala de respeito não só à mulher, mas também à natureza, ao direito dos outros, ao ser humano'', observa.
Yin yang remete à dualidade que rege a vida. De um lado, a vida interior, a espiritualidade, o amor, as utopias mochileiras e o autoconhecimento. Do outro, a rua. E a indignação diante da injustiça. Letras politizadas denunciam mazelas do país, o massacre dos índios, a corrupção. ''Prostitui a nação e saqueia o Brasil/ O Dia da Independência ainda é Primeiro de Abril'', cantam Chino e Nissin em R.A.P: Resistência ao poder. ''Feche os olhos/ Ouça sua própria voz/ Abra a mente/ Se oriente, rapaz!'', recomendam Criolo, Nissin e Chino em Oriente-se.
A rapaziada de Niterói experimenta sonoridades em seu hip-hop: acrescentou bateria orgânica à eletrônica; Nobru toca violino, baixo, guitarra e violão. O violino, aliás, tem destaque nesse rap fluminense.
Para Nissin, sua geração vive ''um momento entusiasmante'' do hip-hop brasileiro. ''Você vê grande quantidade de artistas movimentando um público considerável, rompendo barreiras, conquistando espaço na TV'', afirma. Canções do Oriente vêm conseguindo romper a blindagem das rádios a esse gênero musical. ''Rap é ferramenta de sabedoria'', resume o vocalista, de 30 anos, que já desenvolveu projeto de hip-hop em escolas públicas.
MINEIROS O MC niteroiense destaca o talento da geração mais jovem do que a dele, chamando a atenção para os mineiros Djonga, Clara Lima e Chris MC. ''É muito bom, é bonito de ver essa molecada trabalhar, sustentar a família com a profissão. Neste nosso país, onde as coisas são tão difíceis, o rap mostra caminhos aos jovens'', acredita.
Um dos pioneiros da Batalha do Conhecimento – famosa disputa de rimadores realizada no Rio –, Nissin nunca participou do Duelo de MCs belo-horizontino, mas conta que ''acompanhou tudinho'' pela internet. Revela que uma das disputas mais importantes de sua vida foi com o mineiro Douglas Din. Para ele, as novas gerações colhem frutos plantados pelos veteranos – Racionais, RZO, Sabotage, Marechal e MV Bill, entre outros. ''A gente só está aí porque o público sente que o nosso rap é fruto da vivência real. Se não tiver sangue no olho e emoção verdadeira, não adianta'', avisa Nissin.
Abaixo, confira Yin yang:
YIN YANG
>> Oriente
>> Sony
>> 14 faixas
>> Disponível no YouTube, Soundclound, Spotify e iTunes
>> Informações no link