"O rap brasileiro tá forte", avisa Edi Rock. Ao lado de Mano Brown, Ice Blue e KL Jay, ele chega a BH nesta sexta-feira, 16, com o Racionais MCs, grupo mais importante do hip-hop nacional, para fazer show no Bailão Venda Nova. Aos 45 anos, o veterano letrista e MC saúda a geração que vem conquistando espaço na cena musical – os rappers Emicida, Criolo, o mineiro Flávio Renegado, Flora Mattos, Karol Conka, Tássia Reis, Lurdez da Luz, Projota e Rashid, entre outros.
"Família unida esmaga boicote. Nova era/ Os pretos têm que chegar", diz o verso de Você me deve, uma das faixas de Cores e valores, último disco do Racionais. Com apenas 35 minutos, batidas pesadas e faixas curtíssimas, contraponto às quilométricas letras que fizeram a fama do grupo, o álbum trouxe novidades, ganhou elogios da crítica, mas deu um "susto" em parte dos fãs, que chiaram na internet na época do lançamento.
Confira cenas da turnê Cores e valores:
Desde janeiro, o grupo sai pelo país para defender o álbum, surgido 12 anos depois de seu último CD de inéditas, Nada como um dia após o outro dia. O repertório mescla sucessos e as novidades, que, segundo Edi, ainda estão sendo "degustadas" pelo público.
PACIÊNCIA
A crise econômica atrapalha, o público dos shows se reduz, mas isso não assusta o Racionais. "Toda crise passa, são parênteses na história. O momento é de ter paciência", recomenda Edi. Para ele, a presidente Dilma Rousseff deve ir até o fim de seu mandato.
O Racionais subiu diversas vezes no palanque do PT, mas essa participação foi menos intensa em 2014. O rapper acredita que a corrupção é fruto do jogo de interesses inerente ao poder, independentemente do partido no comando, seja PT, PMDB, PSDB ou outra legenda. "Ninguém é santo", resume o eleitor de Eduardo Jorge (PV) no primeiro turno em 2014.
Mesmo que sejam afetados os programas sociais e a renda de famílias que vinham ascendendo socialmente, Edi diz que a dificuldade fortalece as pessoas. Letras de Cores e valores ressaltaram o novo momento do país, denunciando, por exemplo, o preconceito em shopping centers no Brasil do rolezinho. "Não acredito em retrocesso. As pessoas vão se conscientizar mais ainda. O importante é trabalhar por aquilo que se quer", garante.
RACISMO
Trilha sonora do povo, como diz Edi, o rap é trincheira de resistência. Graças a letras do Racionais, muitos brasileiros deixaram de ter vergonha de sua negritude, romperam o estigma de "favelado". "Não é que o país tenha deixado de ser racista, mas há um avanço real, estamos mais conscientes. É avanço de um século. Não me lembro de ter visto algo igual, só nos Estados Unidos", afirma. Ele compara as mudanças que o rap protagonizou nos anos 1990 àquelas provocadas pelo rock nos anos 1960 e 1970 e pela MPB no período da ditadura militar.
Entretanto, o rapper adverte que lutar contra o preconceito não pode ser "apenas uma moda". Ultimamente, negros brasileiros têm participado de ações exibindo o orgulho do cabelo crespo, o orgulho de seu biotipo. Edi diz que o símbolo é válido, mas pondera que a atitude não pode se limitar ao visual. "Cabelo não é o foco principal, é preciso falar de dignidade, respeito no trabalho, de justiça social. Não basta mudar só o cabelo", diz.
FUNK
Se por algum tempo o rap brasileiro parecia ter sucumbido ao funk carioca, agora ele ressurge oferecendo música de qualidade, afirma o MC. "Essa nova fase traz mente aberta, ideias evoluídas", comemora, destacando a competência das mulheres ao microfone. "O rap brasileiro está mais livre", diz, contando que tem ouvido muita coisa boa no Nordeste e no Sul do país. Ele está se abrasileirando, mais musical do que anos atrás, constata, referindo-se à incorporação de instrumentistas e bandas de apoio. Mas avisa: "O rap só não pode perder a sua característica: a batida".
Em seu disco solo, Contra nós ninguém será (2013), ele dialoga com rock, reggae e ritmos latinos. Ao lado de Seu Jorge, soltou um "rap-balada", That's my way, que faz sucesso nos shows do Racionais. São 23 faixas. Duas ficaram de fora: um blues e um samba, que Edi pensa em remixar e mandar para a internet.
NO SPOTIFY
Considerado "old school", Racionais MCs tem 6,7 milhões de fãs no Facebook – Kéfera, a vlogueira-sensação soma 4,3 milhões –, acaba de mandar sua discografia (menos Cores e valores) para o serviço de música digital Spotify, aderiu ao Instagram e ao Periscope.
Edi diz que a internet não apenas aproximou o grupo dos jovens do século 21, mas ajudou a romper estigmas. Primeiro, certa aura de "messias" do Racionais; depois, a imagem ligada ao crime, tema de suas letras sobre o dia a dia dos excluídos. "A comunicação está mais ampla, as pessoas nos conhecem melhor e nos veem como artistas, poetas do povo que falam para o povo", garante.
saiba mais
-
Discografia dos Racionais MC´s é disponibilizada na internet
-
Esposa de Mano Brown, Eliane Dias revitalizou o Racionais MCs
-
Disco do Racionais Mc's é levado de presente para Papa Francisco
-
Mano Brown, do Racionais Mc's, responde perguntas dos fãs em canal do YouTube
-
Clipe do grupo de rap Negredo protesta contra chacinas em São Paulo
-
Racionais MCs vai de Roberto Carlos à "rima" dos inconfidentes no Bailão Venda Nova
-
Artistas lamentam morte do diretor, ator e produtor Luiz Carlos Miele
-
Maria Bethânia faz apresentação de recital em Inhotim
-
Tom Zé se apresenta na Praça da Liberdade com entrada franca
-
O cantor e compositor Siba traz o som de Pernambuco para BH
-
Musical refaz a trajetória do cantor Wilson Simonal
Os fãs não acreditam quando constatam que é ele próprio quem posta suas opiniões na rede, muitas vezes para corrigir distorções e mal-entendidos. "É para isso que serve a rede social: informar", defende, admitindo que "perde a linha", de vez em quando, diante de provocações mais pesadas.
O mundo virtual, a rapidez da informação e o contato físico com as pessoas na rua influenciam suas letras, aproximando o Racionais dos jovens e ajudando a esclarecer o que ele chama de missão do rap.
A "revolução tecnológica" passou também pela comunicação. Antes resistente a entrevistas e à mídia tradicional, o grupo mudou. Edi, aliás, "apanhou" muito ao divulgar seu disco solo em programas de Regina Casé e Luciano Huck, na TV Globo. Ele explica que aceita convites assim em prol da divulgação do rap, depois de muita reflexão e sabendo exatamente o que vai dizer. "Sabemos como a máquina funciona e como fazer essa máquina girar a nosso favor", resume.
RACIONAIS MCS
Bailão Venda Nova. Av. Elias Antônio Issa, 115, Venda Nova, (31) 3485-2000. Sexta-feira, 16 de outubro, às 22h. Rap. Inteira: R$ 80 (pista/1º lote) a R$ 140 (VIP/2º lote). Open bar: R$ 120 (3º lote). Ingressos: www.centraldoseventos.com.br.