O portunhol nunca esteve em tão em voga como agora, basta lembrar as críticas ao espanhol do ator Wagner Moura na série Narcos (Netflix), em que dá vida ao colombiano Pablo Escobar. Antes mesmo de essa polêmica vir à tona, os músicos Moska e Fito Páez resolveram praticar a “língua” ao se unirem para criar o álbum 'Locura total', lançado neste ano em duas versões — português e espanhol —, ambas mesclando os dois idiomas, com o bom e velho portunhol.
O disco une dois artistas diferentes apenas pela nacionalidade, mas muito parecidos nas trajetórias profissionais. O brasileiro Moska sempre teve uma afinidade com os países da América do Sul. “Eu me apresentei e produzi muitos encontros entre brasileiros e sul-americanos. Inclusive, virei curador de festivais latinos. Um movimento muito parecido com a trajetória de Fito”, lembra Moska. O argentino Fito Páez é um nome constante em parcerias com artistas do Brasil. Ele tem no currículo duetos com nomes que incluem Caetano Veloso, Os Paralamas do Sucesso, Titãs, Djavan e Chico Buarque.
A união da dupla veio de uma ideia da gravadora, exatamente por conta das similaridades entre os músicos. “A ideia era muito boa: juntar dois caras que estão se aventurando no mundo do outro. Mas nada disso daria certo se a gente não fosse bom junto. Logo no primeiro encontro, em Buenos Aires, ele me mostrou a faixa Hermanos, ela não tinha letra, era só o ‘larala’. Nesse dia, já fizemos três das músicas que estão no disco”, conta o brasileiro.
Para criar 'Locura total', Fito e Moska se encontraram ainda no Rio de Janeiro e em Trancoso (Bahia) e chegaram a compor 19 faixas, dessas, 12 fazem parte do CD. As canções foram escritas em português e em espanhol, mas o que se escuta é, principalmente, um equilíbrio em portunhol. “É um tipo de encontro que reflete o que o mundo está passando. Em Flores do abraço (última faixa do disco), a gente fala do portunhol, que não tem dicionário. É um desejo de ouvir e entender o outro”, defende Moska.
A sonoridade também encontrou um equilíbrio. É possível encontrar em 'Locura total' sambas, tangos, rock’n’roll e música clássica. “Acho que os gêneros estão dentro da gente. Eu tenho uma história muito parecida com a do Fito. Ele é um pianista que se interessou por música clássica, instrumental, tango, rock. E eu me interesso por MBP, samba, rock, jazz e música clássica. Nessa gama, podemos nadar com muita facilidade sem planejar muito”, explica. Moska ainda diz que a presença do produtor Liminha e a mixagem em Miami foram essenciais para que o disco tivesse uma sonoridade equilibrada e ganhasse mais grooves. “É um disco muito positivo. É uma afirmação do Brasil sul-americano latino. Só tem uma música sobre morte, Adíos a las cosas, que é um perfume, o resto pulsa mais vibrante e alegre”, completa.
Literalmente, hermanos
O encontro de Fito Páez e Moska resultou em uma irmandade, como a própria música 'Hermanos', a primeira do disco, sugere. “Quando a noite esfriar fundo no coração/ Saiba que estarei aqui quando não tiver mais ninguém/ Segure minha mão e me dá a sua também”, diz a letra da canção.
Essa similaridade de quase gêmeos está visível nas fotos de divulgação do disco — ambos de cabelo grande desgrenhado, barba e até o jeito de dobrar as pernas – e também na voz dos cantores que, em certos momentos, se misturam e fica difícil distinguir quem está cantando cada estrofe.
“Nós já tínhamos essa predisposição física, mas, quando começamos a ver as primeiras fotos na Bahia, foi impressionante essa similaridade. Até mixando o CD, tivemos dificuldade de saber quem estava cantando. Acho que encontramos o que estávamos procurando: uma terceira identidade”, afirma Moska.
Mas, se o clima era de irmandade, por que o disco não se chama Hermanos? Moska contou que, desde o início, a previsão era de que esse fosse o nome do projeto. No entanto, 'Locura total' se tornou uma expressão comum entre eles. “No último encontro, em Trancoso, escrevemos 'Locura total' que é um delírio total, falando da Bahia e de um mito argentino de Diana. Rapidamente entendemos que Hermanos era um nome muito previsível. E esse projeto foi uma loucura total, nos juntamos sem saber se daria certo”, revela.
Três perguntas // Moska
No disco, vocês defendem o portunhol, que é muito criticado. Vocês não tinham receio de usar a “língua”?
Para mim, o portunhol é a língua mais linda do mundo. É livre e vai de acordo com a cara de pau de cada um. Não tem regra, não tem dicionário nem gramática. É o desejo de abraçar o outro. Como língua, pode ser vista como um equívoco, mas como comportamento, atitude e projeto é linda. É muito mais do que um idioma, é um abraço à irmandade. Eu e Fito inventamos portunhóis.
Nesse disco, vocês trazem o Brasil para mais perto dos outros países da América do Sul. Você também tem a impressão de que os brasileiros não se sentem latinos?
Esse é um constrangimento que me apareceu há 14 anos. Eles (os países da América do Sul) conhecem nossa cultura, nossa música. E acho que perdíamos em não conhecer a cultura deles. Ficamos isolados por esse tamanho do Brasil, sua exuberância, também tem a diferença da língua… Daí parece que a gente se basta. Mas não pode ser assim, tem um mundo maravilhoso lá fora. Somos muito mais parecidos com os latinos, até mais do que com os europeus, os japoneses e até os norte-americanos.
Há a intenção de sair em turnê com o disco?
Por enquanto, é só um desejo. Era um projeto alternativo, que acabou ganhando uma proporção maior. Mas a gente ainda não sabe a dimensão dele. Não queremos fazer nada menor ou maior do que a realidade. Vamos esperar, mas se rolar será em 2016, até porque temos as nossas carreiras paralelas.
Perfil
O compositor, cantor e pianista argentino Fito Páez começou a se destacar no Brasil após o lançamento do álbum El amor después del amor (1992). Por conta do sucesso, ele fez shows no país e também começou a as parcerias com artistas brasileiros. Em seu disco Circo beat, contou com uma segunda versão com participação de Caetano Veloso, Herbert Vianna e Djavan. Depois, fez parcerias com Rita Lee e também se tornou responsável pela boa repercussão de Os Paralamas do Sucesso na Argentina. Moska o define como “uma mistura de Caetano Veloso com Lulu Santos”.
Locura totalç
De Fito Páez & Moska. Sony Music, 12 faixas. Preço médio: R$ 29,90.
O disco une dois artistas diferentes apenas pela nacionalidade, mas muito parecidos nas trajetórias profissionais. O brasileiro Moska sempre teve uma afinidade com os países da América do Sul. “Eu me apresentei e produzi muitos encontros entre brasileiros e sul-americanos. Inclusive, virei curador de festivais latinos. Um movimento muito parecido com a trajetória de Fito”, lembra Moska. O argentino Fito Páez é um nome constante em parcerias com artistas do Brasil. Ele tem no currículo duetos com nomes que incluem Caetano Veloso, Os Paralamas do Sucesso, Titãs, Djavan e Chico Buarque.
A união da dupla veio de uma ideia da gravadora, exatamente por conta das similaridades entre os músicos. “A ideia era muito boa: juntar dois caras que estão se aventurando no mundo do outro. Mas nada disso daria certo se a gente não fosse bom junto. Logo no primeiro encontro, em Buenos Aires, ele me mostrou a faixa Hermanos, ela não tinha letra, era só o ‘larala’. Nesse dia, já fizemos três das músicas que estão no disco”, conta o brasileiro.
Para criar 'Locura total', Fito e Moska se encontraram ainda no Rio de Janeiro e em Trancoso (Bahia) e chegaram a compor 19 faixas, dessas, 12 fazem parte do CD. As canções foram escritas em português e em espanhol, mas o que se escuta é, principalmente, um equilíbrio em portunhol. “É um tipo de encontro que reflete o que o mundo está passando. Em Flores do abraço (última faixa do disco), a gente fala do portunhol, que não tem dicionário. É um desejo de ouvir e entender o outro”, defende Moska.
A sonoridade também encontrou um equilíbrio. É possível encontrar em 'Locura total' sambas, tangos, rock’n’roll e música clássica. “Acho que os gêneros estão dentro da gente. Eu tenho uma história muito parecida com a do Fito. Ele é um pianista que se interessou por música clássica, instrumental, tango, rock. E eu me interesso por MBP, samba, rock, jazz e música clássica. Nessa gama, podemos nadar com muita facilidade sem planejar muito”, explica. Moska ainda diz que a presença do produtor Liminha e a mixagem em Miami foram essenciais para que o disco tivesse uma sonoridade equilibrada e ganhasse mais grooves. “É um disco muito positivo. É uma afirmação do Brasil sul-americano latino. Só tem uma música sobre morte, Adíos a las cosas, que é um perfume, o resto pulsa mais vibrante e alegre”, completa.
Literalmente, hermanos
O encontro de Fito Páez e Moska resultou em uma irmandade, como a própria música 'Hermanos', a primeira do disco, sugere. “Quando a noite esfriar fundo no coração/ Saiba que estarei aqui quando não tiver mais ninguém/ Segure minha mão e me dá a sua também”, diz a letra da canção.
Essa similaridade de quase gêmeos está visível nas fotos de divulgação do disco — ambos de cabelo grande desgrenhado, barba e até o jeito de dobrar as pernas – e também na voz dos cantores que, em certos momentos, se misturam e fica difícil distinguir quem está cantando cada estrofe.
“Nós já tínhamos essa predisposição física, mas, quando começamos a ver as primeiras fotos na Bahia, foi impressionante essa similaridade. Até mixando o CD, tivemos dificuldade de saber quem estava cantando. Acho que encontramos o que estávamos procurando: uma terceira identidade”, afirma Moska.
Mas, se o clima era de irmandade, por que o disco não se chama Hermanos? Moska contou que, desde o início, a previsão era de que esse fosse o nome do projeto. No entanto, 'Locura total' se tornou uma expressão comum entre eles. “No último encontro, em Trancoso, escrevemos 'Locura total' que é um delírio total, falando da Bahia e de um mito argentino de Diana. Rapidamente entendemos que Hermanos era um nome muito previsível. E esse projeto foi uma loucura total, nos juntamos sem saber se daria certo”, revela.
Três perguntas // Moska
No disco, vocês defendem o portunhol, que é muito criticado. Vocês não tinham receio de usar a “língua”?
Para mim, o portunhol é a língua mais linda do mundo. É livre e vai de acordo com a cara de pau de cada um. Não tem regra, não tem dicionário nem gramática. É o desejo de abraçar o outro. Como língua, pode ser vista como um equívoco, mas como comportamento, atitude e projeto é linda. É muito mais do que um idioma, é um abraço à irmandade. Eu e Fito inventamos portunhóis.
Nesse disco, vocês trazem o Brasil para mais perto dos outros países da América do Sul. Você também tem a impressão de que os brasileiros não se sentem latinos?
Esse é um constrangimento que me apareceu há 14 anos. Eles (os países da América do Sul) conhecem nossa cultura, nossa música. E acho que perdíamos em não conhecer a cultura deles. Ficamos isolados por esse tamanho do Brasil, sua exuberância, também tem a diferença da língua… Daí parece que a gente se basta. Mas não pode ser assim, tem um mundo maravilhoso lá fora. Somos muito mais parecidos com os latinos, até mais do que com os europeus, os japoneses e até os norte-americanos.
Há a intenção de sair em turnê com o disco?
Por enquanto, é só um desejo. Era um projeto alternativo, que acabou ganhando uma proporção maior. Mas a gente ainda não sabe a dimensão dele. Não queremos fazer nada menor ou maior do que a realidade. Vamos esperar, mas se rolar será em 2016, até porque temos as nossas carreiras paralelas.
Perfil
O compositor, cantor e pianista argentino Fito Páez começou a se destacar no Brasil após o lançamento do álbum El amor después del amor (1992). Por conta do sucesso, ele fez shows no país e também começou a as parcerias com artistas brasileiros. Em seu disco Circo beat, contou com uma segunda versão com participação de Caetano Veloso, Herbert Vianna e Djavan. Depois, fez parcerias com Rita Lee e também se tornou responsável pela boa repercussão de Os Paralamas do Sucesso na Argentina. Moska o define como “uma mistura de Caetano Veloso com Lulu Santos”.
Locura totalç
De Fito Páez & Moska. Sony Music, 12 faixas. Preço médio: R$ 29,90.