Receita para fazer um bom disco ao vivo: uma banda afiada, um repertório impecável, convidados especiais e interpretações seguras. Fórmula de Miúcha ao vivo no Paço Imperial, com os melhores momentos de quatro dias de shows que a cantora Miúcha fez em dezembro de 2000, no Paço Imperial, no Rio de Janeiro. Acompanhada dos ótimos Helvius Vilela (piano), Novelli (contrabaixo) e Zizinho (percussão), sua banda fiel na época, a irmã mais famosa de Chico Buarque selecionou um repertório de 19 temas escolhidos entre o melhor de seus 25 anos de carreira fonográfica e outros que gravaria nos álbuns posteriores. Praticamente todas já eram ou se tornariam clássicos da música brasileira. Entre os convidados, Guinga, defendendo sua obra-prima Catavento e girassol, Francis Hime e sua Valsa-rancho, e o pianista Cristóvão Bastos com Todo sentimento e Resposta ao tempo.
Entre autores clássicos e contemporâneos, ela começa com Ary Barroso (Na batucada da vida), Noel Rosa (Pra que mentir?) e logo cai na turma de casa, como Chico, Tom Jobim, Baden, Vinícius e Toquinho com uma sequência imortal: Carta ao Tom, Carta do Tom, O amor em paz, Pelas Luz dos olhos teus, Falando de amor, Maninha, João e Maria, Chansong, Querida, Anos Dourados, Deixa e Tem dó.
Historicamente, o disco tem certa importância, porque registra um dos shows que provocaram o surgimento da gravadora Biscoito Fino, um dos selos responsáveis pela manutenção da música brasileira tradicional numa época em que a linha mestra da indústria se volta para sertanejo, axé e correlatos. E serve para celebrar os 40 anos de uma carreira coerente e pautada pela qualidade musical, no sentido clássico do termo, com boas letras, melodias, arranjos, harmonias e voz afinada.
Casada por oito anos com João Gilberto; irmã de Chico Buarque; mãe de Bebel Gilberto. Com dois discos antológicos gravados com Tom Jobim, Miúcha participou do clássico The best of two worlds, um dos álbuns que levaram a Bossa Nova a inverter o fluxo da influência do jazz, e gravou o clássico Boto, no disco Urubu, de Jobim. Contemporânea e amiga de estrelas como Vinícius de Moraes, Guinga e Paulo César Pinheiro, a cantora está num momento tranquilo da vida, cada vez mais buscando o que chama de horas mágicas, investindo na internet como plataforma para tratar sua música e sua carreira e apreensiva com o momento político do país.
Por telefone, ela reservou meia hora do final da manhã da última sexta-feira para conversar com o Estado de Minas. Confira os principais trechos da entrevista:
SHOW
Quando a Kati Almeida Braga me chamou na (gravadora) Biscoito Fino, dizendo que tinham encontrado o material do show e que poderia virar um disco, fiquei bem surpresa com a qualidade da gravação. O show foi feito numa sala pequena do Paço Imperial, gravado em quatro noites de show, cada uma com um convidado especial, e o resultado final ficou incrível.
AUSÊNCIAS
Infelizmente, não coube tudo no disco – os temas instrumentais que os convidados fizeram no show e as participações dos filhos do Baden Powel, por exemplo, que são incríveis. Mas a gravação não ficou boa.
INSTRUMENTISTAS CANÁRIOS
Nossos ensaios e shows, com o grupo que está no disco, sempre foram divertidos, com muito improviso. Destaco as participações do Hélvius Vilela, pianista mineiro incrível, que cantou Chansong como se fosse um Bing Crosby. E o Novelli, esse fabuloso baixista pernambucano, que também canta muito bem.
REPERTÓRIO
Nessa época, eu e esse grupo fazíamos muitos shows juntos. Quando resolvemos este repertório, vi que ele mesclava várias músicas que gravei nos meus primeiros 25 anos de vida fonográfica com algumas coisas que eu gravaria depois, em estúdio. Foi um insight. Já estava prevendo algumas coisas que estariam nos discos que fiz para a Biscoito Fino entre 2002 e 2007.
BOSSA NOVA
No começo da Bossa Nova, eu morava em São Paulo e morria de vontade de estudar na escola do Carlos Lyra, de participar do movimento. Mas depois fui para a Europa, casei-me com o João Gilberto e, quando voltei, minha casa era um ponto de encontros.
TOM JOBIM
Os dois discos com o Tom foram feitos completamente na brincadeira, na mesa de bar. Nem era para ter o Tom. Ele não estava querendo gravar nada dele. Sugeriu Chico, Custódio Mesquita... A gente ficava no botequim cantando e escolhendo o repertório. E acabamos fazendo dois discos.
VINÍCIUS DE MORAES
Vinicius me apresentou muitos autores, como Ismael Silva, Custódio Mesquita e o próprio Dorival Caymmi, nas cantorias que ele fazia lá em casa.
ESPONTÂNEA
Uma palavra de que gosto é espontânea. Sempre fiz as coisas sem planejar muito, como os discos com o Tom ou esses shows no Paço Imperial. Meus shows sempre tiveram muito improviso, muita risada.
TEMPO E GIRASSOL
Quando ouvi o material, chamei o José Milton, meu amigo e produtor, e falei das músicas que outras cantoras já haviam cantado. Como Resposta ao tempo, que tem uma interpretação da Nana Caymmi tão marcante, tão incrível. Ou Catavento e girassol, com a Leila Pinheiro. E ele disse que era bobagem. São clássicos da música brasileira.
TODO SENTIMENTO
O Cristóvão Bastos um dia me mostrou a melodia de Todo sentimento no piano, um dia depois de a ter criado. Achei que as palavras estavam pingando, esperando. Falamos logo com o Chico, que fez a letra na hora.
BRASIL HOJE
Acho que tudo está pior. É um suspense feio que a gente está vivendo. Muita insegurança. Cansei de não viver as coisas que sonhei.
INTERNET
A velocidade mudou com a internet. Estou aprendendo e conhecendo. Inclusive, estou terminando meu site, que deve ficar pronto em janeiro. Está sendo muito divertido fazê-lo.
NOVOS CONTATOS
Acho que já encontrei gente demais na vida (risos). Hoje, prefiro, quase sempre, conhecer a obra, mas nem sempre conhecer o artista. A pessoa se obriga a desempenhar um papel que nem sempre corresponde à obra. Quando Bebel morava comigo, conhecia mais gente. Mas tenho visto muitos artistas bons em São Paulo, que nem todo mundo conhece. Gosto do Renato Braz e da Monica Salmaso, que cantam de tudo e são muito bons.
ECLETISMO
Hoje, acho que as pessoas começam a se livrar dos rótulos, misturam gêneros e estilos. Isso é muito bom. Elas começam a se encontrar de novo, fazer música juntas. Gostei muito do disco da Zélia Duncan cantando samba.
FUTURO
Recentemente, fui a Angola, Portugal e Juazeiro. Não sei se vou fazer show de lançamento do disco. Só sei que estou esperando um convite para cantar em Belo Horizonte (risos).
DE VOLTA ÀS LOJAS
Depois de tanto tempo sem lançar disco, além deste, com o show gravado no Paço Imperial em 2000, tem um de 1988 que a Warner vai lançar, que foi meu único disco com orquestra, com Pablo Milanez, Bebel Gilberto e as primeiras parcerias do Guinga com o Paulo César Pinheiro.
Entre autores clássicos e contemporâneos, ela começa com Ary Barroso (Na batucada da vida), Noel Rosa (Pra que mentir?) e logo cai na turma de casa, como Chico, Tom Jobim, Baden, Vinícius e Toquinho com uma sequência imortal: Carta ao Tom, Carta do Tom, O amor em paz, Pelas Luz dos olhos teus, Falando de amor, Maninha, João e Maria, Chansong, Querida, Anos Dourados, Deixa e Tem dó.
Historicamente, o disco tem certa importância, porque registra um dos shows que provocaram o surgimento da gravadora Biscoito Fino, um dos selos responsáveis pela manutenção da música brasileira tradicional numa época em que a linha mestra da indústria se volta para sertanejo, axé e correlatos. E serve para celebrar os 40 anos de uma carreira coerente e pautada pela qualidade musical, no sentido clássico do termo, com boas letras, melodias, arranjos, harmonias e voz afinada.
Casada por oito anos com João Gilberto; irmã de Chico Buarque; mãe de Bebel Gilberto. Com dois discos antológicos gravados com Tom Jobim, Miúcha participou do clássico The best of two worlds, um dos álbuns que levaram a Bossa Nova a inverter o fluxo da influência do jazz, e gravou o clássico Boto, no disco Urubu, de Jobim. Contemporânea e amiga de estrelas como Vinícius de Moraes, Guinga e Paulo César Pinheiro, a cantora está num momento tranquilo da vida, cada vez mais buscando o que chama de horas mágicas, investindo na internet como plataforma para tratar sua música e sua carreira e apreensiva com o momento político do país.
Por telefone, ela reservou meia hora do final da manhã da última sexta-feira para conversar com o Estado de Minas. Confira os principais trechos da entrevista:
SHOW
Quando a Kati Almeida Braga me chamou na (gravadora) Biscoito Fino, dizendo que tinham encontrado o material do show e que poderia virar um disco, fiquei bem surpresa com a qualidade da gravação. O show foi feito numa sala pequena do Paço Imperial, gravado em quatro noites de show, cada uma com um convidado especial, e o resultado final ficou incrível.
AUSÊNCIAS
Infelizmente, não coube tudo no disco – os temas instrumentais que os convidados fizeram no show e as participações dos filhos do Baden Powel, por exemplo, que são incríveis. Mas a gravação não ficou boa.
INSTRUMENTISTAS CANÁRIOS
Nossos ensaios e shows, com o grupo que está no disco, sempre foram divertidos, com muito improviso. Destaco as participações do Hélvius Vilela, pianista mineiro incrível, que cantou Chansong como se fosse um Bing Crosby. E o Novelli, esse fabuloso baixista pernambucano, que também canta muito bem.
REPERTÓRIO
Nessa época, eu e esse grupo fazíamos muitos shows juntos. Quando resolvemos este repertório, vi que ele mesclava várias músicas que gravei nos meus primeiros 25 anos de vida fonográfica com algumas coisas que eu gravaria depois, em estúdio. Foi um insight. Já estava prevendo algumas coisas que estariam nos discos que fiz para a Biscoito Fino entre 2002 e 2007.
BOSSA NOVA
No começo da Bossa Nova, eu morava em São Paulo e morria de vontade de estudar na escola do Carlos Lyra, de participar do movimento. Mas depois fui para a Europa, casei-me com o João Gilberto e, quando voltei, minha casa era um ponto de encontros.
TOM JOBIM
Os dois discos com o Tom foram feitos completamente na brincadeira, na mesa de bar. Nem era para ter o Tom. Ele não estava querendo gravar nada dele. Sugeriu Chico, Custódio Mesquita... A gente ficava no botequim cantando e escolhendo o repertório. E acabamos fazendo dois discos.
VINÍCIUS DE MORAES
Vinicius me apresentou muitos autores, como Ismael Silva, Custódio Mesquita e o próprio Dorival Caymmi, nas cantorias que ele fazia lá em casa.
ESPONTÂNEA
Uma palavra de que gosto é espontânea. Sempre fiz as coisas sem planejar muito, como os discos com o Tom ou esses shows no Paço Imperial. Meus shows sempre tiveram muito improviso, muita risada.
TEMPO E GIRASSOL
Quando ouvi o material, chamei o José Milton, meu amigo e produtor, e falei das músicas que outras cantoras já haviam cantado. Como Resposta ao tempo, que tem uma interpretação da Nana Caymmi tão marcante, tão incrível. Ou Catavento e girassol, com a Leila Pinheiro. E ele disse que era bobagem. São clássicos da música brasileira.
TODO SENTIMENTO
O Cristóvão Bastos um dia me mostrou a melodia de Todo sentimento no piano, um dia depois de a ter criado. Achei que as palavras estavam pingando, esperando. Falamos logo com o Chico, que fez a letra na hora.
BRASIL HOJE
Acho que tudo está pior. É um suspense feio que a gente está vivendo. Muita insegurança. Cansei de não viver as coisas que sonhei.
INTERNET
A velocidade mudou com a internet. Estou aprendendo e conhecendo. Inclusive, estou terminando meu site, que deve ficar pronto em janeiro. Está sendo muito divertido fazê-lo.
NOVOS CONTATOS
Acho que já encontrei gente demais na vida (risos). Hoje, prefiro, quase sempre, conhecer a obra, mas nem sempre conhecer o artista. A pessoa se obriga a desempenhar um papel que nem sempre corresponde à obra. Quando Bebel morava comigo, conhecia mais gente. Mas tenho visto muitos artistas bons em São Paulo, que nem todo mundo conhece. Gosto do Renato Braz e da Monica Salmaso, que cantam de tudo e são muito bons.
ECLETISMO
Hoje, acho que as pessoas começam a se livrar dos rótulos, misturam gêneros e estilos. Isso é muito bom. Elas começam a se encontrar de novo, fazer música juntas. Gostei muito do disco da Zélia Duncan cantando samba.
FUTURO
Recentemente, fui a Angola, Portugal e Juazeiro. Não sei se vou fazer show de lançamento do disco. Só sei que estou esperando um convite para cantar em Belo Horizonte (risos).
DE VOLTA ÀS LOJAS
Depois de tanto tempo sem lançar disco, além deste, com o show gravado no Paço Imperial em 2000, tem um de 1988 que a Warner vai lançar, que foi meu único disco com orquestra, com Pablo Milanez, Bebel Gilberto e as primeiras parcerias do Guinga com o Paulo César Pinheiro.