O DNA romântico já faz parte da essência de Carlos Leoni Rodrigues Siqueira Júnior. Ainda que ele queria se desvincular da imagem de poeta do amor, sua maneira delicada, tranquila e, muitas vezes, serena de falar, o coloca, automaticamente, no patamar dos que não veem problemas em dizer, por intermédio de suas composições, o quanto as decepções amorosas são importantes dentro do seu processo de criação. "As melhores canções românticas da história da música surgem na dor da separação. Isso acontece, justamente, naquele período em que o sentimento ruim é mais latente", afirma.
Aos 55 anos e dono de uma infinidade de hits da década de 1980, Leoni, que está lançando o disco Notícias de Mim, o sétimo da sua carreira, e faz dois shows em São Paulo nesta semana, não se incomoda com o rótulo de romântico e hitmaker baladeiro. "É natural que as pessoas pensem que eu só faço balada. Meus maiores sucessos têm essa pegada mais leve, com voz e violão", diz.
Em Notícias de Mim, no entanto, os arranjos melódicos do músico dão lugar ao rock 'n' roll pesado. As 13 faixas que integram o álbum são enérgicas e recheadas de solos consistentes. Algo inédito para Leoni, habituado a compor no violão, há décadas seu melhor amigo. Glamour e Pequeno Labirinto exemplificam bem essa nova fase. O disco ainda tem espaço para o inusitado. Em A Carne é Forte, o ritmo caribenho dá a letra. Já Amor Real destoa das demais e recoloca o compositor no caminho das baladas. "Eu procuro não ter estilo. Acho que o estilo está mais nas composições do que nos arranjos, na verdade", conclui.
Neste novo trabalho, Leoni também traz um leque interessante de parcerias. Zélia Duncan, Sergio Britto, dos Titãs, Frejat e Chuck Hipolitho, da banda paulistana Vespas Mandarinas, são alguns dos nomes que aparecem em Notícias de Mim. "Eu tenho sempre essa coisa de buscar novos parceiros, principalmente a garotada. Acho injusto quando as pessoas dizem que a música de hoje em dia não é igual à de antigamente. Tem tanta banda boa nos dias atuais. Gravei com os Móveis Coloniais de Acaju e o Teatro Mágico, por exemplo. Daí ouvi o disco Animal Nacional, das Vespas Mandarinas, e adorei. Procurei os meninos na internet e mandei uma mensagem: quero compor com vocês. O Chuck Hipolitho topou na hora. A gente acabou fazendo via internet. Ele me mandou um começo de letra e eu completei", conclui Leoni.
Ex-integrante do Kid Abelha e responsável por boa parte dos hits do grupo, Leoni deixou o conjunto de maneira conturbada. O fim do relacionamento com Paula Toller e a briga com Leo Jaime: tudo conspirou para que o baixista e principal compositor do conjunto deixasse a banda de maneira conturbada no auge do seu amadurecimento como músico. "Saí do Kid Abelha por problemas pessoais. Depois que me separei da Paula, as coisas ficaram insustentáveis. Tinha a questão do Herbert Vianna, também, que era meu amigo e, naquela ocasião, tinha começado a namorar com a Paula. Não dava mais para sustentar aquilo", desabafa.
O estopim de toda a confusão aconteceu no festival Cidade Livre Concert, no Estádio Remo da Lagoa, no Rio de Janeiro, em 1986, quando Leo Jaime não deu os devidos créditos a Leoni na composição Educação Sentimental. Leoni não gostou nada e reclamou de maneira contundente. Paula Toller tomou partido de Leo Jaime. Fabiana Kherlakian, ex-companheira de Leoni, se manteve ao lado do namorado. Herbert Vianna também se envolveu na discussão, dando início a uma confusão generalizada. Até uma pandeirada na cabeça Leoni levou. "Apesar da briga, eu e o Leo somos muito amigos hoje em dia. Chegamos a dividir apartamento. Desde este fatídico episódio, tocamos várias vezes juntos. Somos grandes parceiros de composição. A gente não tem se encontrado muito ultimamente porque ele se dedica em tempo integral à televisão. No geral, sempre tivemos um bom relacionamento", crava.
Sobre a "amizade" com Paula e um possível retorno ao Kid Abelha, que encerrou oficialmente suas atividades neste ano, Leoni é enfático. "Nós não nos encontramos muito. Vejo mais o George Israel e o Bruno Fortunato, que vão mais a shows à noite e estão sempre por aí. A Paula dificilmente sai de casa, pelo que sei, e por isso, não nos falamos. Mas hoje está tudo bem. É algo superado. Não me arrependo de ter saído. Cheguei a pensar nisso quando a banda voltou a deslanchar no Acústico MTV, em 2002. Antes disso, não. Adoraria voltar a tocar com o Kid Abelha. Dividiria o palco com Paula, George e Bruno. Acho mesmo que seria algo bom para comemorar uma época legal da vida de todo mundo. Não tem essa de ressentimentos. Somos todos maduros suficientes para lidar com isso. Reconheço minha importância para a trajetória da banda", diz Leoni.
Hitmaker
Fixação, Como Eu Quero e Lágrimas de Chuva: muitos são os sucessos de Leoni à frente do Kid Abelha. O cantor e compositor também tem uma trajetória solo invejável. Em seu primeiro disco individual, lançado em 1993, logo após o fim do Heróis da Resistência, banda que fundou depois do Kid Abelha, Leoni escreveu aquele que se tornaria seu maior sucesso. Garotos II - O Outro Lado mostra o lado masculino mais emotivo dentro de um relacionamento. "Muitas pessoas acham que os homens são sempre insensíveis e, até certo ponto, maquiavélicos. Enganam-se. Os garotos também amam e ficam perdidamente apaixonados. Quando isso acontece a coisa é genuína", ressalta Leoni.
Coautor de Exagerado, clássico que ficou famoso na voz de Cazuza, Leoni não se incomoda com o fato de as pessoas desconhecerem, muitas vezes, a verdadeira autoria de suas famosas composições. "Isso, antigamente, me afetava. Hoje em dia, no entanto, não me importo mais. Exagerado, por exemplo, é uma música que tem a cara do Cazuza. É até justificável que as pessoas pensem que é só dele. Tem aquele jeitão espalhafatoso e dramático do Cazuza. A interpretação dele beira a perfeição", afirma.