Chama a atenção ainda o modo como o artista articula formas e ritmo criando, inclusive, gêneros novos ou desenhando o protótipo deles (como o samba rock). Há quem suspeite que o forró, como o conhecemos hoje, é uma criação de Jackson do Pandeiro.
A inventividade do artista é apresentada com tal simplicidade, bom humor e argúcia que ombreia com o que há de melhor realizado pelos fundadores da música popular brasileira. Pela diversidade e amplitude, seu acervo soa até superior ao de Luiz Gonzaga, sem que isso implique tirar a grandeza do Lua. Rodrigo Faour, organizador da caixa, discorda da comparação com o autor de Asa-branca: “Luiz Gonzaga é maior do que Jackson do Pandeiro.
Para Faour, são emblemas da arte de Jackson do Pandeiro o ritmo, o bom uso do português, a voz agradável que se ouve sem cansar. “Há um preciosismo na escolha do repertório que faz com que a obra dele tenha unidade, do primeiro ao último disco”, afirma. O curador conta que o paraibano sabia exatamente o que queria e realizou seu projeto, inclusive levando para estúdio canções de amigos que, às vezes, “retocava”. Por seu enorme envolvimento com a cultura nordestina, transformou sua residência no Rio de Janeiro em referência para quem chegava do Nordeste. Num momento de ostracismo, tornou-se, na maior humildade, músico de estúdio, para surpresa dos colegas, atitude que, comenta Faour, demonstra sua “grandeza”.
ÍCONE “Jackson do Pandeiro é um dos maiores ícones da música nordestina, mas autor pouco conhecido para além das duas dezenas de sucessos dele”, diz Faour. Ele lembra que o artista estourou logo no primeiro disco e, a cada lançamento, emplacava mais um ou dois sucessos. A caixa O rei do ritmo reúne 70% da obra de Jackson do Pandeiro, segundo a estimativa de seu organizador. Traz as fases do artista nas gravadoras Copacabana e Phillips. A última é considerada a mais rara e obscura da discografia de Jackson do Pandeiro, já que nunca foi reeditada, nem mesmo em LP. Somado a outro conjunto de discos, editado pelo selo Discobertas, o lançamento repõe em circulação a obra completa do artista.
Jackson do Pandeiro foi porta-voz da música do Nordeste, “mas sem pretensão, com simplicidade”, observa Faour. A introdução da música nordestina no Sudeste, a partir dos anos 1940, teve impacto sobre o meio musical.
Rodrigo Faour já realizou aproximadamente uma dúzia de caixas com discos de autores brasileiros. “Muita coisa do reunido eu já conheço, mas cada trabalho traz aprofundamento que leva a outra compreensão da música brasileira”, conta. “A música brasileira é um baú sem fundo. São tantos artistas pouco conhecidos, tanta riqueza musical que quem se dedica a estudá-la fica deslumbrado com o que descobre”, garante. Situação, não esconde, que traz uma ponta de melancolia, já que é um patrimônio “que está se perdendo, porque ninguém dá atenção a ele”. Considera que a digitalização, que permite maior difusão, traz esperança de que não se perca mais do que já foi perdido.