Formado por músicos negros da capital, o grupo Camafeu experimentou desde cedo o racismo no ambiente musical.
"Em Belo Horizonte, infelizmente, criou-se na cabeça de parte das pessoas a separação entre os espaços culturais do samba de preto e do samba dos brancos", relata o vocalista Bruno Cupertino. O show que eles fazem nesta sexta-feira, 20, celebra o Dia da Consciência Negra — data cujo simbolismo diz respeito à história da própria banda.
O vocalista Bruno Cupertino (ao centro) relata que músicos do grupo Camafeu se depararam com uma ''separação entre os espaços culturais do samba de preto e do samba dos brancos'' - Foto: Grupo Camafeu/DivulgaçãoFormados e treinados nas rodas de samba dos bairros periféricos, os artistas se deparavam com a rotulação em casas de shows e espaços culturais. "A gente sente na pele a imposição estética em alguns palcos da cidade", diz Bruno ao explicar que, em certos espaços, a pele negra dos artistas é associada a repertório mais superficial.
Segundo ele, produtores e público de alguns locais esperam que sambistas negros dediquem-se às composições consideradas menos nobres, enquanto o alto panteão do gênero ficaria restrito aos brancos. "O negro tinha aceitação para tocar pagode e outros sambas mais populares, a ele não cabiam o Chico Buarque, o Vinicius , o Noel", aponta Cupertino.
O cantor relata que até mesmo compositores negros, como Pixinguinha, Cartola e Paulinho da Viola, eram reservados a intérpretes brancos por terem alcançado um alto grau de nobreza histórica.
Assim, o Camafeu assumiu como prioridade a ruptura das fronteiras sociais erguidas entre samba e público, executando com maestria os sambas que lhes interessam, sem deter-se por estereótipos.
"Não deixamos de lado composições da bossa nova, nem o chorinho, não tocamos o 'samba da moda'.
Fazemos com gosto o que nos atrai musicalmente" diz Bruno, que interpreta com o Camafeu canções autorais e faixas de Ataulfo Alvez, Paulo César Pinheiro, Chico Buarque, Cartola, Zé Keti, Adoniran Barbosa, Nelson Cavaquinho e outros mestres. "Graças a Deus, em geral, o público tem sido receptivo a nossa proposta e as portas vão se abrindo".
Convidada ilustre Júlia Rocha, do 'The voice': estrela de canções e de discursos - Foto: DivulgaçãoQuem completa a celebração da Consciência Negra com o Camafeu é a mineira Júlia Rocha. Participante do programa The voice Brasil, a médica e cantora já era conhecida em Belo Horizonte antes de integrar o elenco da atração — tanto pelo talento vocal quanto por suas reflexões na internet sobre racismo, violência de gênero e outras questões sociais. Ao palco do Camafeu, Júlia leva repertório com releituras de Clara Nunes, Roberta Sá, Maria Rita e outras grandes intérpretes do samba.
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