As guitarras estão de luto. Chuck Berry morreu ontem, aos 90 anos, de causas não reveladas pela família até o fechamento desta edição. O corpo foi encontrado em sua residência no condado de St. Charles, no Missouri (EUA).
Em outubro, Berry havia anunciado para este ano seu novo disco, Chuck (Dualtone Records), primeiro álbum solo depois de Rock it (1979).
Lenda, mito, ícone - palavras assim superlativas são pouco para resumir a trajetória de Charles Edward Anderson Berry, nascido em Saint Louis, em 1926. Basta dizer que Rolling Stones e Beatles beberam naquela fonte. "Copiei todos os acordes que ele já tocou", revelou certa vez o stone Keith Richards. “Há somente um verdadeiro rei do rock'n'roll. Seu nome é Chuck Berry”, decretou Stevie Wonder.
Realmente, não há como falar de rock sem o célebre riff de Johnny B. Goode, composta por Berry em 1955. Não é à toa que essa pauleira circula, literalmente, pelo espaço sideral, levada pela Voyager para Júpiter. Outros clássicos do lendário hitmaker são Roll over Beethoven, Rock and roll music e Sweet little sixteen. Seis de seus hits integram a lista das melhores canções de todos os tempos feita pela revista Rolling Stone.
Com sua guitarra Gibson, Berry foi reverenciado por várias gerações do pop. Bruce Springsteen tocou com ele, assim como Eric Clapton e Julian Lennon, o filho de John, entre tantos outros. Quando fez 60 anos, Keith Richards organizou para o ídolo um show nos Estados Unidos, que deu origem ao documentário Hail! hail! rock'n'roll, lançado no Brasil com o título Chuck Berry: o mito do rock.
CINEMA
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Na animação Carros (2006), as crianças do século 21 ouviram Route 66, com Chuck e John Mayer. Em De volta para o futuro (1985), Michael J. Fox (Marty) surgiu na tela tocando Johnny B. Goode.
Chuck Berry cravou seu primeiro sucesso em 1955, Maybellene. Antes disso, Muddy Waters o havia levado para a gravadora Chess, que lançou Howlin’ Wolf e Bo Diddley, entre outros mestres da música negra norte-americana. Exímio guitarrista, Berry soube mesclar blues e country para pôr a sua marca no DNA do rock.
Bad boy, meteu-se em várias encrencas com a polícia. Em 1959, foi condenado à prisão por levar uma garota índia de 14 anos para seu clube noturno em Saint Louis. Não declarou rendimentos de shows ao Imposto de Renda e teve problemas com o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos. Acusado de evasão de divisas, foi condenado a 100 dias de prisão.
A morte de Chuck Berry foi lamentada ontem por uma legião de discípulos famosos nas redes sociais. "Estou tão triste em saber que Chuck Berry se foi. Quero agradecê-lo por toda a inspiração que ele nos deu", afirmou Mick Jagger. "Ele deu vida ao sonho de nos tornarmos artistas", completou. Para Bruce Springsteen, Berry "foi o maior guitarrista e letrista do puro rock'n'roll".
BRASIL
Inspiração para o rock brasileiro, Chuck Berry teve seu legado lembrado pelo mineiro Henrique Portugal, tecladista da banda mineira Skank. "O que ele tocava o colocou no seleto hall das pessoas que mudaram o mundo para melhor. Uma lenda do rock, ele era o cara. Sua morte é algo que até nos faz pensar como pessoas que ganham eleições ou fizeram tão pouco pelo mundo recebem honrarias fúnebres, enquanto gênios como ele passam pela vida, às vezes, sem o devido reconhecimento. Ele foi para o lado de lá depois de cumprir a sua missão", lamentou Portugal.
Lenda não tem idade
Mariana Peixoto
Com 10 dias de diferença, Belo Horizonte recebeu, naquele 2009, dois nomes indiscutíveis do rock and roll. Chuck Berry, que havia se apresentado na cidade nos anos 1990, veio antes, em 21 de agosto; Jerry Lee Lewis logo depois, em 1º de setembro. Era algo a ser comemorado.
Pois bem, nem tanto ao céu, nem tanto à Terra. Um Chevrolet Hall com meia casa esperou para ouvir Berry, então com 82 anos. Havia curiosidade no ar, que foi diminuindo enquanto o tempo de espera para vê-lo no palco aumentava. Mas bastou ele pintar no palco para ser recebido com os gritos de “Chuck! Chuck!”.
Viajou sem banda – tocou com músicos brasileiros contratados. Mas com aquele repertório, não fazia diferença. E lá ficamos. Berry entrou, tocou seus hits, fez alguma graça com o público (o feminino principalmente, claro).
O duck walk (dança do patco) até que foi feito, mas com movimentos muito menos precisos do que aqueles que se tornaram a marca de sua performance.
Acabou? Sim, foi rápido e indolor. Mas era uma lenda – na nossa frente. Saímos, velhos e jovens, com um meio sorriso no rosto. Aprendemos com o mestre – ainda que numa aula um tanto descuidada – que rock, definitivamente, não tem idade.