Ficou difícil avaliar a discografia de Otto depois de 2009, quando o cantor e compositor pernambucano surpreendeu público e crítica com o sexto e (de longe) melhor álbum de sua carreira, Certa manhã acordei de sonhos intranquilos. Comparações à parte, o recém-lançado Ottomatopeia, sucessor de The moon 1111 (2012), apresenta faixas muito boas, sem, no entanto, causar tanta empolgação pelo conjunto da obra.
Produzido pelo conterrâneo Pupillo (da banda Nação Zumbi), parceiro de longa data, o álbum tem pontos altos justamente em dois “rescaldos”. Meu dengo (1986) havia sido regravada em dueto com Roberta Miranda (de quem Otto se diz fã) para a trilha do longa-metragem Quase samba (2015), de Ricardo Targino. Teorema, por sua vez, reuniu o suingue paraense das guitarras e teclado de Manoel e Felipe Cordeiro para compor o filme Sangue azul (2014), de Lírio Ferreira.
“Teorema é uma canção sobre amor, não chega a ser sofrência. É um som do Norte, com participação de grandes mestres contemporâneos da música feita por lá. É um som para dançar, para beber, para amar. É para safadeza”, diverte-se Otto.
Ottomatopeia se insere no contexto de uma certa continuidade discográfica de sua carreira, acredita o cantor. “Meus discos falam a mesma língua, vêm das mesmas essências, dos mesmos ancestrais. Vêm do urbano brasileiro, da interação, da homogeneidade. Eles são brasileiros do mundo, do universo. Se as pessoas acham que falo de dor, falo sim. Mas, na real, falo de amor. Canto o amor – o amor político, social, irrestrito”, defende.
O cantautor pernambucano revela que escreve diariamente. “Vivo de poesia. Morrerei poeta. Viverei poeta. Dançar é minha amplitude, é o que mais gosto. Cantar também, mas dançar é o meu gozo”, diz.
PEGADA Anunciado como um disco de pegada mais rock, Ottomatopeia, na verdade, chama mais a atenção por forçar a mão nos sintetizadores e instrumentos percussivos. Felizmente, algumas (poucas) faixas saem ganhando com essa decisão – caso de Atrás de você (uma das mais notáveis do repertório) e É certo o amor imaginar?, cadenciada pelo coral formado por Bruno Giorgi, Marco Axé, Bactéria e Gustavo da Lua. “Essa é uma das músicas de que gosto para o show. Muito simples, é só esta pergunta: É certo o amor imaginar? A gente deveria fazer essa pergunta. Politicamente, também. Vamos imaginar uma coisa melhor. É um balanço, um suingue, a bateria... Uma música que se despedaça”, define Otto.
Das 11 faixas, outro destaque positivo é Bala, lançada como single antes de o disco sair – decisão acertada, pois se trata de uma boa candidata a hit. Escolhas menos impactantes são a parceria com o veterano compositor Zé Renato (Carinhosa) e o encerramento com Orumilá, com a participação do guitarrista Andreas Kisser (Sepultura).
Otto por Otto
OTTOMATOPEIA
“Nesse disco, atravesso de novo o Brasil, vou a Belém, a Pernambuco... Nunca teria um estilo único de música. O disco sempre vai ter camadas contemporâneas. Sempre será conceitual, vou transmitir alguma história, um momento meu, um Otto atual, essa mistura. Posso garantir que não saí do que sou. Só fiz outras coisas.”
ÍDOLO
“Uma das pessoas que me fizeram ser quem sou foi Reginaldo Rossi. Se puder cantar tudo como ele cantou, de tango, bolero, samba... Ele foi um intérprete incrível, um visionário, ensina que palco é isto: sentimento, show. E que o público é um ser íntimo, com quem a gente precisa fazer trocas. Falo em nome de muita gente que ouve minhas músicas.”
BRASIL
“O disco foi feito durante cinco anos, enquanto aconteciam muitos problemas no Brasil. A musicalidade do álbum reflete esse momento do país. O Brasil está em um caos tremendo, uma ruptura da democracia terrível. A gente vai ter que sobreviver a isso tudo com muita clareza. Estou com 49 anos e sou uma pessoa que vê as pessoas muito do alto. Em breve, o Brasil voltará por mãos mais conscientizadas. A justiça vai ser feita. A bala que dispara contra o tempo volta. A gente vai passar por toda essa luta e vai retomar. O mal não cabe. Ele explode. Ele derrete. Ele se extermina. Quando a gente nasce, é para sermos bons. Não é mais questão de direita ou esquerda, é questão de justiça. As questões sociais, humanísticas, os avanços que aconteceram... Tudo isso reforça a necessidade de eleições diretas, da retomada do povo e de suas escolhas. Para um bom esquerdista, a vitória sempre virá.”
INFLUÊNCIA
“Vi uma exposição em Paris (do fotógrafo japonês Araki Nobuyoshi). Minha mulher me apresentou Araki e juntei as torturas sexuais (presentes nas obras dele) com a tortura brasileira de 1964, com (o presidenciável Jair) Bolsonaro. A arte faz isso. O sexo e a tortura estão muito próximos. O encarte do disco tem cenas de tortura. Sugere que a gente não pode mais ser conservador, não pode continuar nessa onda política de mercado, senão vai virar refeitório e paiol de americano.”
CARREIRA
“Sempre me senti humilde e abençoado de ter conhecido Fred (ZeroQuatro), Chico (Science), a música da minha terra... A vida das pessoas é como um gráfico. Venho subindo, aprendendo a cantar, aprendendo a viver com paciência. Não busquei nada disso. Sei da minha importância. Tenho um público que está sempre comigo. Com a internet, isso aumenta mais ainda. Estou nesse caminho, assim como a música contemporânea pernambucana, como o cinema pernambucano, buscando alcançar um padrão de arte e passar uma informação para o público.”
OTTOMATOPEIA
• De Otto
• 11 faixas
• No Hay Duda Produções
• Disponível nas principais plataformas digitais
• Informações: www.nohayduda.com.br
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“Teorema é uma canção sobre amor, não chega a ser sofrência. É um som do Norte, com participação de grandes mestres contemporâneos da música feita por lá. É um som para dançar, para beber, para amar. É para safadeza”, diverte-se Otto.
Ottomatopeia se insere no contexto de uma certa continuidade discográfica de sua carreira, acredita o cantor. “Meus discos falam a mesma língua, vêm das mesmas essências, dos mesmos ancestrais. Vêm do urbano brasileiro, da interação, da homogeneidade. Eles são brasileiros do mundo, do universo. Se as pessoas acham que falo de dor, falo sim. Mas, na real, falo de amor. Canto o amor – o amor político, social, irrestrito”, defende.
O cantautor pernambucano revela que escreve diariamente. “Vivo de poesia. Morrerei poeta. Viverei poeta. Dançar é minha amplitude, é o que mais gosto. Cantar também, mas dançar é o meu gozo”, diz.
PEGADA Anunciado como um disco de pegada mais rock, Ottomatopeia, na verdade, chama mais a atenção por forçar a mão nos sintetizadores e instrumentos percussivos. Felizmente, algumas (poucas) faixas saem ganhando com essa decisão – caso de Atrás de você (uma das mais notáveis do repertório) e É certo o amor imaginar?, cadenciada pelo coral formado por Bruno Giorgi, Marco Axé, Bactéria e Gustavo da Lua. “Essa é uma das músicas de que gosto para o show. Muito simples, é só esta pergunta: É certo o amor imaginar? A gente deveria fazer essa pergunta. Politicamente, também. Vamos imaginar uma coisa melhor. É um balanço, um suingue, a bateria... Uma música que se despedaça”, define Otto.
Das 11 faixas, outro destaque positivo é Bala, lançada como single antes de o disco sair – decisão acertada, pois se trata de uma boa candidata a hit. Escolhas menos impactantes são a parceria com o veterano compositor Zé Renato (Carinhosa) e o encerramento com Orumilá, com a participação do guitarrista Andreas Kisser (Sepultura).
Otto por Otto
OTTOMATOPEIA
“Nesse disco, atravesso de novo o Brasil, vou a Belém, a Pernambuco... Nunca teria um estilo único de música. O disco sempre vai ter camadas contemporâneas. Sempre será conceitual, vou transmitir alguma história, um momento meu, um Otto atual, essa mistura. Posso garantir que não saí do que sou. Só fiz outras coisas.”
ÍDOLO
“Uma das pessoas que me fizeram ser quem sou foi Reginaldo Rossi. Se puder cantar tudo como ele cantou, de tango, bolero, samba... Ele foi um intérprete incrível, um visionário, ensina que palco é isto: sentimento, show. E que o público é um ser íntimo, com quem a gente precisa fazer trocas. Falo em nome de muita gente que ouve minhas músicas.”
BRASIL
“O disco foi feito durante cinco anos, enquanto aconteciam muitos problemas no Brasil. A musicalidade do álbum reflete esse momento do país. O Brasil está em um caos tremendo, uma ruptura da democracia terrível. A gente vai ter que sobreviver a isso tudo com muita clareza. Estou com 49 anos e sou uma pessoa que vê as pessoas muito do alto. Em breve, o Brasil voltará por mãos mais conscientizadas. A justiça vai ser feita. A bala que dispara contra o tempo volta. A gente vai passar por toda essa luta e vai retomar. O mal não cabe. Ele explode. Ele derrete. Ele se extermina. Quando a gente nasce, é para sermos bons. Não é mais questão de direita ou esquerda, é questão de justiça. As questões sociais, humanísticas, os avanços que aconteceram... Tudo isso reforça a necessidade de eleições diretas, da retomada do povo e de suas escolhas. Para um bom esquerdista, a vitória sempre virá.”
INFLUÊNCIA
“Vi uma exposição em Paris (do fotógrafo japonês Araki Nobuyoshi). Minha mulher me apresentou Araki e juntei as torturas sexuais (presentes nas obras dele) com a tortura brasileira de 1964, com (o presidenciável Jair) Bolsonaro. A arte faz isso. O sexo e a tortura estão muito próximos. O encarte do disco tem cenas de tortura. Sugere que a gente não pode mais ser conservador, não pode continuar nessa onda política de mercado, senão vai virar refeitório e paiol de americano.”
CARREIRA
“Sempre me senti humilde e abençoado de ter conhecido Fred (ZeroQuatro), Chico (Science), a música da minha terra... A vida das pessoas é como um gráfico. Venho subindo, aprendendo a cantar, aprendendo a viver com paciência. Não busquei nada disso. Sei da minha importância. Tenho um público que está sempre comigo. Com a internet, isso aumenta mais ainda. Estou nesse caminho, assim como a música contemporânea pernambucana, como o cinema pernambucano, buscando alcançar um padrão de arte e passar uma informação para o público.”
OTTOMATOPEIA
• De Otto
• 11 faixas
• No Hay Duda Produções
• Disponível nas principais plataformas digitais
• Informações: www.nohayduda.com.br