Docinema da Nigéria à escritora Carolina de Jesus, Larissa descobriu um universo rico de referências e mergulhou em um processo de pesquisa com a antropóloga Goli Guerreiro. O mote da mulher negra acabou virando tema central do disco, que traz 10 faixas em homenagem a personalidades. “Quero contribuir para a divulgação do trabalho dessas mulheres de alguma forma”, diz a cantora.
Território conquistado traz Jr. Tostoi na produção, que assina trabalhos de Lenine e Jards Macalé, além da própria Larissa, Pedro Tiê e Pedro Itan. Larissa, que fez parte do grupo Ara Ketu durante quatro anos, é hoje uma das representantes da música negra contemporânea da Bahia.
Tostoi deu a “carga rock’n’ roll” que ela queria para aproximar sua música de uma proposta afropunk. Tiê criou a fusão do dubstep e trap com ritmos africanos como os sambas reggae e duro.
Larissa assina todas as faixas com diferentes parceiros. Cada música surgiu de uma vivência da baiana. Em Bonecas pretas, com Pedro Itan, ela fala da ausência de diversidade no comércio – que vende apenas brinquedos com padrão eurocêntrico. “Desde criança, percebo que quis ser o que não era por não me ver”, afirma.
O processo de assumir o cabelo crespo, de se enxergar como bela, as discussões da própria sexualidadee em torno da objetificação do corpo da mulher também estão no álbum. “É um despejo muito pessoal, todos os meus incômodos e desejos de tornar algo diferente. Ao mesmo tempo, se torna algo externo também”, pondera.
Elza Soares é homenageada na faixa título de Território conquistado e divide os vocais com Larissa. “Me olho no espelho e digo:/ Não é meu inimigo/Não te quero domado, não te quero contido/É território conquistado/É espaço garantido”, diz o refrão.
“Para mim, ela é uma das maiores representantes da música brasileira. É a personificação da própria resistência. Forte, batalhadora, nos representa muito bem”, afirma Larissa.
#OscarTãoBranco
Boicote ao Oscar 2016, que não teve indicação de artistas negros, apresentações impactantes do rapper Kendrick Lamar no Grammy e de Beyoncé no Super Bowl denunciando a opressão aos negros. Do outro lado, Meryl Streep justificandoque“ somos todos africanos” diante da falta de diversidade do júri branco do Festival de Berlim. Na avaliação de Larissa,que também é atriz e já atuou em musicais como Gonzagão e Ópera do malandro, o momento é de contestação.
A representatividade dos negros no audiovisual ainda é muito pequena em relação ao número de pessoas negras que existem no mundo”, pondera. Segundo a artista, é preciso que a população se veja na tela, tenha referências de outros padrões. Para ela, o apoio a movimentos contestadores como o do boicote ao Oscar nesta noite deveria ser maior. “Não precisa apanhar para se sensibilizar com a dor do outro. Basta ser gente. E não é sensibilização de pena, é de luta”, diz.
Larissa afirma que a população negra não quer mais o lugar de “coitadinha”, quer punir os racistasequestionaraausência de representantes nas bancadas, nos júris, nos filmes e entre os vencedores das premiações. “A arte só existe dentro desse contexto: se eu puder falar algo de útil. Não me sinto à vontade se sentir que está sendo tudo em vão.”.