Sempre bastam poucos segundos para reconhecer Thielemans numa gravação que começa a tocar sem aviso. Ele tinha a cobiçada “assinatura” ao soprar a gaita, ou seja, conseguiu imprimir sua personalidade ao empunhar o instrumento. Para comprovar, basta ouvir Honeysuckle rose/Aquarela do Brasil, disco que lançou ao lado da cantora Elis Regina, em 1969. Notas doces, que deram “calor” extra a clássicos nacionais como Wave (Tom Jobim e Vinicius de Moraes) e O barquinho (Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli).
Bem mais adiante (e bem mais familiarizado com a música brasileira), em 1992, o belga lançou The Brazil project, álbum que reuniu parte do primeiro time de intérpretes e instrumentistas do país.
A admiração por Thielemans foi mantida no Brasil por meio de nomes de peso da nova geração. Um deles, o do gaitista brasiliense Gabriel Grossi, que o homenageou em sua página no Facebook: “Que honra ter conhecido esse ser iluminado 14 anos atrás, quando gravei meu primeiro disco. Desde então, mandei tudo que gravei pra ele. Me dava conselhos, tocava ao telefone e por algumas vezes pude visitá-lo em sua casa. Que honra a minha. Toots mudou a história da harmônica e é um dos maiores músicos que já existiram. Eternamente grato!!!”.
RECONHECIMENTO Thielemans morreu enquanto dormia. Ele ficou hospitalizado um mês antes em razão de uma queda que o deixou com o braço fraturado. Em março de 2014, ao sentir que havia perdido as forças para tocar, cancelou seus shows e encerrou sua carreira – à época, declarou que temia “decepcionar seu público”. O veterano ainda faria sua última aparição em um palco em agosto daquele mesmo ano, num festival de jazz em Antuérpia, na Bélgica.
“Perdemos um grande músico”, escreveu no Twitter o primeiro-ministro belga, Charles Michel, após o anúncio da morte de Thielemans, a quem o rei Alberto II concedeu o título de barão em 2001. Em 2012, e apesar de estar em estado delicado de saúde, Thielemans fez show no Palácio de Belas Artes de Bruxelas para celebrar seus 90 anos, antes de iniciar uma turnê que o levou aos Estados Unidos e ao Japão.
“Levou a gaita ao topo da arte e se converteu em um maestro”, havia declarado na época o instrumentista brasileiro Oscar Castro-Neves, que o acompanhava regularmente. Em 2009, os Estados Unidos lhe concederam o prêmio Jazz Master Award, distinção dada poucas vezes a europeus, e a Academia Charles Cros entregou ao belga em 2012 um prêmio em homenagem à sua carreira.
GUITARRA Thielemans nasceu em um bairro popular de Bruxelas, onde seus pais trabalhavam num café.
No fim da década de 1940 se instalou nos Estados Unidos, onde acompanhou o saxofonista Charlie Parker. Retornou posteriormente à Europa para uma turnê com o clarinetista Benny Goodman. O gaitista também registrou seu talento em trilhas sonoras dos filmes Perdidos na noite (1969), de John Schlesinger, e Jean de Florette (1986), de Claude Berri. (Com agência France Presse).