"Por que não?”, foi o que se perguntou Anthony Flint ao receber, em 2011, o convite do maestro Fabio Mechetti para se tornar integrante da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais. Recém-aposentado da Orchestra della Svizzera Italiana, em Lugano, na Suíça, Flint teria dupla função em Belo Horizonte: ser primeiro spalla e primeiro violinista da Filarmônica.
Até então, a experiência de Flint no Brasil havia sido mais do que satisfatória. Foi spalla convidado da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) durante cinco temporadas. Isso há mais de uma década. “Não o fiz porque gostasse especialmente do Brasil, da Osesp ou de John Neschling (regente da orquestra até 2008). Fiz porque minha família era jovem, tinha um trabalho muito bom na Suíça. Trabalhava 100 dias por ano.”
Muito tempo depois, o convite para a Filarmônica chegou num momento diferente. “Estava aposentado, então veio a curiosidade de participar de um projeto novo, de ver o que poderia acrescentar”, comenta Flint, hoje com 63 anos.
Desde então, são cinco anos em Belo Horizonte.
Anthony Flint é internacional por essência. De pai russo e mãe britânica, nasceu na Inglaterra, onde deu os primeiros passos na música. Mas foi no Canadá onde intensificou os estudos de violino. A graduação se deu na prestigiosa Universidade de Indiana, em Bloomington, nos Estados Unidos.
E ele ganhou o mundo. Atuou como spalla e primeiro violinista em pelo menos 25 orquestras na América do Norte e na Europa. Mas foi na Suíça, onde firmou residência, que atuou com mais constância – foram 30 anos na orquestra em Lugano.
E a Filarmônica mineira nesta história? “Não é muito diferente, temos os mesmos problemas e os mesmos prazeres. Esta é a grande vantagem da música: ela é internacional. Uma sinfonia de Mozart é uma sinfonia de Mozart aqui e lá fora”, diz.
ESTRANGEIROS
Há ainda a questão da internacionalização das formações. “Se uma orquestra fica mais internacional, é sinal de que ela chegou a outro nível. É difícil para algumas pessoas aceitar muitos estrangeiros na Filarmônica, mas a maioria dos músicos daqui é brasileira. Uma orquestra na Suíça tem 40% de estrangeiros, aqui essa participação é menor (25%).”
Fato é que pelos corredores do edifício do Barro Preto, a sede da Filarmônica, ouvem-se muitas línguas.
Nos concertos, é muito fácil identificá-lo. É o último dos instrumentistas a entrar no palco, antecedendo a chegada do maestro. Está sempre na primeira fila, à esquerda do regente.
Na Filarmônica, Flint exerce duas funções essenciais. “Como spalla, sou a via de comunicação entre o regente e a orquestra, especialmente entre o regente e as cordas (violinos, violoncelos, contrabaixos e violas). É o spalla quem lidera as cordas. Agora, como primeiro violinista, sou também responsável pelos primeiros violinos (são 13 na orquestra mineira)”, conta ele.
Em alguns concertos, Flint executa solos. Essa dupla função ele vem exercendo há muitas décadas. A estreia foi aos 11 anos, quando ficou responsável por uma jovem orquestra no Sul da Inglaterra. O batismo profissional se deu aos 18, ao liderar a Orquestra Gian Carlo Menotti, em Spoleto, na Itália.
FORMAÇÃO
Não há um curso formal para se tornar spalla.
O repertório do spalla ainda é muito específico: Uma vida de herói, de Richard Strauss, Scheherazade, de Korsakov, e Sinfonia nº1, de Brahms, são algumas dessas peças. “Não é fácil, pois você está tocando com a orquestra, com uma grande massa de cordas. De repente, tudo para, há um silêncio e você tem o solo. É como se estivesse nu no palco”, comenta.
No sábado que vem, a Filarmônica mineira faz concerto gratuito na Praça Melo Viana, em Sabará.
União faz a música
Na Europa, ele participa do Trio Nobile, integrado por músicos com carreiras internacionais. Flint vê essas pequenas formações camerísticas como uma necessidade artística. Ainda mais porque como violinista ele toca repertórios diferentes, de acordo com cada formação.
“Todos os tipos de formação contribuem, absolutamente, para o grupo. E o grande segredo por trás de uma orquestra é fazer música conjuntamente”, conclui..