Umbabarauma, Lupita Nyong’o, jongo… a música de Rincon Sapiência, conhecido também como Manicongo, é uma imersão na cultura africana, seus símbolos e representantes. Um dos nomes de destaque do rap nacional, Rincon traz para BH seus versos orgulhosos e atrevidos. O show ocorrerá a partir das 22h deste sábado, 13, n'A Fábrica (Avenida dos Andradas, 1.145, Centro).
O MC já esteve na cidade em outras oportunidades e teve a chance de ver o hip-hop acontecer, como no já conhecido Duelo de MCs, que demonstra a solidez da cena rap mineira. Mas o apreço de Rincon por Minas Gerais ultrapassa o aspecto musical e diz muito sobre seu passado. A fatia paterna da família do rapper, escritor e beatmaker saiu de Passos, no sul do estado, com destino a São Paulo. “Assistia um vídeo de umbigada (dança de roda trazida pelos escravos bantos em que um dançarino solista bate seu umbigo no do que vai substituí-lo), quando meu pai passou pela tela e disse que minha avó dançava aquilo”, conta. Foi aí que soube da ascendência mineira e da posição de Minas como um grande polo de cultura afro no Brasil.
“Se eu te falar que a coisa tá preta / a coisa tá boa, pode acreditar / seu preconceito vai arrumar treta / sai dessa garoa que é para não moiá”, avisa Manicongo na faixa A coisa tá preta, que busca dar outro significado à expressão que, como vários outros ditos populares, é pejorativa em relação às pessoas negras. E no contexto da ressignificação da palavra, o rap de Rincon é pretíssimo, expresso por outros versos, como os da participação no projeto Poetas no Topo 3. No cypher, Rincon chegou com metáfora forte, comparando o rap com uma pessoa que estava para baixo, doente, mas que “voltou, reapareceu / seu nome tava numas boca bem paia / tava pálido, agora já escureceu / até parece que voltou de férias da praia”, representando a volta dos pretos à frente de uma movimentação iniciada pelos próprios.
“E isso não tem a ver com desclassificar os brancos, mas a história do Brasil foi feita dessa forma, então eu achei que deveria ser falado algo sobre a questão racial. Mesmo com personagens como Beastie Boys ou Eminem na história do rap norte-americano, o protagonismo sempre foi preto. No Brasil, isso passou a me preocupar um pouco, sobre você pensar em rap e não pensar no perfil das pessoas que o construíram”, diz o MC.
Veja o clipe de Ponta de lança:
Um dos ideais de Manicongo é ajudar a trazer referências da negritude como retribuição à formação que a cultura de rua ofereceu a ele: “Parte do que sei, vivo, do que gosto esteticamente, comportamento, orgulho, tudo aprendi foi por meio do rap. Não ouvimos falar sobre Steve Biko, Malcom X, Muhammad Ali ou Zumbi dos Palmares na escola”.
Ponta de lança (verso livre), lançada em dezembro do ano passado, já tem mais de 5 milhões de visualizações no YouTube e é um dos grandes responsáveis pela propagação do afrorap, subgênero que Rincon planeja encabeçar. “Com a visibilidade, número de canais no Youtube, a atenção que as grandes têm dado ao rap também, ao público, a diversidade gênero, de gerações e eu manter a originalidade foi um choque”, avalia o artista.
Se uma faixa de Manicongo somou mais visualizações do que vários videoclipes de artistas mainstream, o otimismo define os momentos pré-lançamento do álbum de estreia, Galanga livre. Apesar do otimismo, “é sempre um desafio, pois Ponta de lança é uma música em que fui extremamente assertivo, mas no decorrer do álbum eu aposto em outras coisas”. O título do álbum, que continuará a exaltar a afrodescendência, faz referência ao personagem Galanga, conhecido como Chico Rei, monarca africano que, ao ser trazido para o Brasil, libertou a si e outros escravos.
“Galanga aparece na primeira faixa e ao longo do disco é falado sobre liberdade de várias formas, de você se amar da forma que você é, a sua estética, a liberdade de você não querer, mas acabar se apaixonando e falar ‘vamo nessa, a noite é nossa, se joga’, a liberdade da garota que tem aquela ideia instituída de várias formas sobre o padrão clássico de casamento, de achar o príncipe encantado, e para ela é sugerida uma liberdade que saia desse lugar tradicional, isso tudo passando pela música africana, rock, música eletrônica e música regional brasileira”, diz.
“O Brasil é a África fora do continente africano”, analisa Rincon. E ao contrário da ideia hegemônica, o carnaval sempre transcendeu as escolas de samba, ocupando também a rua, palco histórico da cultura hip-hop. Se o cruzamento entre rap e carnaval é a cultura de rua, as duas coisas juntas rendem frutos bem interessantes, como Meu bloco, última faixa lançada por Sapiência antes da estreia de Galanga livre.
E como carnaval de Belo Horizonte tem sido a preferência de muitos foliões, ano que vem a capital mineira terá mais um agitador. “Sabendo dos vários bloquinhos em BH, já vou me organizar para tirar uma onda aí com vocês no próximo verão”, promete. E Belô aguarda o bloco de Rincon.
Show do MC Rincon Sapiência
Neste sábado, 13, às 22h.
A Fábrica (Avenida dos Andradas, 1.145, Centro, (31) 99238-7499
Ingressos: gratuitos no site da Sympla