Patti Smith é uma sobrevivente. Ao longo dos anos, seus principais companheiros de vida foram levados pela morte. Primeiro, Janis Joplin, em 1970, quando a 'poetisa do punk' ainda era uma artista emergente em Nova York. Depois, seu grande amigo e amante Robert Mapplethorpe, em 1989, vítima da AIDS. Mais recentemente, Lou Reed e Leonard Cohen, em 2013 e 2016, respectivamente. Mas Patti Smith fez diferente e resistiu às dores do luto, se estabelecendo como uma das últimas representantes do protopunk com um tipo de música que mistura poesia e rock and roll, abordando temas duros com doçura e auto-compaixão. Nesta sexta-feira, 30, ela completa 70 anos e irá comemorar o aniversário em cima do palco, lugar onde passou a maior parte de sua vida.
Patti nasceu Patricia Lee em 1946, em Chicago, nos Estados Unidos. Aos 16 anos largou os estudos para trabalhar em uma fábrica e teve um filho, do qual abriu mão para a adoção. Na década de 1960 mudou-se para Nova York e lá começou sua produção artística ao lado de Mapplethorpe. Os dois foram amantes durante um certo tempo e depois mantiveram uma grande amizade. Como nem tudo são flores, os dois viviam entre bicos em lojas ou bares e suas prolíficas produções artísticas, que transitavam entre as artes plásticas e a poesia. Os momentos ao lado do grande amigo serviram de mote para seu primeiro livro de memórias, Só garotos, lançado em 2010.
Até alcançar o estrelato e ser considerada uma das fundadoras da música punk, Patti Smith sustentou sua carreira publicando artigos sobre rock e compondo canções com Allen Lanier, da banda Blue Oyster Club. Em 1974, ao lado de Lanny Kaye, Ivan Kral, Jay Dee Daugherty e Richard Sohl, formou o The Patti Smith Group e lançou seu primeiro single, Piss Factory/Hey Joe. O lado A descrevia sua excruciante experiência como operária da fábrica em que trabalhou, e o lado B é uma versão do clássico de Jimi Hendrix.
Mas foi com seu primeiro álbum, Horses, que ela consolidou seu nome na música. O disco traz uma fusão de rock and roll com poesia recitada, estilo explorado ao longo de sua carreira. Horses começa com uma das frases mais famosas da história do rock: ''Jesus morreu pelo pecado dos outros, não pelos meus'', versos que introduzem o memorável cover da música Gloria, de Van Morrison.
Depois disso ela lançou mais três álbuns - Radio ethiopia (1976), Easter (1978) e Wave (1979) - e se isolou, vivendo em um subúrbio de Detroit ao lado de sua família. E só nove anos depois do último lançamento, em 1988, ela voltou à ativa com o disco Dream of life. No entanto, a morte de seu marido e de seu irmão a fizeram declinar para um possível retorno. Enconrajada por John Cale e Allen Ginsberg, Patti procurou ajuda e tornou-se uma ativista em apoio ao tratamento psiquiátrico para doenças mentais.
O ano de 1995 marcou a sua volta oficial aos palcos e ao estúdio. Depois de uma breve turnê acompanhando Bob Dylan, ela retornou a Nova York e se dedicou à gravação de Gone again, lançado em 1996. Desde então, ela se divide entre extensas turnês mundiais, gravações de álbuns - já somam cinco; o último, Banga, lançado em 2012 -, e à literatura.
No decorrer de sua carreira, Patti Smith publicou um certo número de livros de poesias, incluindo Babel, Early work e The coral sea, mas foi escrevendo suas memórias que ela se consagrou na literatura mundial. Só garotos ganhou o National Book Awards no ano de seu lançamento. A continuação, Linha M, chegou às livrarias em 2015 e provou a sede do público em conhecer a história de uma artista que foi testemunha ocular dos principais momentos do rock.
Seu talento como compositora e escritora, além da amizade de longa data com Bob Dylan, confluíu para que a Academia Sueca a convidasse para se apresentar durante a cerimônia de entrega do prêmio Nobel de Literatura em 2016. Patti Smith, emocionada, prestou homenagem à Dylan cantando A hard rain's a-gonna fall, acompanhada pela Real orquestra Filarmônia de Estocolmo.
Nesta sexta-feira, 30, Patti volta à cidade onde nasceu para um show especial no qual irá interpretar, na íntegra, o emblemático Horses. Provando que vozes poderosas como a dela resistem ao tempo.