Cadeirante, Jesus havia comprado quatro ingressos (o dele, que custou R$ 100, mais o de sua namorada, sua mãe e uma prima) para assistir ao espetáculo.
Chegou por volta das 20h, pelo menos uma hora antes do show. “Quando liberaram a portaria, o rapaz me disse que o ingresso estava ok, mas que eu tinha que passar pela bilheteria para mostrar meu documento”, conta.
Foi aí que começou a confusão. De acordo com Jesus, a pessoa que estava na bilheteria lhe pediu um documento que comprovasse que ele era deficiente físico – o rapaz nasceu com a chamada mielomeningocele, um defeito congênito que afeta a espinha dorsal; ele não possui qualquer movimento da cintura para baixo.
“Simplesmente ela não sabia explicar o que era. Disse, me mostrando um papel, que havia uma lei, um regulamento”, acrescentou.
Com a confusão, Jesus chamou a polícia pelo 190. Enquanto isto, de acordo com ele, outros cadeirantes entravam normalmente no Palácio das Artes.
“Depois que a polícia chegou, muito sorrateiramente uma menina, funcionária da Fundação Clóvis Salgado, me ofereceu duas cortesias. Não aceitei, eu tinha comprado, pagado pelos ingressos.”
Quase na hora do show, é que liberaram a entrada de Jesus. “Um senhor disse que tinha ingressos sobrando e acabou me dando”, diz ele, que ficou com o ingresso que havia comprado no bolso.
Funcionário do Tribunal de Justiça, Jesus é frequentador do Palácio das Artes. “Eu nunca tinha passado por isto, foi uma coisa muito desagradável.
Procurada pelo EM, a Fundação Clóvis Salgado afirmou que está convocando os funcionários que trabalharam na noite de sábado para apurar o que ocorreu. Somente após esta apuração a FCS iria se pronunciar sobre o ocorrido. Mais tarde, a assessoria de comunicação da Fundação publicou uma nota oficial, dizendo que os fuincionários do Palácio agiram em conformidade com a lei e que seguem apurando o caso. Confira o texto na íntegra:
"NOTA FUNDAÇÃO CLÓVIS SALGADO
Em relação ao fato ocorrido na noite do dia 24 de setembro de 2016, na entrada para show realizado no Grande Teatro do Palácio das Artes, a Fundação Clóvis Salgado esclarece que respeita, acata e age em conformidade com a Lei Federal nº 12.933, de 26 de dezembro de 2013, e com o Decreto Federal nº 8.537, de 05 de outubro de 2015, que dispõem sobre o benefício do pagamento de meia-entrada para estudantes, idosos e pessoas com deficiência,entre outras categorias.
No item referente à pessoa com deficiência, consta das normas que a meia- entrada é destinada somente às pessoas com deficiência e que usufruem de benefício social do INSS ou aposentados em razão da deficiência. É importante ressaltar que, de acordo com o Decreto citado, esse benefício não é de ordem geral, ou seja, não se destina a todo e qualquer portador de necessidade especial: “As pessoas com deficiência terão direito ao benefício da meia-entrada mediante a apresentação do seu CARTÃO DE BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL no momento da aquisição do ingresso e na portaria ou entrada do local de realização do evento, ou de documento emitido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que ateste a aposentadoria de acordo com os critérios estabelecidos na Lei Complementar nº 142, de 8 de maio de 2013”. Essa documentação não foi apresentada no momento em que foi solicitada.
Além disso, e ao contrário do que afirmam os usuários que protagonizaram a situação, o único documento apresentado foi uma carteira de estudante que não seguia o “modelo único nacionalmente padronizado”, conforme exigência do artigo 1º, §2º, da Lei Federal citada, faltando-lhe também a especificação do grau de escolaridade e a data de validade, dados expressamente exigidos pelo art. 1º, §2º do Decreto regulamentar anteriormente mencionado.
Sendo assim, a FCS, por se tratar de instituição da Administração Pública do Governo de Minas Gerais, tem o dever de exigir dos usuários da meia-entrada a documentação constante nas normas descritas, por força do princípio constitucional da legalidade.
Salientamos que os servidores da Bilheteria do Palácio das Artes estão aptos a orientar o público quanto às exigências da Lei. Além disso, destacamos a importância de os usuários conhecerem essa legislação em sua totalidade, que se encontra disponível no site da FCS e em sinalização interna no Palácio das Artes, tendo sido, inclusive, aprovada pela fiscalização do Ministério Público. Informamos, ainda, que será instaurada uma sindicância para a devida apuração dos fatos.
Assessoria de Comunicação Social
Fundação Clóvis Salgado"
Jesus Thiago discorda do argumento da FCS, alegando que seu ingresso corresponde à categoria 'cadeirante', e não de beneficário do INSS: "Minha revolta se dá pelo desrespeito e pelo mau trato da funcionária da bilheteria e por toda a exposição que eu fui obrigado a passar, masq uando compro o ingresso ele vem escrito 'cadeirante', não 'beneficiário'. Cadeirante não é aposentado, eu trabalho, me venderam o benefício como deficiente e me exigiram algo diferente de deficiente. Isso deveria ter sido deixado claro no momento da compra e não foi, tenho que comprar esse inclusive pelo lugar reservado. Só perguntaram minha identidade, preenchi e a compra foi efetuada sem nenhum problema, afirma ele, que realizou a compra pela internet.
No domingo, a irmã de Jesus, Thaís Freitas, ex-estagiária de Artes Visuais da Fundação Clóvis Salgado, publicou um post contando o ocorrido com ele.
Confira:
.